Correio braziliense, n. 20797 , 01/05/2020. Economia, p.9

 

Emissão de moeda no radar

Alessandra Azevedo

01/05/2020

 

 

Ministro Paulo Guedes afirma que colocar mais dinheiro em circulação não é necessariamente inflacionário, pois a demanda estará deprimida pela pandemia. Medida, porém, não conta com o apoio do presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto

O ministro da Economia, Paulo Guedes, não descarta emitir moeda para conter os efeitos da pandemia da Covid-19. O chefe da equipe econômica também admitiu a possibilidade de que a União se endivide para pagar a conta. As ideias, no entanto, não têm apoio de outra ala, que inclui o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto.

Em audiência pública ontem na comissão mista do Congresso que discute os efeitos da crise, Guedes foi perguntado por parlamentares se a emissão de moeda era uma opção e respondeu que “sim”.

“É muito fácil fazer inversão de marcha. Se cairmos em uma armadilha de liquidez, em um cenário de inflação zero, o Banco Central pode, sim, emitir muita moeda e comprar dívida interna”, salientou, para acrescentar:

“Se a taxa de juros for muito baixa, ninguém quer comprar título longo”, explicou Guedes.

O ministro acredita que, no cenário atual, é possível “monetizar a dívida, sem gerar impacto inflacionário”. A estratégia seria a compra, pelo Banco Central, de títulos públicos emitidos pelo Tesouro Nacional. O crédito emitido seria usado para arcar com gastos decorrentes da crise.

 “Estamos atentos a todas as possibilidades”, assegurou. Segundo ele, um bom economista “não tem dogma” e pode mudar o foco de ações para lidar com emergências durante crises.

A possibilidade tem sido levantada por economistas conhecidos por serem liberais, como o ex-presidente do Banco Central e ex-ministro da Fazenda Henrique Meirelles. A medida também foi defendida, na última quarta-feira, pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em entrevista a uma rádio –– o petista concorda que não haveria risco de aumento de inflação, porque a pandemia resultou em queda de demanda.

Já Roberto Campos Neto não considera que emitir moeda seja a melhor opção. “Não sou favorável. O argumento de que eu vou imprimir dinheiro porque a inflação está relativamente baixa é perigoso”, alertou.

“Acho que a saída não é por aí. É uma ideia. Hoje, obviamente que tudo pode ser modificado, dependendo do que aconteça. Mas nós não entendemos que é a melhor saída, não”, afirmou o presidente do BC.

Ele lembrou que o sistema de metas de inflação, adotado atualmente, determina que a autoridade monetária decida a taxa básica de juros (Selic) com base na meta do Comitê de Política Monetária (Copom).

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Do superavit ao rombo: R$ 2,7 bi

Rosana Hessel

01/05/2020

 

 

Mesmo antes de contabilizarem oficialmente as perdas com queda na arrecadação devido à piora na atividade economia, e com o aumento dos gastos em medidas contra a Covid-19, as contas de estados e municípios no mês de março já mostram piora. O resultado fiscal dos governos regionais passou de um superavit de R$ 5,2 bilhões para um deficit primário de R$ 2,7 bilhões, conforme dados divulgados, ontem, pelo Banco Central. É o primeiro resultado negativo para os meses de março desde a recessão de 2015 e 2016.

Na avaliação do chefe do Departamento de Estatísticas do BC, Fernando Rocha, os dados de arrecadação dos governos regionais têm uma defasagem no relatório fiscal e, por conta disso, o maior impacto dessa piora no resultado primário está relacionado à redução dos repasses da União aos estados e aos municípios. “Houve uma queda das transferências para governos regionais de 4,8%, em março, na comparação com o mesmo período de 2019. Os estados receberam menos receitas e tiveram que usar outras fontes para aumentar gastos correntes. Por isso, tiveram deficit primário no mês”, afirmou Rocha, durante videoconferência com jornalistas para comentar os números.

O resultado primário do setor público consolidado ficou negativo em R$ 23,7 bilhões, rombo 2,8% superior ao registrado no mês anterior.

