Valor econômico, v.20, n.4989, 28/04/2020. Política, p. A5

 

Bolsonaro convida André Mendonça para lugar de Sergio Moro na Justiça

Matheus Shuch

Fabio Murakawa

28/04/2020

 

 

O presidente Jair Bolsonaro decidiu escolher um nome de sua estrita confiança para suceder Sergio Moro no comando do Ministério da Justiça e Segurança Pública. O advogado-geral da União, André Mendonça, foi considerado a melhor alternativa após o favorito do presidente, o ministro da Secretaria-Geral da Presidência, Jorge Oliveira, indicar que preferia continuar despachando no Palácio do Planalto.

Nos bastidores, Bolsonaro admite que sua opção número um era Oliveira. Mas o ministro trabalhou contra a própria nomeação. Tido como técnico e de perfil discreto, com boa interlocução com o Judiciário, ele temia ficar sob fogo cruzado por ser amigo da família Bolsonaro. Moro deixou o cargo na sexta-feira acusando o presidente de tentar interferir em investigações da Polícia Federal, apura o envolvimento do vereador Carlos Bolsonaro (Republicanos-RJ) no alastramento de fake news.

Tanto Oliveira quanto Mendonça são favoritos às duas vagas a que Bolsonaro terá direito de indicar no Supremo Tribunal Federal (STF) até o término do atual mandato. Nesse sentido, a nomeação para a Justiça seria mais danosa ao primeiro do que ao segundo.

No fim da tarde, ao chegar no Palácio da Alvorada, o presidente manteve o mistério. "Vocês vão ter uma surpresa positiva, tem dois nomes postos à mesa, o Jorge e outro. Eu não vou falar porque, se muda, vão falar que eu recuei", afirmou aos jornalistas, garantindo que a nomeação sairia no Diário Oficial da União desta terça.

Bolsonaro também ressaltou a importância de Oliveira no atual cargo. "O Jorge tem muita experiência, ele acumula com a SAJ (Subchefia para Assuntos Jurídicos), a SAJ é a alma do presidente, tem muita coisa que eu assino e leio a ementa apenas", afirmou.

O presidente disse que, para ele, tanto a Justiça como a SAJ garantem boa exposição. E que pessoas que ocuparam estes cargos no passado já foram premiadas com indicações ao STF.

Com a provável saída de Mendonça, a Advocacia-Geral da União deverá ser assumida pelo procurador-geral da Fazenda Nacional, José Levi.

Em outra frente, Bolsonaro tem dado sinais de que está disposto a mudar de postura sobre a participação de partidos em cargos-chave no governo. A discussão com partidos pode ocorrer inclusive se houver a recriação da pasta da Segurança Pública, alvo de cobiça da "bancada da bala" no Congresso.

Bolsonaro admitiu que o ex-deputado Alberto Fraga, um de seus amigos mais próximos e candidato à pasta da Segurança, entrará um dia no governo.

Ontem Bolsonaro afirmou que precisa levar em conta "o momento" da política e não descartou colocar políticos de carreira em cargos de primeiro escalão.

"Não é porque a pessoa foi parlamentar por um tempo que carimbou na testa dele que não pode ser aproveitado em outra função."

Bolsonaro pode entregar cargos a integrantes do bloco, formado por partidos como PTB, PSD, Republicanos, PL e PP. Entre os postos almejados, estão o Ministério de Ciência e Tecnologia, comandado hoje pelo ministro Marcos Pontes, e a diretoria-executiva do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (DNIT), cujo titular, Andre Kuhn, foi exonerado.

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Presidente reafirma apoio a Guedes

Cristiano Zaia 

Rafael Walendorff

Daniel Gullino

Matheus Schuch

28/04/2020

 

 

O presidente Jair Bolsonaro atuou ontem pessoalmente para prestigiar o ministro da Economia, Paulo Guedes, e afastar os rumores de que o auxiliar estaria fragilizado. Guedes, por sua vez, reafirmou o compromisso da política econômica com as "reformas estruturantes" e os investimentos privados, além do teto de gastos.

