O globo, n. 31638, 21/03/2020. Opinião, p. 2

 

STF pode dar grande ajuda contra a crise

21/03/2020

 

 

Se forem alterados votos em julgamento não concluído, haverá isonomia e mais recursos disponíveis
O efeito devastador da epidemia no sistema produtivo mundial e nas estruturas de saúde de cada país leva governantes a tomarem medidas de impacto para evitar a circulação das pessoas, afim de que a corrente de difusão do coronavírus seja quebrada. Epicentro mundial da doença respiratória, a China, ao praticar bloqueios e quarentenas, teve êxito, e seu modelo passou a ser copiado. Em outro plano, são executadas ações também fortes na economia, para reverter o tranco global recessivo provocado pela paralisação de fábricas, de cidades etc. Em países democráticos como o Brasil, a atuação do Legislativo é estratégica para que o Estado como um todo atue de forma coordenada em defesa das pessoas. O Congresso, neste sentido, foi exemplar na rápida aprovação do pedido do Executivo para a decretação de estado de calamidade pública, necessário para o governo ter margem institucional de manobra coma finalidade de contar com os recursos necessários ao enfrentamento de inúmeras dificuldades na crise. A suspensão da meta fiscal, por exemplo, dará o necessário espaço nas finanças públicas para este combate. O Judiciário é parte deste movimento de resistência às ameaças da pandemia. Foi o que simbolizou a presença do presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Dias Toffoli, na entrevista coletiva do presidente Bolsonaro e ministros na quarta-feira, quando foi assinado, também por ele, projeto de lei que institui um comitê com representantes de órgãos da Justiça para dar velocidade à tramitação de medidas anticrise.

Toffoli teve a atitude correta, porque o Judiciário, independente, também é harmônico com o Legislativo e o Executivo. O Judiciário é parte do Brasil, um país real que entrará em uma crise de tamanho incalculável, a depender de como o Estado atue para não deixar faltarem recursos ao tratamento das vítimas do coronavírus, à garantia de renda aos milhões de trabalhadores hoje já informais, ao Bolsa Família e no resgates de empresas, para que sejam mantidos empregos e preservada a capacidade de geração de outros postos de trabalho quando a crise passar. A situação é de guerra, afirma-se no Brasil e em vários países. É mesmo. Uma contribuição imediata e decisiva de ministros do STF é rever votos de um julgamento ainda não concluído que, ao ser suspenso, dava a maioria de seis dos 11 votos da Corte à decretação de inconstitucionalidade de dispositivo da Lei de Responsabilidade Fiscal que permite a redução temporária de salários dos servidores públicos em momentos como este. Confirmar a constitucionalidade da LRF na integralidade significará também fazer com que haja isonomia na crise entre servidores e assalariados do setor privado, que poderão ter sua remuneração cortada em até 50%, em troca da manutenção do emprego. Estável, o funcionalismo não tem este problema. E de maneira nada justa terá salários mantidos com um dinheiro que poderá ajudar no controle do coronavírus e na manutenção de empregos e renda dos mais (...)