Correio braziliense, n. 20817 , 21/05/2020. Economia, p.10

 

Empresários recorrem a Maia por crédito

Marina Barbosa

Simone Kafruni

21/05/2020

 

 

Cansados de tentar apelar ao governo na tentativa de obter crédito durante a pandemia do novo coronavírus, empresários buscaram a ajuda do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), para que os recursos cheguem ao setor produtivo. O apelo foi feito a Maia, ontem, em live promovida pela União Nacional de Entidades do Comércio e Serviços (Unecs), com apoio da Frente Parlamentar de Comércio, Serviços e Empreendedorismo.

O presidente da Unecs, George Pinheiro Marques, pediu ao parlamentar que intervenha junto ao Tesouro a ampliar a garantia governamental nos financiamentos bancários, de 85% para 100% do crédito — ou seja, que o governo assuma todo o risco de uma eventual inadimplência para que, dessa forma, os bancos sintam-se encorajados a emprestar dinheiro para as empresas nesse momento de crise. Ainda ontem, o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, admitiu que, apesar das medidas do governo, os recursos não estão chegando ao setor produtivo na medida necessária.

Rodrigo Maia, que ouviu o apelo do empresariado junto com vários outros deputados, mostrou-se favorável ao pleito. “Eu disse, logo no início, a alguns bancos, à equipe econômica, ao Roberto Campos (Neto, presidente do Banco Central) que tinha que ser 100% de garantia. A dúvida deles é se alguns empresários teriam interesse em pagar nessas condições. Eu disse que ao contrário, porque ninguém vai querer ficar sempre com o nome sujo. Sempre defendi que o governo deveria ser garantidor de 100%, porque sabemos que os bancos, querendo ou não, sendo responsáveis por parte do crédito, iam acabar usando as travas que qualquer banco tem”, afirmou.

O presidente da Câmara, porém, não assumiu o compromisso de pautar um projeto nesse sentido. E indicou que talvez agora fosse o momento de avaliar as políticas do governo, já que o Executivo sancionou nesta semana o programa que libera crédito para micro e pequenas empresas e tem dito que outras medidas estão por vir.

Pinheiro Marques afirmou que muitas empresas estão precisando de recursos para se manterem vivas, já que estão fechadas há mais de dois meses por conta das medidas de isolamento social necessárias ao combate à covid-19. Lembrou, no entanto, que a maior parte delas não está conseguindo acessar as linhas de crédito que foram anunciadas pelo governo durante a pandemia.

“Ou o parlamento toma a frente para que consigamos sair dessa guerra com menos empresas mortas ou... Milhões de empresas estão falindo no Brasil porque não conseguiram os recursos que o Legislativo e o governo federal colocaram à disposição. Confiamos na sua liderança”, disse a Maia.

Também num encontro com empresários, o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, reconheceu que o dinheiro prometido pelo governo ao setor produtivo não está chegando na ponta e que é preciso adotar medidas para redirecionar o capital. “Empresas menores é onde temos que trabalhar”, afirmou, durante reunião virtual com dirigentes da Associação Brasileira da Infraestrutura e Indústrias de Base (Andib).

Campos Neto lembrou as diversas medidas adotadas pelo BC nos últimos meses, que representaram uma injeção de recursos equivalente a 16% do Produto Interno Bruto (PIB) no sistema financeiro. Segundo ele, o potencial de crédito, se tudo for aproveitado, é de R$ 1,1 trilhão. “Os bancos estão aumentando a concessão de crédito, mas a demanda também aumentou, por isso a sensação de não estar sendo atendido”, justificou.

O presidente do BC ressaltou que os bancos privados são responsáveis por 80% da concessão de crédito, ante 20% dos bancos públicos. Embora afirmando que a concessão de crédito esteja aumentando, Campos Neto admitiu que é preciso fazer melhor direcionamento. “Devemos anunciar mais medidas. O sistema está com liquidez, mas é preciso fazer com o que o dinheiro chegue aonde a gente quer”, reiterou.

