O globo, n. 31665, 17/04/2020. Especial Coronavírus, p. 8

 

Colapso dos hospitais

17/04/2020

 

Estados com mais casos temem por sistema de saúde

Hospitais lotados, filas de espera na UTI, projeções de centenas de mortos ao dia: enquanto os números da Covid-19 no país aumentam, o sistema público de saúde é estrangulado.

O sistema de saúde do Ceará chegou ao limite ontem: na terceira unidade federativa mais afetada pela Covid-19, todos os leitos de UTI estão ocupados. O esgotamento da rede hospitalar cearense reflete uma ameaça cada vez mais próxima de estados como São Paulo, Rio de Janeiro, Amazonas e Pernambuco, que completam, respectivamente, o topo do ranking de casos confirmados e mortes. No Distrito Federal, todas as UTIs não destinadas à infectados pelo novo coronavírus estão ocupadas.

No Rio de Janeiro, a capital já tem uma fila de ao menos 37 pacientes à espera de uma vaga nas unidades de terapia intensiva. Também faltam respiradores: dos 806 que a prefeitura comprou na China no fim do ano passado, faltam chegar 726. A administração do estado prometeu 2 mil leitos( UTIs e enfermarias) em hospitais de campanha, mas eles ainda não foram inaugurados.

No Ceará, diante da falta de leitos, a Secretaria da Saúde projeta um crescimento exponencial do número de óbitos: a partir do início de maio, a estimativa é de que as mortes passem de 250 por dia. Para se ter uma ideia, o total registrado até agora, entre 2.413 casos confirmados, é de 135 vítimas fatais. O governo estadual adquiriu 700 respiradores chineses e aguarda a chegada dos equipamentos; com eles, podemse instalar até 600 novos leitos de UTI no Ceará.

Na cidade de São Paulo, quatro dos 19 hospitais da rede municipal atingiram 100% da capacidade dos leitos de UTI reservados para pacientes de Sars-CoV-2. São todos na populosa Zona Leste da capital paulista: Tide Setúbal, Cidade Tiradentes, Ermelino Matarazzo e Dr. Ignácio Proença de Gouvêa. Além disso, preocupa a ocupação das UTIs nos hospitais estaduais: o Hospital Geral de Pedreiras, o Vila Nova Cachoerinha, o Instituto Emílio Ribas e o Hospital de Clínicas (ambos referência no tratamento da Covid-19) estão com lotação em torno de 90%. Contra a crise, o governo paulista já criou 1.312 novos leitos, com foco em hospitais de campanha como do Anhembi e do estádio do Paembu. Para as próximas semanas, estão previstos mais 1.813 novos leitos.

As UTIs do Distrito Federal também se aproximam do limite: dos 90 leitos separados para coronavírus, 61 estão vagos — mas todos os 410 restantes estão ocupados. O Distrito Federal prevê em breve a instalação de 850 novos leitos.

Miguel Nicole lis, um dos cientistas na coordenação do comitê científico do consórcio de governadores do Nordeste, afirma que os estados da região vão criar três “barreiras” de atendimento para desafogar os hospitais: primeiro por telefone, depois coma idade médicos às residências dos moradores com sintoma se, por último, a ida ao hospital par aos que mais precisarem.

— Se o sistema de saúde pega o paciente no começo, reduz o grau de infectabilidade e, assim, a necessidade de UTI. Isso vem desde o tempo de Oswaldo Cruz. Ele usou essa estratégia combatendo a varíola e a febre amarela, indo nas vizinhanças com casos e isolando os casos. Agora temos a tecnologia para nos ajudar.

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No Rio, fila de 37 pacientes por UTI na rede pública

Luiz Ernesto Magalhães

17/04/2020

 

 

Do 619 leitos da prefeitura, apenas oito estão disponíveis, todos para internação de crianças

A cidade do Rio de Janeiro já tem uma fila de ao menos 37 pacientes à espera de uma vaga na UTI na rede pública. Do total de 619 leitos que a prefeitura administra pelo SUS, apenas oito estão disponíveis no momento, todas para internação de crianças. Na quarta-feira, havia 548 leitos ocupados. Os dados constam do Cadastro Nacional de Estabelecimentos de Saúde, do Ministério da Saúde, em um levantamento feito pela reportagem do GLOBO por volta das 20h de ontem. O cadastro é dinâmico, e os números de leitos costumam variar a todo instante, quando há altas e internações de pacientes em toda a rede.