Rocha fez coro com o secretário do Tesouro Nacional, Mansueto Almeida, que afirmou, na última quarta-feira, que o resultado fiscal do governo federal e do setor público consolidado vão piorar daqui para frente, devido ao aumento dos gastos emergenciais para combater a pandemia. As despesas previstas da União no combate à Covid-19, e que não estão no Orçamento deste ano, já somam R$ 253 bilhões. Mansueto prevê o rombo fiscal dos governos federal, estaduais e municipais chegando a R$ 600 bilhões, 8% do Produto Interno Bruto (PIB) no fim do ano.

Na avaliação do economista Alexandre Almeida, da CM Capital, os dados fiscais do setor público consolidado são preocupantes, diante do salto vertiginoso no número mortes no país, chegando perto das 6 mil. “A tendência é de que, com a atividade econômica travada, os impactos na arrecadação tendem a ser mais uma agravante de toda essa situação, que é dramática”, lamentou.

Deficit nominal

O deficit nominal do setor público consolidado somou R$ 79,7 bilhões em março, o maior já registrado pela série histórica do BC, de acordo com Fernando Rocha. Esse resultado foi 61,7% superior ao de fevereiro e 28,1% acima do no mesmo intervalo de 2019.

Tal resultado inclui a conta de juros e o resultado primário do setor público, e reflete a necessidade de financiamento público. A piora, segundo Rocha, é decorrente das perdas de R$ 31,3 bilhões nas operações de swap cambial (contratos futuros operados pelo BC no mercado de câmbio), que tiveram impacto na conta de juros. Entre fevereiro e março, esse indicador saltou 96,5% –– R$ 56 bilhões.

No acumulado do trimestre, o setor público consolidado teve superavit primário de R$ 11,7 bilhões e a conta de juros somou R$ 121,6 bilhões. Enquanto isso, o deficit nominal ficou em R$ 109,9 bilhões –– no acumulado em 12 meses até março, R$ 457,9 bilhões (ou 6,24% do PIB, o maior patamar desde novembro de 2019).

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PIBs caem na UE, nos EUA e no México

Jailson R. Sena*

Marisa Wanzeller*

01/05/2020

 

 

O último dia de abril revelou os primeiros efeitos da pandemia sobre o Produto Interno Bruto da Zona do Euro, do México e dos Estados Unidos. A economia da Eurozona registrou contração de 3,8% no primeiro trimestre de 2020, quando foram adotadas medidas para conter o avanço do novo coronavírus. Foi o retrocesso trimestral mais expressivo da série histórica, conforme anunciou ontem a Eurostat (agência europeia de estatísticas).

O Fundo Monetário Internacional (FMI) projetou em suas últimas previsões uma contração de 7,5% do Produto Interno Bruto (PIB) em 2020 para o conjunto dos 19 países da zona do euro em consequência do coronavírus. A instituição não descarta a possibilidade de um impacto ainda maior.

A primeira estimativa da agência europeia de estatísticas foi precedida por resultados negativos anunciados por algumas das principais economias da Eurozona entre janeiro e março: queda de 5,8% na França e de 5,2% na Espanha, à espera da divulgação dos dados da Alemanha e da Itália. O percentual de desempregados subiu um décimo na comparação com fevereiro, quando registrou o menor nível desde março de 2008. A Holanda teve o menor índice, 2,9%.

Auxílio-desemprego

Nos Estados Unidos, mais de 3,8 milhões de pessoas solicitaram auxílio-desemprego pela primeira vez, na sexta semana de isolamento social, encerrada em 25 de abril. Assim, o total de pedidos superou a marca dos 30 milhões. Mesmo sendo alto, o número representa uma queda em relação à semana anterior, quando aproximadamente 4,4 milhões de cidadãos requereram o benefício. Economistas esperavam uma média de 3,5 milhões de pedidos.

Com essa taxa de desemprego, houve reflexos no desenvolvimento econômico dos EUA. O PIB caiu 4,8% no primeiro trimestre de 2020, conforme divulgado pelo U.S Bureau of Economic Analysis (BEA), escritório de estatísticas econômicas do país. Foi o pior resultado desde a crise de 2008.

Já o México apresentou, no primeiro trimestre de 2020, uma queda no PIB de 1,6%. Segundo o Instituto Nacional de Estatística e Geografia (Inegi), enquanto as atividades secundárias e terciárias caíram em 1,4%, as primárias aumentaram 0,5% em relação aos três meses imediatamente anteriores.

*Estagiários sob supervisão de Fabio Grecchi