Comportamento

Campos Neto admitiu que a concessão de crédito cresce mais para as grandes empresas, menos para as médias e muito pouco para as pequenas. “Houve uma mudança na parte de modelagem de crédito. Os bancos estão olhando o comportamento da empresa e fazendo menos análise de balanço”, afirmou “Isso significa que o banco sabe que a pequena empresa paga luz, aluguel e fornecedores, e, de repente, parou de pagar. Então, isso afeta o modelo de risco das empresas que estão elegendo não pagar”, explicou.

Frase

 "Milhões de empresas estão falindo no Brasil porque não conseguiram os recursos que o Legislativo e o governo federal colocaram à disposição”

George Pinheiro Marques, presidente da Unecs

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Guedes admite prorrogar auxilio

Marina Barbosa

21/05/2020

 

 

Diante da possibilidade de que a crise do novo coronavírus dure mais do que o previsto, o ministro da Economia, Paulo Guedes, já admite que talvez seja preciso prorrogar o auxílio emergencial para desempregados e autônomos. Ele garante, contudo, que o programa não deve ser permanente. Por isso, defende uma redução do atual valor de R$ 600 e aponta R$ 200 como uma quantia possível de ser paga aos trabalhadores por mais um  ou dois meses.

Guedes falou sobre o assunto durante reunião, na terça-feira, com empresários do setor de serviços, cuja receita é diretamente afetada pela disponibilidade de renda dos trabalhadores. Porém, deixou claro que a ideia não é fazer do auxilio emergencial um benefício permanente, já que, como vem dizendo a equipe econômica, o governo não tem orçamento para pagar R$ 600 para quase 60 milhões de pessoas por muito tempo.

O que está em estudo pela equipe econômica é uma forma de amparar os trabalhadores que hoje dependem do auxílio emergencial durante o período necessário para que o achatamento da curva de contágio do novo coronavírus permita a retomada das atividades econômicas. “Ele falou da possibilidade de pensar em uma fórmula de sair dessa situação sem desproteger as pessoas, na medida em que a crise de saúde também vai diminuindo”, disse uma fonte que participou da reunião.

O valor de R$ 200 é o mesmo proposto pelo Ministério da Economia no início do programa, montante que foi elevado pelo Congresso. É uma quantia que, segundo o ministro da Economia, aproxima-se dos valores pagos pelo Bolsa Família e poderia caber no orçamento público por mais tempo. Guedes disse ainda não quer aumentar mais o endividamento público, sem dar detalhes de como isso seria possível.

Novo imposto

No encontro, o ministro afirmou também que quer desonerar a folha de pagamento das empresas para incentivar a geração de empregos no pós-pandemia e, assim, tentar reduzir os impactos negativos da crise do coronavírus no mercado de trabalho. Porém, admitiu que essa medida deve passar por um tema espinhoso: a criação de um imposto sobre movimentações financeiras, nos moldes da antiga CPMF. Guedes explicou aos empresários que, para reduzir encargos trabalhistas, o Executivo precisa criar uma fonte de receita que compense essa perda de arrecadação.

Uma fonte que participou da conversa explicou que essa ideia está em estudo porque transferir o custo da folha de pagamentos para o imposto único que deve ser criado pela reforma tributária deixaria a alíquota do Imposto sobre Valor Agregado (IVA) muito alta, possivelmente perto de 35%. “O governo vai precisar de uns R$ 300 bilhões por ano para acabar com a contribuição. Isso elevaria em mais 10 pontos percentuais a alíquota do IVA”, argumentou.

É um discurso que reforça o que foi ventilado pelo secretário da Receita Federal, José Tostes Neto, na semana passada. Tostes disse, em live com o setor jurídico, que os estudos sobre a nova CPMF foram interrompidos no ano passado por uma decisão política, mas poderiam ser retomados no pós-pandemia se fosse necessário. Na visão da Receita, esse foi um “tributo que deu boa resposta em termos de arrecadação e eficiência”.

Mas, como o presidente Jair Bolsonaro já disse diversas vezes ser contra o aumento de impostos, tanto Guedes, quanto Tostes também indicaram que a nova CPMF deve apenas compensar a arrecadação que deixaria de ser feita com a desoneração da folha.

R$ R$ 200 milhões

Valor proposto por Paulo Guedes para o benefício emergencial “por mais um ou dois meses”