Sem citar números, a Secretaria Municipal de Saúde negou que tenha lotado suas vagas. Em um balanço no início da noite de ontem, antes de o GLOBO ter acesso ao cadastro, a prefeitura afirmava que ainda havia leitos, por exemplo, no Hospital Municipal Ronaldo Gazolla, na Zona Norte, referência no tratamento contra o coronavírus que deve ganhar dez vagas de UTI hoje. Ontem, a prefeitura bateu recordes de notificações da doença em um só dia (140 novos casos, totalizando 2.659). Os mortos já são 195.

Segundo fontes ouvidas pela reportagem, um agravante da situação é que a cidade fechou 605 leitos na unidade intensiva (entre próprios e conveniados) nos últimos dois anos. E um dos entraves para a expansão de leitos é a falta de respiradores. Ontem, o prefeito Marcelo Crivella contou que tinha cem respiradores em estoque, mas, enquanto a prefeitura não abria novos leitos, os equipamentos foram requisitados pelo Ministério da Saúde para unidades em outras regiões. Agora, ele busca reaver os equipamentos. Dos 806 ventiladores mecânicos que a prefeitura comprou na China no fim do ano passado, faltam chegar 726. Destes, apenas 300 devem chegar até o fim de abril.

Além do Gazolla, a prefeitura tem outras duas unidades de referência para o coronavírus: o CER Leblon, há dois dias com seus dez leitos de UTI ocupados; e o Hospital Jesus, especializado em pediatria, em Vila Isabel — lá, sete das das dez UTIs estavam vagas.

Dos hospitais de campanha anunciados, o mais adiantado é o do Riocentro (500 vagas, sendo 100 UTIs). As obras terminam domingo, mas não há um cronograma de entrada em operação desse leitos. Estado, Fiocruz e a Rede D’sOr já anunciaram também a abertura de 660 leitos de UTI além de leitos comuns até o fim do mês.

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Ceará projeta 250 mortes por dia a partir de maio

Sérgio Roxo

17/04/2020

 

 

Leitos de UTI para pacientes vítimas de Covid-19 estão 100% ocupados e há fila de espera por vaga

Com 100% de lotação nos leitos de UTI destinados ao tratamento de pacientes com Covid-19, o Ceará projeta uma explosão do número de mortes provocadas pelo novo coronavírus a partir de 5 de maio. A estimativa da secretaria estadual de Saúde é que os óbitos possam passar de 250 por dia num prazo de três semanas.

Desde o começo da pandemia, há quase um mês, o estado teve 135 mortes até ontem. O Ceará é a terceira unidade da federação com mais casos: 2.413 pessoas infectadas, atrás apenas de São Paulo e do Rio.

Para contornar o problema, o governo aguarda a chegada de 700 respiradores já comprados da China. Com os equipamentos, a intenção é instalar pelo menos mais 600 novos leitos de UTI em todo o estado. Embora não tenha atendimento intensivo, um hospital de campanha está sendo montado no estádio Presidente Vargas, em Fortaleza, para ajudar no atendimento aos pacientes.

Para fazer a projeção do números de mortes, o governo cearense usou dados de mortes locais, do Brasil e de alguns países alvos da doença. Um dos critérios analisa ainda o maior número de dias no enfrentamento da epidemia em cada país.

“Considerando os dados iniciais, vimos um comportamento de óbitos no estado bem próximo ao modelo preditivo, poderemos alcançar números altos, chegando a mais de 250 óbitos por dia a partir do dia 5 de maio de 2020”, diz o trecho do relatório.

O documento da Secretaria da Saúde projeta ainda 3.734 pessoas infectadas por coronavírus no estado já no próximo dia 23 de abril. O GLOBO mostrou ontem que, fora do epicentro do coronavírus no Brasil, a região Nordeste concentra outros números que trazem preocupação para especialistas em saúde pública: estados com taxa de letalidade acima da média nacional.

Segundo a secretária-adjunta de Vigilância e Regulação da Secretaria da Saúde, Magda Almeida, o estado já atingiu 100% da ocupação dos leitos de UTI destinados a pacientes com coronavírus. Havia, na quarta-feira, 169 pessoas internadas em UTIs, sendo 113 em Fortaleza. A fila de espera por uma vaga em unidades de tratamento intensivo é de 48 pessoas.

