Correio braziliense, n. 20815 , 19/05/2020. Mundo, p.12

 

Trump acusa OMS de ser "marionete da China"

19/05/2020

 

 

CORONAVÍRUS » Na Casa Branca, presidente americano critica agência da ONU por gestão da pandemia e revela que está tomando, preventivamente, hidroxicloquina. Sob pressão de Washington, Pequim promete compartilhar com todos os países uma eventual vacina contra a covid-19

No crescente embate com a China, o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, elevou, ontem, as críticas à Organização Mundial da Saúde (OMS), acusando a agência da ONU de ser um fantoche de Pequim na gestão da pandemia do novo coronavírus. “Não estou contente. São uma marionete da China. São sino-cêntricos, para ser simpático”, disse Trump, na Casa Branca. “Eles nos deram um monte de maus conselhos”, acrescentou, reiterando que os EUA arcam com maior contribuição feita por um país à organização.

Durante a conversa, Trump surpreendeu os jornalistas ao revelar que está tomando hidroxicloroquina, um medicamento antimalária que divide os especialistas médicos sobre sua eficácia no combate à infecção pelo Sars-CoV-2. O presidente americano afirmou ter testado negativo para a covid-19 e que não tem sintomas da doença. Toma o remédio preventivamente há cerca de uma semana e meia. “Porque eu acho que é bom. Ouvi um monte de boas histórias”, disse ao ser perguntado sobre a motivação.

Trump sempre minimizou os riscos do novo coronavírus e se recusa a usar máscara, contrariando as recomendações de autoridades americanas. Em contrapartida, vem demonstrando interesse em promover o uso da hidroxicloroquina, mesmo diante de alertas da comunidade científica.

Erro

Mais cedo, durante a primeira Assembleia Mundial da Saúde (AMS) realizada por videoconferência, os Estados Unidos criticaram veementemente o “fracasso” da OMS no enfrentamento da pandemia. Washington acusa Pequim de ocultar o alcance da epidemia e culpa a agência das Nações Unidas por errar ao administrar a crise, seguindo a posição chinesa. Por isso, Trump suspendeu a contribuição financeira para a instituição.

O secretário americano de Saúde, Alex Azar, afirmou que o desempenho da OMS custou “muitas vidas” e exigiu que a organização seja transparente e se explique. A maioria dos participantes da reunião, em contrapartida, elogiou o desempenho da OMS e de seu diretor, Tedros Adhanom Ghebreyesus, mas reconheceu que a agência precisa se fortalecer.

Os países decidiram adiar os debates sobre a participação de Taiwan como observador, uma reivindicação dos Estados Unidos e de outras 15 nações. Taipé ocupou essa posição por um tempo, mas foi excluída da OMS em 2016, com a chegada ao poder da presidente Tsai Ing-wen, que se recusa a reconhecer o princípio da unidade da ilha e da China continental dentro do mesmo país.

O adiamento dos debates foi aceito sem oposição de Washington, mas logo depois o chefe da diplomacia americana, Mike Pompeo, condenou a exclusão de Taiwan. Ele denunciou a falta de independência de Tedros Ghebreyesus, a quem acusou de ter decidido não convidar Taipé sob pressão de Pequim.

“Bem público”

Sob pressão, o presidente da China, Xi Jinping, estendeu a mão à comunidade internacional, prometendo compartilhar uma eventual vacina e alocar US$ 2 bilhões para a luta global contra a covid. Em uma mensagem de um vídeo, Xi disse que a ideia é tornar a imunização “um bem público mundial”. Afirmou ainda que é a favor de uma avaliação “completa e imparcial” da resposta ao novo coronavírus, uma vez que a pandemia for interrompida.

Apesar das fortes críticas dos Estados Unidos à OMS e à China, os países esperam aprovar uma resolução, promovida pela União Europeia, que pede “acesso universal, rápido e igual a todos os meios (...) necessários para reagir contra a pandemia”.

No início da reunião, o secretário-geral das Nações Unidas, António Guterres, criticou os países que “ignoraram as recomendações da OMS” e considerou que o mundo paga um alto preço pela execução de estratégias divergentes. “Como consequência, o vírus se espalhou pelo mundo e agora está se encaminhando para os países do sul, onde pode causar efeitos ainda mais devastadores”, assinalou.

O diretor da OMS reiterou que a organização “acionou o alarme rapidamente”. Ainda assim, disse que lançará uma “avaliação independente o mais rápido possível, no momento apropriado, para revisar as experiências e lições aprendidas e fazer recomendações com o objetivo de melhorar a preparação nos níveis nacional e global”.