Título: Ressarcimento ao Fisco nas mãos de senadores
Autor: Valadares , João
Fonte: Correio Braziliense, 18/11/2012, Política, p. 4

Diante da repercussão negativa em torno da decisão da Mesa Diretora do Senado, em setembro, que resolveu cobrir o calote histórico aplicado na Receita Federal por senadores e ex-senadores ao receber os 14º e 15º salários e não pagar Imposto de Renda, o presidente da Casa, José Sarney (PMDB-AP), está disposto a tentar limpar a imagem dos parlamentares. Ele deve encaminhar para votação em plenário a resolução sobre o tema até o fim dessa legislatura, que se encerra em 22 de dezembro. Se for aprovada, o contribuinte é quem vai arcar com a fatura. Mas, caso seja reprovada, cada parlamentar pagaria individualmente os valores devidos.

Nos bastidores do Senado, a informação é de que a resolução deve ser encaminhada em breve. Sarney já teria comunicado a decisão a alguns integrantes da Mesa Diretora. A secretária-geral da Mesa, Cláudia Lyra, confirmou, na tarde de sexta-feira, que, na ata de reunião em que o ato foi assinado, existe justamente a previsão de uma resolução sobre o assunto para ser votada em plenário.

O ato, publicado em 26 de setembro, fixava prazo de 60 dias para que o Senado pagasse a dívida à Receita Federal. O mesmo documento determinava que a Casa calculasse o imposto devido em 10 dias. No entanto, até o momento, o Senado não informou o valor. A Receita Federal não fala sobre o assunto. Um grupo de senadores não concordou com a determinação e resolveu pagar o calote por conta própria. A ação desses parlamentares causou constrangimento naqueles que queriam ter a dívida coberta pelo Senado.

Em setembro, logo após a polêmica decisão da Mesa Diretora, o Senado Federal informou que, mesmo cobrindo o rombo, entraria na Justiça para tentar reaver o montante. Os valores que serão devolvidos à Receita não foram informados oficialmente, mas o Correio fez um cálculo aproximado. Considerando o período retroativo de alcance da cobrança devida — os últimos cinco anos —, os parlamentares, juntos, deixaram de repassar ao Fisco aproximadamente R$ 10,8 milhões, incluindo as multas por imposto devido. Ao não pagar o IR referente aos salários extras, cada senador deixa de contribuir, por ano, com R$ 12.948. Durante um mandato inteiro, o parlamentar embolsa R$ 103.584.

Pressão Na época em que a decisão da Mesa Diretora foi tomada, o vice-presidente do Senado, Aníbal Diniz (PT-AC), justificou que os senadores não poderiam ser punidos. “O Senado percebeu que os senadores não poderiam ser responsabilizados simplesmente porque eles não tiveram culpa. O Senado só mudou de opinião agora. Na medida em que a ajuda de custo foi abolida, o Senado se acusou e a Receita começou a exigir o pagamento. Então, os senadores pressionaram a Mesa para não serem punidos”, declarou.

Hoje, a versão oficial aponta que o erro que beneficiou os parlamentares teria sido ocasionado por uma falha administrativa do Senado. No entanto, o próprio presidente da Casa, José Sarney, após a divulgação das reportagens, negou o equívoco e disse que um decreto do próprio Senado isentava o pagamento sobre os salários extras, considerados ajuda de custo. Na ocasião, ele acrescentou que cada senador deveria responder individualmente à intimação do Fisco.

Auditores da Receita Federal ouvidos pelo Correio durante a série de reportagens tinham assegurado reservadamente que, no caso específico dos senadores, todo o ônus financeiro iria recair nas costas dos parlamentares enquanto pessoas físicas, e não do Senado. Prova maior é que a intimação não foi encaminhada aos gabinetes, e sim à residência dos políticos. A justificativa era simples: “A Receita é credora e o Senado é devedor. No entanto, a União não pode cobrar da própria União. Nesse caso, o empregador é a própria União. Por isso, todo o ônus financeiro vai ser lançado nos próprios senadores”, alegou, na época, um auditor fiscal.

Desde que foi aprovado no Senado em maio, o projeto de decreto legislativo que acaba com o 14º e o 15º salários está na Câmara dos Deputados e, por enquanto, deu um único passo. Por falta de quórum, a Comissão de Finanças e Tributação (CFT) ainda não conseguiu aprovar a matéria. É grande o risco de os parlamentares receberam os extras no fim deste ano e no início do próximo.

R$ 10,8 milhões Estimativa de quanto senadores e ex-senadores devem ao Fisco nos últimos cinco anos pelo não recolhimento de IR sobre os 14º e 15º salários