O gesto foi feito logo pela manhã, para garantir que a mensagem chegasse a investidores, empresários e ao meio político antes da abertura dos mercados. Após reunião convocada às pressas na noite de domingo, Bolsonaro saiu do Alvorada ao lado de Guedes e dos ministros Tarcísio de Freitas (Infraestrutura), Tereza Cristina (Agricultura), Wagner Rosário (Controladoria-Geral da União) e do presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, com um recado: "O homem que decide economia no Brasil é um só, chama-se Paulo Guedes. Ele nos dá o Norte, nos dá recomendações e o que nós realmente devemos seguir."

O movimento ocorreu depois da demissão do ex-ministro da Justiça, Sergio Moro, quando cresceram os rumores de que Guedes seria o próximo a enfrentar um processo de fritura em razão da pressão de alas do governo por um programa amplo de investimentos públicos. Esse plano seria defendido, por exemplo, por militares e pelo ministro do Desenvolvimento Regional, Rogério Marinho, que não estava com o presidente na saída do Alvorada.

No fim do dia, ao retornar para a residência oficial, Bolsonaro retomou o assunto e reforçou que a palavra sobre o tema será a do ministro da Economia. "Não existe esta história de [ala dos] militares, eu sou militar e desconheço entre os militares que estão comigo um profundo conhecedor de Economia, assim como o Paulo Guedes não conhece da vida militar."

Na ocasião, chamou atenção a ausência do ministro do Desenvolvimento Regional, agora desafeto de Guedes, e de militares que formam o núcleo de apoio direto ao presidente. Marinho teria insistido nos últimos dias no chamado Plano Pró-Brasil, lançado na semana passada sob a condução do ministro-chefe da Casa Civil, Walter Braga Netto, e sem a presença de Guedes, num esboço do que seria um pacote de obras de infraestrutura para garantir empregos e uma retomada para a economia após o término da pandemia do novo coronavírus. Guedes, por sua vez, preocupado com um possível exagero de gastos orçamentários envolvidos na empreitada, fez questão também de minimizar o plano, chamando-o de "estudos".

O Valor apurou, no entanto, que o movimento de Bolsonaro em direção a Guedes não significou necessariamente uma fritura de Marinho. Apesar do desentendimentos com o chefe da equipe econômica, Marinho é considerado pela cúpula do governo como um interlocutor importante com o Congresso.

Por outro lado, no gesto feito pela manhã Bolsonaro uniu os ministros que teriam maior capacidade de entregar ações positivas a curto prazo e auxiliar o governo a sair da nova crise, num verdadeiro "ato político", afirmou uma autoridade. A ofensiva do presidente também foi no sentido de buscar um clima de "calmaria" três dias depois da demissão de Moro ter criado um clima de grande tensão e incertezas quanto aos rumos do governo entre os ministros.

"O presidente disse o seguinte ontem: 'A economia é com o Paulo Guedes, como sempre foi, só que hoje a gente está com os nervos à flor da pele por causa de todo mundo em casa, tem muita especulação sobre tudo. Então, o ministro está lá no lugar que ele sempre esteve e é o comandante da economia", disse ontem a ministra Tereza Cristina, em entrevista ao Valor. "O que estamos fazendo é uma unificação dos ministros em torno do ministro Paulo Guedes", acrescentou.

Guedes agradeceu a confiança de Bolsonaro e disse que o governo continuará com a mesma política econômica, focada em "reformas estruturantes" e investimentos privados. "Queremos reafirmar a todos que acreditam na política econômica que ela segue, é a mesma. Vamos prosseguir com as nossas reformas estruturantes. Vamos trazer bilhões em investimentos em saneamento, em infraestrutura, em reforço para a safra", frisou o ministro da Economia.

