Título: Drible no Supremo
Autor: Caitano, Adriana; Braga, Juliana; Abreu, Diego
Fonte: Correio Braziliense, 19/12/2012, Política, p. 2

Para cumprir a determinação do STF de retirar o regime de urgência e votar as mudanças realizadas por Dilma na distribuição dos royalties do petróleo, o Congresso fará sessão conjunta para analisar 3,2 mil vetos presidenciais pendentes

O dia em que o Congresso deveria votar o Orçamento de 2013 e garantir o início do recesso dos parlamentares corre o risco de se transformar em mais um capítulo da novela que fortalece pelo menos duas crises: uma institucional, entre Supremo Tribunal Federal (STF) e o Poder Legislativo; e outra federativa, entre governo, estados produtores e não produtores de petróleo. Após discussões e ameaças, Câmara e Senado se unem hoje, ao meio-dia, para votar em sessão conjunta 3,2 mil vetos presidenciais a leis que têm até 12 anos de vigência. Entre eles, 140 referem-se à redistribuição dos royalties do petróleo, causadora de todo o tumulto.

O presidente do Congresso, José Sarney (PMDB-AP), convocou a sessão depois que um grupo de líderes partidários que representam a maioria dos congressistas apresentou um requerimento pedindo que todos os vetos existentes fossem colocados em pauta e votados em ordem cronológica, como determinou o ministro do STF Luiz Fux em resposta ao mandado de segurança apresentado por parlamentares do Rio de Janeiro. O pedido foi encabeçado por um grupo de deputados e senadores de estados não-produtores de petróleo que conseguiram inverter em favor próprio a decisão de Fux, que oficialmente beneficiaria os produtores.

Pressionado a convocar a sessão, Sarney não reagiu. "Eu não tomaria por mim iniciativas, e, sim, os líderes. Eu ainda, justamente para que isso fosse uma vontade de toda a Casa, submeti à Mesa Diretora, que aprovou essa convocação", disse. Com isso, os 513 deputados federais e 81 senadores passarão a tarde e, provavelmente, a noite de hoje analisando a cédula impressa com os vetos. Trata-se de um calhamaço de 463 páginas com as opções sim, não e abstenção, além da possibilidade de voto em branco.

Planalto O maior temor que se instaurou no parlamento após a definição da análise em bloco é a possibilidade de, no afã de derrubar os vetos sobre os royalties, o Congresso acabe mexendo em vetos antigos cujas leis já estão em vigência. Na lista de itens considerados perigosos, estão o Código Florestal, a Emenda 29 (que definiu os gastos estaduais com saúde) e o fator previdenciário, assuntos que preocupam — e muito — o governo. A ministra da Secretaria de Relações Institucionais, Ideli Salvatti, já foi acionada pela presidente a ficar de olho nos possíveis desdobramentos da votação de hoje.

O tema foi a justificativa da ausência de Dilma na confraternização com os funcionários do Palácio do Planalto ontem. "A presidente está muito cansada. Vocês imaginem toda essa epopeia que ela teve. Depois, nós estamos na iminência na questão da votação dos vetos e ela está tendo que analisar com muito carinho, muito cuidado essa coisa dos vetos", comentou o ministro da Secretaria-Geral da Presidência, Gilberto Carvalho.

A possibilidade de votação dos 3,2 mil vetos em uma sessão, apesar de parecer inócua, é cogitada por boa parte dos parlamentares. Os representantes de estados produtores, no entanto, já ameaçam acionar a Justiça novamente se isso ocorrer. "Estão querendo praticar um estelionato regimental, podendo mexer em coisas que podem ser extremamente ruins para o país por um capricho particular e sem uma análise profunda de cada ponto", reclamou o deputado Alessandro Molon (PT-RJ), autor do mandado de segurança favorecido no STF. Ele alerta que o regimento interno do Congresso determina que seja criada uma comissão especial para cada tema vetado e o parecer deve ser lido em plenário.

A bancada dos não produtores, porém, interpreta o regimento de outra forma. Para eles, após 30 dias em que o veto chega ao Congresso, ele entra automaticamente na ordem do dia sem a necessidade de passar por comissão. "Por isso, criamos uma comissão especial apenas para os royalties, que é o único veto com menos de um mês de existência", argumenta o deputado Marcelo Castro (PMDB-PI). O relatório do colegiado vai ser lido no início da sessão de hoje. Para aumentar a pressão, governadores das regiões em que não há produção devem acompanhar a votação, como Cid Gomes, do Ceará, que se reuniu ontem com Sarney para tratar do assunto.