Correio braziliense, n. 20808 , 12/05/2020. Brasil, p.6

 

País pode bater 20 mil mortes em nove dias

Bruna Lima

Maíra Nunes

12/05/2020

 

 

CORONAVÍRUS » Segundo estudo do portal Covid-19 Brasil, o país chegará a 21,1 mil mortes em 20 de maio, dez dias após ultrapassar a marca de 10 mil. Balanço de ontem confirmou mais 396 vítimas, chegando a 11.519; número de casos saltou para 168.331, com 5.632 novos registros

Desde a confirmação do primeiro caso do novo coronavírus no Brasil, em 26 de fevereiro, o país levou 74 dias para confirmar 10 mil mortes por covid-19. Número difícil de traduzir diante da dor de familiares e amigos. Se comparado, é 140 vezes maior que o número de vítimas no acidente aéreo com o time da Chapecoense, em 2016; e 41 vezes as perdas no incêndio da boate Kiss, em 2013; ou ainda três vezes maior que o atentado do 11 de setembro nos Estados Unidos, em 2001. A dura realidade dos últimos dois meses e meio, no país, porém, deverá ficar ainda pior na próxima semana, quando o Brasil pode chegar a 20 mil óbitos. Segundo uma estimativa do portal Covid-19 Brasil, que reúne pesquisadores da Universidade de São Paulo (USP) e da Universidade de Brasília (UnB), o país ultrapassará os 21,1 mil óbitos em 20 de maio. Até ontem, segundo dados do Ministério da Saúde, 11.519 brasileiros perderam a vida pela doença, 396 a mais que domingo. Nas últimas 24h, foram 5.632 novos registros de pessoas infectadas, chegando a 168.331 casos confirmados.

O cálculo do grupo Covid-19 Brasil é feito por meio de modelo matemático exponencial para os 10 dias seguintes à marca dos 10 mil óbitos, ultrapassada no sábado. A análise indica, ainda, que no dia 20 haverá cerca de 320 mil infectados. Em outra metodologia de projeção, os mesmos pesquisadores estimam que, devido à falta de testagens em massa, o número real de brasileiros que contraíram a doença pode ser 16 vezes maior do que se tem nos balanços oficiais. No sábado, enquanto a pasta de Saúde divulgava o montante de 155.939 casos da doença, o portal calculava que o número variava entre 1,8 milhão e 2,5 milhões.

“As taxas de letalidade (no Brasil e no mundo) têm variado, especialmente, pela incerteza sobre a quantidade total de pessoas infectadas, o que se dá, especialmente, pela falta de disponibilidade de testes de confirmação da infecção pela covid-19, produzindo discrepâncias importantes no cenário internacional”, diz o relatório. A consequência, para os especialistas, é a “dificuldade na elaboração de políticas públicas para conter o vírus, o que deixa a probabilidade de uma flexibilização do isolamento cada vez mais incerta.”

Sexto lugar

Dos países com mais de 20 mil infectados, o Brasil é um dos piores em relação a testagem por 1 milhão de habitantes. Somente Paquistão, Índia e México, de um total de 27 na lista, tem capacidade menor do que a brasileira em relação a diagnóstico de casos. Brasil é o sexto país com maior quantidade de mortes pela covid-19 no mundo, atrás dos Estados Unidos (78.320), Reino Unido (31.662), Itália (30.395), França (26.313) e Espanha (26.299). Os números foram levantados pela Universidade Johns Hopkins, referência mundial em pesquisas de coronavírus.

Segundo o geógrafo e sanitarista Christovam Barcellos, vice-diretor de Pesquisa do Instituto de Comunicação e Informação em Saúde da Fundação Oswaldo Cruz (Icict/Fiocruz), o fator de crescimento da doença no Brasil tem sido parecido ao observado no início da pandemia na Itália. A evolução da pandemia no país, porém, depende de vários fatores, principalmente, da adesão ao isolamento social.

“Nas próximas semanas, o Brasil pode mudar de tendência devido a medidas específicas que estão sendo tomadas em cada estado e município”, pondera Barcellos. Já na próxima segunda-feira (18), o Brasil deve chegar a 18.292 mortes por covid-19. A estimativa é calculada pela MonitoraCovid-19, ferramenta virtual criada pelo Icict/Fiocruz para monitorar a pandemia e sua tendência por estados e municípios brasileiros. Se a previsão se confirmar, a quantidade terá dobrado em 11 dias.

É com base no último período de duplicação de casos/óbitos do país que a ferramenta calcula a tendência de evolução da pandemia. Se o país demorou 5 dias para duplicar os casos, por exemplo, o modelo assume comportamento linear e projeta um novo intervalo de tempo para a duplicação em cinco dias, distribuindo os casos igualmente para esse período.

Entre as capitais brasileiras, São Paulo, Rio de Janeiro e Manaus viram a quantidade de mortes por covid-19 dobrar cinco vezes desde o início da pandemia.