—Neste momento, apesar de não estarmos no pico esperado da epidemia, estamos com leitos de UTI em ocupação máxima — afirmou Almeida ao portal G1.

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Em SP, quatro hospitais municipais estão lotados

Ana Letícia Leão

Dimitrius Dantas

Silvia Amorim

17/04/2020

 

 

Seis estaduais têm no mínimo 80% de ocupação; governo quer informações e ajuda da rede privada

Quatro hospitais municipais da cidade de São Paulo atingiram ontem 100% de ocupação dos leitos de UTI com pacientes de coronavírus: Tide Setúbal, Cidade Tiradentes, Ermelino Matarazzo e Dr. Ignácio Proença de Gouvêa, todos na Zona Leste. A capital tem 19 unidades municipais.

—É um quadro preocupante, sobretudo por ser na Zona Leste, onde já estamos tendo uma pressão muito grande — disse o secretário municipal de Saúde, Edson Aparecido.

A situação das UTIs dos hospitais estaduais também tem se agravado. Seis deles estão com, no mínimo, 80% de ocupação: Instituto Emílio Ribas (93%, na véspera chegou a 100%); Hospital Geral de Pedreiras (93%), na Zona Sul; Vila Nova Cachoeirinha (86%), na Zona Norte; e Hospital das Clínicas (83%), referência no tratamento de Covid-19. O Hospital Geral Santa Marcelina do Itaim Paulista e o Geral de Carapicuíba têm ambos 80%.

O estado já registrou 11.568 casos e 853 mortes. Para conter a crise, o governo tem criado novos leitos, principalmente em hospitais de campanha. Até o momento, foram 1.312, no Estádio do Pacaembu (200), Anhembi (887), Hospital das Clínicas (200) e Ambulatório Médico de Especialidades de Campinas (25). Estão previstos mais 913 leitos no Anhembi, 700 no HC e 260 no Ibirapuera.

— Estamos conversando para ter colaboração dos hospitais particulares — diz o secretário estadual de Saúde, José Henrique Germann.

Ontem a prefeitura passou a exigir que os hospitais informem diariamente a quantidade de leitos disponíveis e ocupados. No Einstein, eram 98 internados com Covid-19 na terça (58 na UTI). No Sírio, a taxa de ocupação da UTI está em 70%.

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No DF, há leitos para Covid e espera para outras doenças

Leandro Prazeres

17/04/2020

 

 

Das 90 vagas destinadas aos pacientes com o novo coronavírus, somente 29 estão ocupadas

 O governo do Distrito Federal reservou 90 dos seus 500 leitos de UTI para pacientes com Covid-19. O problema é que todos os outros 410 estão ocupados, e isso fez com que 37 pacientes portadores de outras doenças ou que precisam de cirurgia de emergência estejam, agora, em uma lista de espera. Segundo o Ministério da Saúde, o Distrito Federal tinha,na segunda-feira,a terceira maior taxa de incidência para a Covid-19 no Brasil (209/ milhão) e o sétimo maior número de casos confirmados da doença: 716. Dos 90 leitos destinados à Covid-19, apenas 29 estão ocupados.

O Distrito Federal foi uma das primeiras unidades da federação a adotar medidas de isolamento, mas o governador Ibaneis Rocha( MD B) anunciou a flexibilização das normas. Além das medidas de isolamento social, o governo também iniciou a implantação de leitos extras, tanto de UTI quanto de enfermaria, alguns deles a serem instalados no Estádio Mané Garrincha.

Para o infectologista José David Urbaéz, consultor da Sociedade Brasileira de Infectologia, afila gerada pela reserva de leitos para pacientes de Covid-19 é uma consequência cruel dos esforços para preparar o sistema de saúde:

— Essa epidemia criou um cenário em que todas as escolhas são difíceis. Do ponto de vista médico, por pior que possa parecer, é melhor ter reserva para pacientes de Covid-19, ainda que isso gere uma fila para outros pacientes, do que não ter. Os pacientes graves de Covid-19 precisam muito intensamente das UTIs. Sem isso, eles morrem. É uma escolha de Sofia.

Questionada sobre a maneira como lida com a fila de espera por leitos, a secretaria disse que os pacientes que aguardam uma U TI continuam sendo assistidos nos hospitais onde estão internados e que são encaminhados a uma UTI de acordo coma classificação de risco de cada um deles.