Considerado por Bolsonaro como um conselheiro e consultor em tema econômicos, o presidente do Banco Central também escoltava Guedes. Campos Neto tem ajudado o ministro da Economia a mostrar o impacto no mercado dos movimentos recentes do governo em direção a um possível programa de investimentos públicos mais ambicioso. Na reunião, ele apresentou dados e fez um apanhado sobre o cenário econômico, com projeções.

Ao mesmo tempo, a ministra Tereza Cristina, novo alvo da ala ideológica do governo, também foi alvo de desagravo de Bolsonaro. Ao Valor, ela defendeu que o agronegócio brasileiro siga apoiando o presidente em meio a um cenário de crise política.

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Ministros militares descartam saída do governo

Fabio Murakawa 

28/04/2020

 

 

Mesmo contrariada com os processos que culminaram com as demissões dos ministros Sergio Moro (Justiça) e Luiz Henrique Mandetta (Saúde), a ala militar do governo segue fechada com o presidente Jair Bolsonaro. Um desembarque do governo, hipótese levantada em alguns meios de comunicação nos últimos dias, é algo que não está no horizonte neste momento para os ministros fardados.

Embora tenham tentado demover o presidente de entrar em colisão com Moro e Mandetta, os ministros Walter Souza Braga Netto (Casa Civil) e Luiz Eduardo Ramos (Secretaria de Governo) têm dito a interlocutores que se irritaram com as posturas dos ex-ministros no embate com Bolsonaro.

Os militares acusam Moro de ter dado um "golpe baixo" ao repassar ao "Jornal Nacional" "prints" com conversas por WhatsApp dele com Bolsonaro e com a deputada Carla Zambelli (PSL-SP), sua afilhada de casamento. Já Mandetta teria agido com ambições eleitorais e forçado a própria demissão ao conceder uma entrevista ao "Fantástico" em que critica posturas do presidente em meio à pandemia.

Isso não significa, entretanto, que os ministros de farda aprovem cegamente o comportamento do presidente. Segundo interlocutores, há críticas aos passeios de Bolsonaro por Brasília em meio à pandemia, à participação em um ato pró-ditadura em frente ao Quartel-General do Exército e à maneira agressiva com que ele travou seus embates com Moro e Mandetta.

Esses ministros militares darão demonstrações explícitas de apoio ao presidente nos próximos dias. O mesmo ocorrerá com ministros civis, que atuam sob coordenação de Braga Netto.

Ontem, Bolsonaro saiu à portaria do Palácio da Alvorada acompanhado de quatro auxiliares de peso para dar "boas notícias" sobre as perspectivas econômicas do país. Saíram com ele os ministros Paulo Guedes (Economia), Tereza Cristina (Agricultura) e Tarcísio de Freitas (Infraestrutura), além de Roberto Campos Neto, presidente do Banco Central.

O gesto foi um afago do presidente ao ministro da Economia, em meio a rumores de que ele poderia deixar o posto. Guedes estaria insatisfeito com a defesa feita por militares e o ministro do Desenvolvimento Regional, Rogério Marinho, de uma alta de gastos públicos na retomada econômica pós-covid-19. Mas serve também para demonstrar que há coesão no governo, apesar das importantes duas baixas no time de Bolsonaro. O foco do governo segue sendo o combate à pandemia.

Além disso, com o presidente fragilizado, e a palavra "impeachment" de volta ao vocabulário político, o Planalto segue negociando com o Centrão para romper o isolamento do governo, com Ramos no comando das conversas.

Os partidos não devem ganhar ministérios, ao menos em um primeiro momento. Mas estão sendo negociados cargos no segundo escalão, como os comandos do Banco do Nordeste, do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE), da Codevasf e da Fundação Nacional da Saúde (Funasa). Cargos nos Estados também entram na mesa de negociação.

A ideia de Ramos é não só distribuir cargos hoje ocupados por técnicos, mas também rediscutir posições que já são ocupadas por indicados de partidos desde os governos anteriores de Michel Temer (MDB) e Dilma Rousseff (PT).