Correio braziliense, n. 20808 , 12/05/2020. Política, p.4

 

"Vamos atender 100% o Guedes"

Rosana Hessel

12/05/2020

 

 

Bolsonaro diz que amanhã decidirá sobre veto a reajuste de servidores, aprovado pelo Congresso no pacote de socorro a estados e municípios. Líderes da oposição se articulam para que trechos excluídos sejam derrubados no parlamento

Após prometer, no domingo, sancionar hoje o projeto de lei que trata do socorro emergencial aos entes federativos, o PLP 39/2020 — com veto para o dispositivo que flexibiliza o reajuste para algumas categorias, que foi aprovado pelo Congresso —, o presidente Jair Bolsonaro adiou mais uma vez a promessa feita ao ministro da Economia, Paulo Guedes, na semana passada.

“Conversei de manhã com Paulo Guedes. Economia trabalha na questão dos vetos, e vamos atender 100% o Paulo Guedes”, disse Bolsonaro, ontem à noite, ao chegar ao Palácio da Alvorada. O ministro solicitou ao presidente vetar a parte que exclui o congelamento de salários até dezembro de 2021 algumas categorias, como profissionais da saúde e da segurança pública, militares das Forças Armadas, assistentes sociais, professores e garis. A equipe econômica sugeriu dois vetos ao texto.

Bolsonaro informou que os vetos devem ser publicados até amanhã. “Talvez quarta-feira, vamos decidir. Servidor público vai estar congelado. A tendência neste ano é ter deflação, porque todo mundo perdeu poder aquisitivo, exceto servidor público”, disse. Segundo fontes palacianas, o limite para o prazo de veto é até dia 27, e a exclusão dos trechos está “em análise” pela assessoria jurídica da Casa Civil.

Líderes da oposição, porém, já se articulam para que os vetos prometidos por Bolsonaro sejam derrubados assim que eles chegarem ao Congresso. O líder do PDT no Senado, Weverton Rocha (MA), disse que a legenda “votará pela derrubada do veto”. O partido foi um dos que propuseram emendas para que garis, professores e servidores da assistência social “não tivessem seus salários congelados ou perdas trabalhistas”. Vale lembrar que o dispositivo que flexibiliza o congelamento foi, inclusive, defendido em plenário pelo líder do governo na Câmara, o deputado Vitor Hugo (PSL-GO), a pedido de Bolsonaro. Procurado, o parlamentar não comentou o assunto.

Na avaliação do relator do PLP 39/2019 na Câmara, o deputado Pedro Paulo (MDB-RJ), se o presidente não negociar com os parlamentares de forma a mostrar mais coerência no discurso, assumindo também o ônus da decisão, o veto poderá ser derrubado. “O sentimento do Congresso é de que se ele vetar do jeito Bolsonaro de ser, sem conversar com ninguém e sem passar uma mensagem com clareza, fazendo um apelo aos servidores para que não tenham aumento até o fim do ano que vem, os parlamentares vão manter o que foi aprovado pelas duas Casas”, afirmou o relator. Ele lembrou que, durante a tramitação da proposta havia dois governos: o da Economia, que defendia o congelamento como contrapartida para o socorro aos estados, e o dos militares e da área política, que era a favor das exceções. “O presidente precisa mostrar coesão dentro do governo e assumir o ônus da decisão defendida agora por ele no veto”, completou.

Assim como a equipe econômica, governadores e prefeitos também aguardam a sanção da lei para que os recursos sejam liberados rapidamente, segundo interlocutores. A Confederação Nacional dos Municípios (CNM) entende que nenhuma prefeitura terá condições de conceder reajuste, mesmo nas exceções. “O prefeito, se tiver condições, poderá fazer, e achamos justo. Mas a entidade entende que cada gestor tem competência para avaliar essa situação”, informou a entidade.

Contrapartida

O congelamento de salários de todos os servidores públicos por dois anos era a contrapartida exigida pelo Ministério da Economia para a elaboração do pacote emergencial da União para os entes federativos, de R$ 120 bilhões. Essa proposta foi elaborada pela pasta em conjunto com o Senado, em substituição ao “pacote-bomba” da Câmara que obrigava a União a cobrir as perdas com arrecadação de ICMS e de ISS de estados e municípios, sem impor um teto para essa despesa, conforme alegavam os técnicos da equipe de Guedes.

