Correio braziliense, n. 20818 , 22/05/2020. Política, p.2

 

Em clima de paz, apoio a congelamento de salários

Augusto Fernandes

Ingrid Soares

22/05/2020

 

 

Em videoconferência pacífica com governadores, Bolsonaro promete sancionar até hoje o projeto de socorro a estados e municípios e recebe respaldo dos gestores à proibição de reajustes para servidores. Governo prevê economia de R$ 130 bilhões com veto a aumentos

A crise política que surgiu no país nos últimos meses devido aos constantes embates entre o presidente Jair Bolsonaro e os governadores teve uma pausa momentânea ontem, quando o chefe do Executivo conversou com os líderes estaduais pela primeira vez desde março para discutir a situação da pandemia do novo coronavírus. Em um tom mais ameno e harmonioso, o comandante do Planalto prometeu aos gestores sancionar até hoje o projeto de lei de socorro financeiro da União a estados e municípios em razão da crise causada pela covid-19 e ainda deixou a porta aberta para futuras reuniões.

Bolsonaro recebeu apoio dos governadores para vetar o trecho do projeto de auxílio financeiro que permite o reajuste salarial a algumas carreiras do funcionalismo público. O governo federal quer retirar o dispositivo do texto para garantir uma economia aos cofres públicos de R$ 130 bilhões pelos próximos 18 meses e congelar as recomposições, pelo menos, até o fim de 2021. Por sua vez, o mandatário garantiu que “as progressões e as promoções vão continuar ocorrendo normalmente”.

“Ao longo das últimas semanas foi conversado o que o servidor poderia colaborar em um momento crítico como esse. Tiveram várias propostas, como redução de 25%, e chegamos à conclusão de que congelando os proventos e remuneração até fim do ano que vem esse peso seria menor, mas de extrema importância para todos nós. Bom para o servidor, porque o remédio é o menos amargo, mas de extrema importância para os 210 milhões de habitantes do Brasil”, ressaltou Bolsonaro.

Ele comprometeu-se a manter na proposta o artigo que propõe que estados e municípios possam realizar aditamento contratual que suspenda os pagamentos devidos neste ano de operações de crédito interno e externo celebradas com o sistema financeiro e instituições multilaterais de crédito. Os governadores também pediram que a primeira parcela do auxílio fosse repassada ainda neste mês.

Pacificação

Cercado de ministros e dos presidentes da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), durante a reunião, Bolsonaro deu esperança à classe política, que viu no comportamento mais moderado do presidente um sinal de que é possível haver mais convergência e trabalho integrado entre todos os entes federativos para o Brasil superar a pandemia, a despeito de todas as disparidades de pensamentos vistas desde que o país confirmou o primeiro diagnóstico da doença, há 87 dias. “Vamos fazer desta reunião não só uma vitória nossa, mas de todo o povo brasileiro”, declarou Bolsonaro, ao fim do encontro.

As sinalizações de trégua partiram também dos governadores. Além de parabenizar Bolsonaro pela reunião com os representantes de todos os estados, os gestores estenderam a mão para o governo federal e disseram que será importante a “união” de todos para contornar a crise sanitária. É uma mudança significativa de Bolsonaro que, há uma semana, declarou “guerra” contra os governadores e disse que era preciso “jogar pesado” contra eles devido às medidas de isolamento social e às restrições de funcionamento de serviços e comércios — os dois temas, porém, não foram discutidos no encontro.

“Vamos em paz, presidente, vamos pelo Brasil e vamos juntos. É o melhor caminho e é a melhor forma de vencer a pandemia”, disse o governador de São Paulo, João Doria (PSDB), um dos principais desafetos recentes de Bolsonaro.

Governador do Espírito Santo, Renato Casagrande (PSB) afirmou ser necessária uma “coordenação central” pelo governo federal para combater a crise do novo coronavírus, que contasse com a participação do Congresso, do Supremo Tribunal Federal e de governadores e prefeitos. “Que a gente possa ter uma coordenação central, porque vai viver ainda um tempo significativo de crise (da covid-19). O que não precisamos, no momento, é de uma crise política. Precisamos proteger os mais vulneráveis”, frisou.

Responsabilidade

Dos políticos que participaram do encontro, a mensagem também foi de pacificação. Alcolumbre disse que “chegou a hora de todos nós darmos as mãos e levantarmos bandeira branca, porque estamos vivendo um excepcional momento de guerra”. “E na guerra todos perdem. A gente tem de ter a consciência de que essa crise é sem precedente na nossa vida, mas seremos cobrados por qual atitude tomamos para enfrentar a dificuldade de saúde pública que já tirou a vida de 20 mil brasileiros, milhares perdendo a chance de um futuro promissor. Nós temos responsabilidade com 210 milhões de brasileiros”, completou.

“Essa fotografia e a sanção desse projeto vão servir para aqueles que insistem em nos dividir. Eles perderão. Estamos unidos com o povo brasileiro, todos os Poderes ao lado dos governadores e prefeitos para enfrentar de cabeça erguida a maior crise sanitária do Brasil e da humanidade e saber qual o país que a gente quer após a pandemia”, acrescentou Alcolumbre.