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Dois meses de pandemia 

Bruna Lima

Maria Eduarda Cardim

12/05/2020

 

 

Há dois meses, a Organização Mundial da Saúde declarou que o mundo vivia uma pandemia, período em que o Brasil teve chance de observar as experiências de outros países e estudar melhores formas de impedir que a covid-19 ganhasse força em território nacional. O que se observa, no entanto, é um país que luta para conseguir se equipar e receber doentes, enquanto o número de mortos e casos têm potencial de dobrar a cada semana. Com a maior taxa de transmissão entre os países mais afetados pela doença, a previsão é de que a curva ainda mantenha o potencial de crescimento, levando especialistas a questionarem se o Brasil soube aproveitar o momento de preparação.

Ontem, dia em que a pandemia do novo coronavírus completou dois meses, o Brasil confirmou mais 5.632 casos e 396 mortes pela covid-19. Os números foram adicionados no balanço do Ministério da Saúde e, com isso, o país soma 168.331 casos e 11.519 mortes. De acordo com o balanço divulgado, ontem, pelo Ministério da Saúde, cinco estados já ultrapassaram a marca de mil mortes. São Paulo vem em primeiro, com 3.743 fatalidades, seguido por Rio de Janeiro (1.770), Ceará (1.189), Pernambuco (1.087) e Amazonas (1.035).

Falta testagem

Na avaliação do coordenador do curso de especialização em administração hospitalar e de serviços e sistemas de saúde da FGV, Walter Cintra, o país não foi capaz de aplicar as medidas necessárias de maneira eficaz. “Estamos tendo dificuldades com o isolamento social, ficando cada vez mais clara a necessidade de implantar o lockdown. Não conseguimos, até agora, fazer a testagem laboratorial em quantidade suficiente para fornecer dados que ajudariam ao processo de tomadas de decisão.”

Além disso, Walter considera que a proteção das populações mais vulneráveis é um ponto fraco. “Em um país com uma das maiores desigualdades sociais do mundo, o Estado precisa agir rapidamente para fornecer condições mínimas para as comunidades, desde o fornecimento de água até acesso igual aos serviços de saúde. O Estado está muito lerdo na liberação de recursos financeiros para a população. Lerdo, burocrático e atabalhoado, quando vemos pessoas se aglomerando em filas para receber o benefício”, considera.

Sem a adesão necessárias às medidas de isolamento, o volume de casos tem sido o que os especialistas anteciparam. A previsão do estudo epidemiológico do Imperial College, de Londres, era de que o Brasil chegaria no início desse mês a 10 mil óbitos. O que foi confirmado. O estudo considera que a capacidade de transmissão do vírus é considerada “muito alta”.O cálculo é de um brasileiro doente infectando quase outras três pessoas, já que o indicador de propagação ficou em 2,81. Comparando com outros 47 países, o Brasil é seguido pela Irlanda (2,24), México (1,95), Polônia (1,78) e Peru (1,55). Quanto maior esse número, mais rápido a doença se espalha entre a população.

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Teich propõe diretrizes de lockdown

Maria Eduarda Cardim

12/05/2020

 

 

Com o crescente número de mortes e casos, o lockdown passou a ser uma realidade em diversos estados do Brasil. Em outros tantos, já há medidas mais restritivas de isolamento social. Ontem, o Ministério da Saúde apresentou, de forma geral, a estratégia de gestão de risco para orientar medidas de distanciamento nos estados e municípios. O ministro Nelson Teich não detalhou a proposta, mas prometeu que fará isso após uma validação dos secretários de saúde, amanhã. Enquanto isso, os estados continuam a adotar medidas mais restritivas, cada um com seu critério.

O governo de Pernambuco decretou quarentena nos municípios de Recife, Olinda, Jaboatão dos Guararapes, Camaragibe e São Lourenço da Mata, com o objetivo de aumentar os índices de isolamento social na região metropolitana. O decreto prevê o uso obrigatório de máscaras, controle da circulação de pessoas através da exigência de documento de identificação, justificativa do destino e finalidade para a saída, e rodízio de veículos. As medidas serão implantadas no período de 16 a 31 de maio, mas já passam a valer a partir de hoje em caráter educativo.

A prefeitura do Rio de Janeiro segue aumentando as medidas restritivas. “Vamos ampliar nossas interrupções nos centros de comércio aos bairros de Santa Cruz, Madureira, Jacarepaguá, Tijuca, Grajaú, Pavuna e a área de Cascadura. Nossa ideia é manter a ação durante 7 dias”, anunciou o prefeito Marcelo Crivella. Ontem, no Maranhão, primeiro estado a aderir ao lockdown, começou o rodízio de veículos, que pretende diminuir ainda mais o fluxo de pessoas.

A estratégia apresentada pelo Ministério da Saúde se baseia em quatro eixos: capacidade instalada, perfil epidemiológico do local, velocidade de crescimento da doença e a mobilidade urbana.