Correio braziliense, n. 20803 , 07/05/2020. Política, p.2

 

Deletando Moro

Renato Souza

Simone Kafruni

Jorge Vasconcellos

07/05/2020

 

 

PODER » Para tentar apagar os rastros do ex-juiz no governo, Ministério da Justiça e Segurança Pública tem demitido os nomeados por ele, seguindo recomendações do presidente Jair Bolsonaro. Ideia do Planalto de dividir a pasta volta a ganhar força

Com a saída de Sergio Moro e a entrada de André Mendonça no comando do Ministério da Justiça, a pasta vem sofrendo uma série de alterações em sua estrutura administrativa. Integrantes nomeados pelo ex-juiz de Curitiba estão sendo trocados por nomes recomendados pelo presidente Jair Bolsonaro. Ontem, foi a vez de mudar o número dois da pasta. Nas próximas semanas, a alteração pode ser ainda mais profunda. Interlocutores afirmam que o chefe do Executivo pretende dividir a estrutura e criar dois ministérios, um para a Justiça e outro para a Segurança Pública, ideia que foi ventilada em janeiro, mas que acabou descartada por causa do risco de Moro deixar o governo. Com ele fora do caminho, o comandante do Planalto pode avançar nas alterações sem encontrar barreiras.

Ontem, a pedido de Bolsonaro, André Mendonça demitiu o secretário nacional de Segurança Pública, general Guilherme Theophilo. A exoneração deve sair no Diário Oficial da União (DOU) nos próximos dias. A determinação presidencial é de apagar todos os rastros deixados por Moro, agora desafeto do presidente. O ex-juiz deixou o governo, há duas semanas, acusando o chefe do Executivo de tentar interferir politicamente no comando da Polícia Federal.

Guilherme Theophilo, que se candidatou ao governo do Ceará em 2018, foi levado ao ministério por Moro. General da reserva, ele está no governo Bolsonaro desde o período de transição. Antes filiado ao PSDB para fazer oposição ao PT no Ceará, deixou o partido para assumir a Secretaria Nacional de Segurança Pública do governo. Theophilo tem grande prestígio no Exército e durante a gestão de Moro foi peça-chave para elaborar frentes de combate ao crime organizado. Foi um dos cabeças do planejamento para desmontar a estrutura financeira e lideranças de facções criminosas.

Quem assume o cargo no lugar dele é o coronel Carlos Alberto de Araújo Gomes, atual comandante da Polícia Militar de Santa Catarina. Ele também preside o Conselho Nacional dos Comandantes Gerais das Polícias Militares e Corpos de Bombeiros Militares (CNCG). É próximo do ministro da Secretaria-Geral da Presidência, Jorge Oliveira. A nomeação dele agrada integrantes da Bancada da Bala no Congresso. Especialistas também apoiam a nomeação, pois argumentam que ele tem boa experiência e relação com as polícias estaduais, que podem atuar de forma integrada e ganham a possibilidade de ter uma lei orgânica própria, padronizada, o que permitiria maior atuação no combate ao crime.

Divisão

Sem Moro, Bolsonaro avalia separar o Ministério da Justiça e Segurança Pública em duas pastas. De acordo com interlocutores do governo, a intenção é deixar André Mendonça na Justiça, área em que ele tem maior experiência, por ter ocupado cargo na Advocacia-Geral da União (AGU) durante 20 anos, e indicar outra pessoa para cuidar da Segurança Pública, em que Mendonça tem pouca familiaridade.

Nos bastidores, integrantes do Executivo já sondam aliados do governo para, eventualmente, ocupar o novo ministério. O Distrito Federal está na frente no quesito de cotados. O ex-deputado Alberto Fraga e o secretário de Segurança de Brasília, Anderson Torres, encabeçam a lista. Fraga é próximo do presidente, tem a confiança dele e propostas que agradam ao Planalto. Torres, por sua vez, tem larga experiência em segurança pública e é bem-visto entre as polícias dos estados. Outra possibilidade é colocar um no comando do ministério e outro na Secretaria Executiva do órgão.

Com a eventual divisão, o ponto mais polêmico é sobre qual seria o destino da Polícia Federal. De acordo com fontes no governo, a corporação seria alocada na Segurança Pública, saindo do guarda-chuva de André Mendonça. Mas essa decisão, em específico, ainda não está tomada, pois o presidente teme reações internas da instituição.

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Muzzi na PF do Rio agrada à corporação

Renato Souza

07/05/2020

 

 

O diretor-geral da Polícia Federal, Rolando Souza, escolheu o delegado Tácio Muzzi para substituir Carlos Henrique Oliveira na superintendência da corporação no Rio de Janeiro. Ele não estava entre os nomes listados pelo presidente Jair Bolsonaro. Havia apreensão e pedidos para que o novo superintendente fosse distante da família do chefe do Executivo. O ex-ministro da Justiça Sergio Moro revelou que, desde janeiro, o comandante do Planalto fazia pressão para trocar o comando da PF no Rio.

No ano passado, durante cinco meses, Muzzi foi superintendente interino no Rio em meio a polêmicas sobre mudanças na estrutura administra da PF. Na ocasião, Bolsonaro tentou a troca, pela primeira vez, na superintendência da PF no estado, então comandada por Ricardo Saadi.

Carlos Henrique, que deixa o cargo, será diretor executivo da PF, considerado o número 2 da corporação. No entanto, cuidará do controle de portos, aeroportos, tráfico de drogas e questões administrativas, saindo da área de investigação, o que foi visto, dentro da corporação, como um revés no combate ao crime organizado e à corrupção. Mas a indicação de Muzzi, que não tem ligação com o presidente ou sua família, apaziguou, ao menos temporariamente, o clima de perda de autonomia dentro da PF.

O temor era de que a nomeação de alguém que poderia interferir em investigações obrigasse uma reação dos gestores, delegados e agentes em território carioca e em outros estados, para preservar a instituição. No entanto, a apreensão ainda é grande em torno do novo diretor-geral, que era o número dois da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) e é próximo de Alexandre Ramagem, barrado do cargo por decisão do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal. (RS)

Larga experiência

Tacio Muzzi era delegado regional executivo da PF do Rio. Ele já coordenou trabalhos de repressão à criminalidade econômica e crime organizado. Mineiro e doutor em direito empresarial pela Universidade Federal de Minas, foi diretor-geral do Departamento Penitenciário Nacional (Depen) e diretor-adjunto do Departamento de Recuperação de Ativos e Cooperação Jurídica Internacional (DRCI), órgãos ligados ao Ministério da Justiça. O delegado tem larga experiência e a fama entre seus pares de “competente e honesto”.

Cargos na corporação

Veja quem assume em cada setor

Diretoria Executiva (Direz) — Carlos Henrique Oliveira (que deixa a PF no Rio)

Diretoria de Inteligência Policial (DIP) — Alexandre Isbarrola

Corregedoria-Geral de Polícia Federal (Coger) — João Vianey Xavier Filho (sai de Alagoas)

Diretoria de Administração e Logística Policial (DLOG) — André Viana Andrade

Diretoria de Gestão de Pessoal (DGP) — Cecília Franco (estava lotada em Tocantins)

Mantidos no cargo

Diretoria de Investigação e Combate ao Crime

Organizado (Dicor) — Igor Romário de Paula

Diretoria de Tecnologia da Informação e Inovação (DTI) — Willian Marcel Murad