Já Maia destacou que o projeto de socorro a estados e municípios pode criar melhores condições para o país se recuperar após a pandemia. “A união para o enfrentamento do coronavírus é para salvar vidas. Esses recursos vão nessa linha, e com todos unidos teremos os resultados melhores para a população brasileira. Teremos uma nova realidade e uma necessidade de reorganização do Estado brasileiro”, disse o presidente da Câmara.

Ajuda só deve começar em junho

Durante a reunião com governadores, Bolsonaro não respondeu se conseguiria atender à solicitação deles de que a primeira parcela do auxílio fosse repassada ainda neste mês. Horas mais tarde, porém, a equipe econômica sinalizou que o socorro só deve começar em junho. É que o governo prevê mais três etapas burocráticas até o início das transferências para os entes. Após a sanção, o governo vai precisar liberar esse recurso, editando uma medida provisória com o crédito extraordinário de R$ 60,15 bilhões, operacionalizar o sistema de transferência desses valores e aguardar a contrapartida dos estados e municípios, que é a retirada das ações judiciais que tenham sido impetradas contra a União por causa da pandemia. “Havendo a sanção célere, entendemos que na máxima brevidade será pago. É possível garantir até 31 de maio? Pode ser, mas condicionado a esses três itens”, alertou o secretário especial da Fazenda do Ministério da Economia, Waldery Rodrigues.

Quatro meses de socorro

A União entregará aos estados e municípios R$ 60 bilhões, na forma de auxílio financeiro, em quatro parcelas mensais. O dinheiro deve ser aplicado em ações de enfrentamento à covid-19 e para mitigação de seus efeitos financeiros, da seguinte forma:

I – R$ 10 bilhões para ações de saúde e assistência social, sendo:

a) R$ 7 bilhões aos estados e ao Distrito Federal

b) R$ 3 bilhões aos municípios

II – R$ 50 bilhões, da seguinte forma:

a) R$ 30 bilhões aos estados e ao Distrito Federal

b) R$ 20 bilhões aos municípios

Fonte: PLP 39/2020

____________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________

Equipe econômica: "Todas as categorias foram alcançadas"

Marina Barbosa

22/05/2020

 

 

O congelamento salarial dos servidores públicos vai gerar uma economia de R$ 130,5 bilhões nos próximos 18 meses, sendo R$ 98,9 bilhões para os estados e municípios e R$ 31,5 bilhões, para a União, segundo os cálculos da equipe econômica. Isso porque todas as categorias do funcionalismo público devem ser atingidas pela medida. Só serão permitidos, portanto, aumentos para os servidores que estão na linha de frente do combate ao novo coronavírus.

O impacto fiscal do congelamento salarial foi apresentado pela equipe econômica, ontem, em coletiva de imprensa realizada no Palácio do Planalto, poucas horas depois de o presidente Jair Bolsonaro discutir o assunto com os governadores e confirmar que vetaria a possibilidade de aumento salarial do funcionalismo público até 2021.

Segundo a equipe econômica, “o veto permite o aumento na economia de despesa na ordem de R$ 88 bilhões, saindo de 42 bilhões para R$ 130 bilhões”. Afinal, com isso, fica vedado o reajuste a uma série de categorias do funcionalismo público que tinham sido tratadas como exceção na votação do projeto na Câmara, como os militares, os policiais rodoviários federais e os guardas municipais. “Todas as categorias foram alcançadas. As exceções deixam de ser alcançadas com o veto”, afirmou o chefe da Assessoria Especial de Relações Institucionais do Ministério da Economia, Esteves Colnago.

A única exceção de reajuste será, portanto, para os servidores que estão trabalhando diretamente no combate ao novo coronavírus. “Aumentos relacionados a despesas de pessoal ou à criação de despesas obrigatórias acima da inflação estão vedados. Contudo, se os governadores, os prefeitos ou mesmo o governo federal desejarem dar um aumento, uma compensação aos médicos, técnicos de enfermagem, bombeiros, profissionais de segurança pública ou mesmo professores que estejam lidando com o tratamento ou o combate aos problemas gerados pelo coronavírus, está permitido”, detalhou o secretário especial de Fazenda, Waldery Rodrigues.

Contrapartida

Na linha do que defende o ministro da Economia, Paulo Guedes, a equipe econômica argumentou que o congelamento salarial representa uma contrapartida do funcionalismo à crise causada pelo novo coronavírus, que elevou o endividamento público e deixou milhões de brasileiros sem emprego. A ideia é de que, como aprofundou demais o seu endividamento público neste ano, o governo não gere despesas obrigatórias que também tenham impacto fiscal em 2021 neste momento de pandemia. Guedes também dizia, contudo, que era preciso ter certeza de que as transferências de R$ 60,15 bilhões que foram liberadas pelo projeto de auxílio aos estados e municípios seriam empregadas no combate ao coronavírus e não virariam aumento salarial.

Divisão

Ainda segundo os cálculos da equipe econômica, a maior parte da economia gerada por essa medida deve ficar com os estados e municípios. A previsão é de que os R$ 130,5 bilhões que o governo vai deixar de gastar neste e no próximo ano sejam divididos da seguinte maneira: R$ 52,4 bilhões nos estados, R$ 46,5 bilhões nos municípios e

R$ 31,5 bi, na União. “A economia fiscal será de quase R$ 100 bilhões só nos estados e municípios”, destacou o secretário especial de Fazenda, Waldery Rodrigues.