Correio braziliense, n. 20809 , 13/05/2020. Política, p.6
Exames entregues ao STF
Marisa Wanzeller*
13/05/2020
Após resistir em três instâncias do Judiciário, Advocacia-Geral da União envia os testes do presidente Bolsonaro ao ministro Ricardo Lewandowski, escolhido para julgar o caso no Supremo Tribunal Federal. Assunto teria sido citado na reunião ministerial de 22 de abril
A Advocacia-Geral da União informou, em nota, que entregou ao ministro do Supremo Tribunal Federal Ricardo Lewandowski os exames do presidente da República, Jair Bolsonaro, para verificar um possível diagnóstico da covid-19. Segundo a nota da AGU, “os laudos confirmam que o presidente testou negativo para a doença”. Lewandowski é o ministro relator do recurso apresentado pelo jornal O Estado de S. Paulo para ter acesso aos exames. O veículo trava uma disputa com o governo em diferentes instâncias do Judiciário para obter o documento.
O Planalto tem dito que o resultado dos exames é negativo, mas se nega a compartilhar os laudos. O governo não seguiu a Lei de Acesso à Informação para divulgar os testes por entender que a “intimidade, vida privada, honra e imagem das pessoas” envolvidas se impõem sobre o acesso aos papéis. Esse é o principal argumento da Advocacia-Geral da União nos recursos apresentados aos tribunais. Na nota, a AGU informou que entregaria os laudos “em mãos” no gabinete de Lewandowski, “tendo em conta a natureza pessoal dos dados em questão”. O gabinete de Lewandowski comunicou que os exames foram recebidos às 22h de ontem e serão encaminhados para análise do ministro na manhã de hoje.
Iniciada na Justiça Federal de São Paulo, a ação movida pelo Estadão pontua “cerceamento à população do acesso à informação de interesse público”, consequentemente “censura à plena liberdade de informação jornalística”. Ainda em abril, o Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF-3) garantiu ao veículo de notícias o acesso aos exames, enfatizando ser de suma importância que a população tenha conhecimento das condições de saúde do presidente.
A AGU recorreu, então, ao Superior Tribunal de Justiça. Na última sexta-feira, o presidente do STJ, João Otávio Noronha, acatou os argumentos do governo e desobrigou o presidente de apresentar o resultado dos exames. No início desta semana, o Estadão entrou com recurso no Supremo Tribunal Federal. Pelo sistema de sorteio eletrônico do STF, o ministro Ricardo Lewandowski foi escolhido para julgar o caso.
Impeachment
O exame de Bolsonaro para covid-19 é um dos elementos incluídos no polêmico vídeo da reunião ministerial de 22 de abril, o assunto mais falado ontem em Brasília. Segundo informações do Estadão, o presidente Jair Bolsonaro teria afirmado que não divulgaria a “porcaria” do exame da covid-19 por medo de um processo de impeachment. O vídeo ainda está em sigilo, mas pode se tornar público se houver uma determinação do ministro Celso de Mello, relator do inquérito que averigua denúncia de interferência de Bolsonaro na Polícia Federal.
Conhecido por minimizar os efeitos da covid-19, que já chamou de “gripezinha”, Bolsonaro insinuou que pode ter contraído a doença, apesar das indicações de que testou negativo. No final de abril, em entrevista à Rádio Guaíba, o presidente especulou: “Eu talvez já tenha pegado esse vírus no passado, talvez, talvez, e nem senti”, afirmou. O presidente foi submetido a dois testes para covid-19 em 12 e 17 de março.
No final desse mês, em pronunciamento à nação, Bolsonaro voltou a falar sobre a possibilidade de contrair a doença que se transformou em pandemia. “No meu caso particular, pelo meu histórico de atleta, caso fosse contaminado pelo vírus, não precisaria me preocupar, nada sentiria, ou seria, quando muito, acometido de uma gripezinha, ou resfriadinho, como bem disse aquele conhecido médico, daquela conhecida televisão”, declarou.
*Estagiária sob supervisão de Carlos Alexandre de Souza