Correio braziliense, n. 20811 , 15/05/2020. Brasil, p.6

 

200 mil profissionais de saúde afastados

Bruna Lima

15/05/2020

 

 

CORONAVÍRUS » No dia em que o Brasil registra mais de 31 mil médicos e enfermeiros infectados com covid-19, relatório do CFM aponta denúncia de quase 17 mil irregularidades. Falta de pessoal está entre as reclamações mais frequentes. Região Sudeste concentra as queixas

Do álcool em gel a membros de equipe. Falta de tudo. Sem condições necessárias para garantir a segurança de quem atua na linha de frente do combate ao novo coronavírus, quase 200 mil profissionais da saúde foram afastados com suspeita de covid-19 no Brasil. Milhares de médicos denunciam deficiências nas unidades de saúde, que vêm dificultando o trabalho e favorecendo o adoecimento. É justamente nas cidades onde há mais relatos de carências em que é encontrado o maior índice de brasileiros infectados e, consequentemente, de perdas. Em todo o país, dados do último balanço do Ministério da Saúde dão conta de quase 14 mil mortos em decorrência da pandemia, além de 200 mil casos confirmados.

Foram registradas 16.879 inconformidades nas quase 2,2 mil denúncias feitas pelos profissionais da saúde ao Conselho Federal de Medicina (CFM). “Os resultados permitem inferir uma associação estatística entre a quantidade de denúncias apresentadas pelos médicos e o número de óbitos e de novos casos de covid-19 notificados em cada um dos estados. Isto significa que, quanto maior o número de denúncias, maior a probabilidade de casos existentes e óbitos”, aponta o presidente do CFM, Mauro Ribeiro.

As duas capitais com mais mortes pela doença também são as que concentraram mais reclamações. Só em São Paulo e Rio de Janeiro foram relatadas 187 e 161 denúncias, respectivamente. O Sudeste reúne o maior número de relatos dos médicos, com 947 (44%) no total. Proporcionalmente, é a região onde também foi notificado o maior número de casos e de mortes — 74.727 (42%) e 5.830 (51%), respectivamente. O Nordeste aparece em segundo, com 28% das denúncias, seguido pelo Sul, com 12%; Centro-Oeste, 8%; e Norte, 7%.

Um dos destaques do relatório refere-se à escassez de profissionais atuando na linha de frente, principalmente de enfermeiros. Das queixas, 974 formulários destacaram o problema, que representa 42,1% das carências no quesito recursos humanos. É justamente esse grupo que representa a maioria dos profissionais afastados com suspeita de covid. Enfermeiros, técnicos e auxiliares de enfermagem representam 51% dos afastados (101.983). Outros 26,5 mil médicos também foram afetados.

Dos 199.768 profissionais da saúde removidos com suspeita da doença, 31.790 tiveram resultado positivo para a infecção (16%). O diagnóstico de 114.301, ou seja, 57% desse montante, está sob investigação. Outros 53.677 deram negativo para o vírus e puderam voltar para os hospitais. O ministério não divulgou o número de profissionais mortos em razão da doença.

O secretário substituto de Vigilância em Saúde, Eduardo Macário, destacou que o número de afastamentos preocupa o Ministério da Saúde. “Independente de confirmados ou não os casos, todo profissional de saúde que apresenta sintomas precisa ser afastado do trabalho naquele período para se observar e prevenir a transmissão intra-hospitalar”.

Cobrança

A principal queixa do relatório diz respeito à falta de equipamentos de proteção individual (EPIs). No Hospital Regional da Asa Norte (Hran), unidade de referência no atendimento à Covid no Distrito Federal, servidores reclamam. “O fornecimento (de EPIs) é limitado e não atende aos padrões devidos e necessários. Alguns setores estão sendo privilegiados e têm acesso a mais equipamentos. Mas, por exemplo, o setor do banco de sangue, que assiste a todos os locais, não recebe todos os materiais”, disse um servidor, sob condição de anonimato. A Secretaria de Saúde do DF sustenta que, desde o início da pandemia, “a distribuição dos EPIs foi modificada, garantindo o uso racional, e evitando, assim, que haja desperdício neste momento”.

Para o conselheiro responsável pelo Departamento de Fiscalização, junto ao CFM, Emmanuel Fortes, os dados revelados são um retrato da realidade brasileira e servem como uma forma de cobrança às autoridades. “A saúde nunca foi prioridade efetivamente. Atenção básica, por mais capilaridade que tenha, não atende a todas as demandas. Ela está demonstrando toda sua habilidade agora, mas, mesmo assim, é maltratada com relação à infraestrutura e referenciamento, porque quando recebe, não tem para onde mandar”, problematiza Fortes. Segundo ele, partir da compilação das denúncias, o CFM espera intensificar a fiscalização e sensibilizar ministérios públicos para atuar nesse processo de monitoramento e cobrança por investimento.