A economia inicial com o congelamento de salários por dois anos seria de R$ 130 bilhões para estados e municípios e de R$ 42 bilhões para os cofres da União. Como o prazo ficou em 18 meses, esses valores passariam para R$ 98 bilhões e R$ 29 bilhões, respectivamente, de acordo com dados da equipe econômica. O texto aprovado na Câmara, segundo a pasta, “reduziu o impacto para R$ 43 bilhões nas despesas totais, sendo R$ 28 bilhões para estados e municípios e R$ 15 bilhões, para a União”.

Conforme o PLP 39/2020, além do adiamento de R$ 60 bilhões da dívida com a União, o governo deverá repassar R$ 60 bilhões aos entes federativos exclusivamente para ações de combate ao coronavírus. Desse valor, R$ 7 bilhões serão repassados para os estados e R$ 3 bilhões para os municípios para adoção de medidas contra a pandemia. Outros R$ 50 bilhões vão compensar perdas com arrecadação de tributos, sendo R$ 30 bilhões para os estados e o DF e R$ 20 bilhões, aos municípios.

Renegociaçãode dívidas

O projeto ainda permite renegociação de dívidas com a União, com bancos públicos e com organismos internacionais. A equipe econômica também sugeriu o veto ao parágrafo que impede a União de executar garantias e contragarantias dos empréstimos neste ano em caso de não pagamento, aos entes internacionais e aos bancos públicos em 2020. O impacto negativo nos cofres públicos poderá variar de R$ 9 bilhões a R$ 22,8 bilhões, “dependendo do grau de adesão dos bancos públicos”.

Frase

“Talvez quarta-feira vamos decidir. Servidor público vai estar congelado. A tendência neste ano é ter deflação, porque todo mundo perdeu poder aquisitivo, exceto servidor público”

Jair Bolsonaro, presidente da República

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Nomeação de presidente do Iphan é questionada

Sarah Teófilo

12/05/2020

 

 

A nomeação da nova presidente do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), Larissa Rodrigues Peixoto Dutra, tem sido alvo de questionamentos. Isso pelo fato de a titular da pasta, formada em turismo e hotelaria, não ter em seu currículo referências a uma atuação relacionada com preservação do patrimônio histórico e cultural do país.

Concursada em 2008 como assistente técnica e agente administrativo no Ministério do Turismo, Larissa Dutra tem atuação em gestão. O primeiro cargo dela foi no Departamento de Qualificação do Turismo, onde ficou até 2011. Em seguida, atuou como assistente técnica do Departamento de Promoção e Marketing. Em 2013, se tornou chefe da Divisão de Competitividade e Inovação, trabalhando com a gestão e planejamento do projeto de Cadastro dos Prestadores de Serviços Turísticos (Cadastur).

De 2015 a 2018, foi coordenadora de fiscalização dos prestadores de serviços turísticos, se tornando, em seguida, chefe de gabinete e secretária nacional substituta de Qualificação e Promoção do Turismo. Em fevereiro de 2019, passou a ser diretora do Departamento de Desenvolvimento Produtivo do ministério.

A ausência de experiência na área foco do Iphan gerou preocupação. O ex-ministro da Cultura e deputado federal Marcelo Calero (Cidadania-RJ) publicou, ontem, nas redes sociais um vídeo no qual diz que entrou com um projeto de decreto legislativo para barrar a nomeação e que vai também entrar com medidas judiciais para questionar as qualificações da nova presidente. “É inacreditável que o governo tenha sido eleito com esse discurso de que iria preencher os cargos de confiança com pessoal técnico e se preste a esse papel, mais uma vez, de colocar no Iphan uma pessoa sem qualquer qualificação para o cargo”, disse.

Desde o ano passado, mudanças em superintendências do Iphan são alvo de questionamentos. As alterações em Goiás, Minas Gerais, DF e Paraná, no segundo semestre de 2019, foram denunciadas ao Ministério Público Federal (MPF). No último dia 30, a Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão solicitou ao Iphan documentação relativa à nomeação de cargos indicados nas superintendências de Goiás, Paraíba, Rio de Janeiro, DF, Paraná, Pará e Minas.

Servidores efetivos do Iphan emitiram uma nota, ontem, ressaltando a necessidade de o ocupante do cargo ter experiência em gestão do patrimônio cultural brasileiro. Em nota, o Ministério do Turismo informou que a escolha pela nova presidente foi baseada em sua experiência, “fruto de carreira de 11 anos como servidora” da pasta. Conforme o órgão, no cargo que estava atualmente, ela trabalhou na implementação do Programa Revive Brasil, que, por meio de um acordo de cooperação com o governo de Portugal, tinha como objetivo “recuperar patrimônios históricos e culturais para aproveitamento turístico e geração de emprego e renda no Brasil”.