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País tem 200 mil infectados 

Bruna Lima

Maria Eduarda Cardim

15/05/2020

 

 

O Brasil voltou a bater o recorde do número de infectados por covid-19 em 24 horas. Mais 13.944 registros foram adicionados ao balanço diário do Ministério da Saúde. Com isso, o país passou a marca dos 200 mil casos, chegando a 202.918. Numa crescente, voltou a confirmar mais de 800 mortes pela doença de um dia para o outro. Foram 844 novos óbitos, totalizando 13.993 vidas perdidas pelo novo coronavírus. O Brasil já ocupa o sexto lugar no ranking de países com mais casos da doença e só fica atrás dos Estados Unidos, Rússia, Reino Unido, Espanha e Itália.

Com 54.286 casos, São Paulo continua sendo o estado mais afetado pela doença, mas houve mudança no segundo lugar. Ceará ultrapassou o Rio de Janeiro, totalizando 21.077 infectados, contra 19.467 registrados no Rio. O estado fluminense segue na vice-liderança, porém, no número de mortes, com 2.247 óbitos. São Paulo segue em primeiro, com 4.315 vidas perdidas. Outros quatro estados registram mais de mil fatalidades cada. São eles: Ceará (1.413), Pernambuco (1.289), Amazonas (1.235) e Pará (1.063). Os cinco estados somam 82% das mortes do país.

Sem o ministro da Saúde, Nelson Teich, que desde segunda-feira não participa das coletivas de imprensa da pasta, coube ao secretário-substituto de Vigilância em Saúde, Eduardo Macário, comentar a situação do país no enfrentamento à covid-19. “A principal mensagem é de que ainda estamos no momento de crescimento de casos, não há nenhuma perspectiva nesse momento de estabilização ou até mesmo diminuição. Serve de alerta para que não só gestores e profissionais, mas para que a população tome os devidos cuidados para evitar a infecção pelo coronavírus”, disse.

Ainda segundo o Ministério da Saúde, a covid já chegou a mais da metade dos municípios brasileiros, atingindo 2.998 localidades — o percentual representa 53,8% do total. Há registro de óbitos em 1.087 municípios, alcançando todos os estados e o Distrito Federal.

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Bolsonaro exige uso da cloroquina

Augusto Fernandes

Ingrid Soares

15/05/2020

 

 

Fora dos holofotes desde o início da semana, o ministro da Saúde, Nelson Teich, foi colocado contra a parede pelo presidente Jair Bolsonaro para mudar o entendimento da pasta sobre o uso da cloroquina e do seu derivado, a hidroxicloroquina. Repreendido por utilizar as redes sociais para alertar dos riscos dos medicamentos, ele agora terá de atender a uma exigência do presidente caso queira seguir no governo e elaborar um protocolo permitindo a aplicação das substâncias assim que os pacientes infectados demonstrarem os sintomas iniciais.

Bolsonaro afirmou que as novas normas do Ministério da Saúde devem ser divulgadas ainda hoje. Por enquanto, o único protocolo da pasta sobre a utilização da hidroxicloroquina foi divulgado ainda sob a gestão de Luiz Henrique Mandetta e recomenda o medicamento como opção apenas para quadros graves (pacientes hospitalizados com pneumonia viral).

Ontem, durante videoconferência com empresários, o presidente afirmou que exigiu a alteração do protocolo. “Estou exigindo a questão da cloroquina agora. Se o Conselho Federal de Medicina decidiu que pode usar cloroquina desde os primeiros sintomas, por que o governo federal, via ministro da Saúde, vai dizer que é só em caso grave?”

Bolsonaro disse, ainda, que foi eleito presidente justamente para fazer escolhas. “Votaram em mim para eu decidir. E essa decisão da cloroquina passa por mim. Pode mudar e vamos mudar”, completou.

Há três semanas, o CFM emitiu um parecer com critérios e condições para a prescrição da cloroquina e da hidroxicloroquina, em pacientes com covid-19. A autarquia constatou “que não há evidências sólidas de que essas drogas tenham efeito confirmado na prevenção e tratamento dessa doença”. De todo modo, o CFM entende ser possível a prescrição desses medicamentos em situações específicas.