O globo, n. 31691, 13/05/2020. País, p. 11

 

Em busca de apoio, governo promete verbas ao centrão

Natália Portinari

13/05/2020

 

 

Cada partido teve a oferta de um valor fixo e decidirá como será empregado; média de indicação individual foi de R$ 10 milhões 

JORGE WILLIAM/22-04-2020Distribuição. O ministro Luiz Eduardo Ramos definiu os valores das indicações de acordo com cada legenda aliada

O governo federal pediu a deputados aliados, de partidos do centrão, indicações de quais municípios deverão receber parte da verba emergencial do combate ao coronavírus do Ministério da Saúde. Deputados de diversas legendas ouvidos pelo GLOBO, que não quiseram se identificar, relatam ter indicado cidades para receber cerca de R$ 10 milhões. A informação foi confirmada por interlocutores próximos ao Palácio do Planalto.

Cada partido teve a oferta de um valor fixo pelo governo e decidiu como distribuir os montantes entre seus deputados. Entre os parlamentares ouvidos pelo GLOBO, a média de indicação individual foi de R$ 10 milhões, mas líderes tiveram direito a valores mais altos.

Segundo um vice-líder do governo na Câmara, o valor total, o valor determinado pelo ministro da Secretaria de Governo, Luiz Eduardo Ramos, varia entre partidos. Siglas que já foram atendidas de outras formas, com cargos, por exemplo, receberam um “desconto”.

Para calcular a verba, também foi levado em conta o número de deputados fiéis em cada legenda. Só terá direito à indicação quem se comprometer a votar com o governo.

A negociação promovida pelo Planalto envolveu siglas como PP, PL, PSD, Podemos, Republicanos, MDB e Patriota. A verba ainda não foi paga, mas alguns já enviaram indicações ao Palácio do Planalto há mais de duas semanas. A promessa do governo é de recompensar a lealdade da base fazendo transferências diretas ao caixa dos municípios dos aliados.

A negociação da verba não foi atrelada a nenhuma votação específica, mas serve para barrar o andamento de um possível processo de impeachment, segundo deputados. É preciso ter ao menos 172 votos para impedir o afastamento de um presidente no Congresso.

A verba que será utilizada para os pagamentos é do orçamento de custeio extra do Ministério da Saúde para o combate ao novo coronavírus no Brasil. Ao contrário do que ocorre com emendas parlamentares, a verba não seria associada aos nomes dos deputados nos portais de transparência. Trata-se de um apadrinhamento informal.

É a mesma forma de negociação utilizada pelo governo Bolsonaro no ano passado para a aprovação da reforma da Previdência. Mesmo deputados novatos, que não tinham direito a emendas, apadrinharam uma soma de ao menos R$ 1,2 bilhão, de acordo com um levantamento do GLOBO de fevereiro deste ano. O GLOBO procurou a Secretaria de Governo, mas o órgão não se pronunciou sobre a negociação até a publicação desta reportagem.

ACORDOS COM CENTRÃO

Para fortalecer sua base no Congresso, o Planalto mantém negociações com partidos do centrão para distribuição de cargos. O governo federal já destinou os comandos do Departamento Nacional de Obras contra as Secas (Dnocs) e da Secretaria Nacional de Mobilidade e Desenvolvimento Regional e Urbano do Ministério do Desenvolvimento Regional para o centrão.

Mais nomeações atenderão as demandas de PP, PL, Republicanos e PSD. Há expectativa de cargos nos ministérios da Saúde e da Educação, em bancos públicos e na Funasa.

Na semana passada, o PP, comandado pelo senador Ciro Nogueira, foi o primeiro a conquistar as redistribuições de cargos. Publicada no Diário Oficial da União de quarta, a nomeação de Fernando Leão para a diretoria-geral do Departamento Nacional de Obras Contra as Secas (Dnocs) atende à demanda de Ciro Nogueira e também do líder do PP na Câmara, Arthur Lira (AL).

Na última quinta-feira, o Diário Oficial da União trouxe a nomeação de Thiago Queiroz para o comando da Secretaria Nacional de Mobilidade e Desenvolvimento Regional e Urbano do Ministério do Desenvolvimento Regional. De acordo com líderes partidários, o novo secretário é indicação do partido Republicanos, presidido pelo deputado federal Marcos Pereira (SP). A informação foi confirmada com integrantes do governo.

As nomeações fazem parte de um acordo de Bolsonaro para formar uma base aliada para votações na Câmara dos Deputados e no Senado. Em resposta ao atraso nas nomeações, o governo tem repetido a parlamentares que a Agência Brasileira de Inteligência (Abin) está analisando as indicações.

Para impedir no Congresso afastamento de um presidente são necessários 172 votos

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Mourão defende acordo com partidos e distribuição de cargos

13/05/2020

 

 

Segundo vice-presidente, negociação com centrão é conduzida por Bolsonaro 

ROMERIO CUNHA/VPR/11-03-2020Cálculo. Para o vice Mourão, governo precisa do apoio de 300 deputados

O vice-presidente da República, Hamilton Mourão, defendeu ontem que o governo faça acordo com partidos do chamado centrão para formar uma base parlamentar no Congresso Nacional. Mourão disse que o presidente Jair Bolsonaro está negociando essa coalizão e que cargos e emendas fazem parte da negociação entre Executivo e Legislativo.

O presidente Jair Bolsonaro tem articulado uma aproximação com os partidos do chamado centrão, um bloco informal na Câmara dos Deputados que reúne parlamentares de legendas de centro e centro-direita. O grupo é menos conhecido por suas bandeiras partidárias e mais pela característica de se aliar a governos diferentes, independentemente da ideologia.

EMENDAS E CARGOS

De acordo com Hamilton Mourão, as negociações para a formação dessa aliança envolvem a distribuição de cargos e emendas e são conduzidas pelo próprio Bolsonaro e pelo ministro Luiz Eduardo Ramos, chefe da Secretaria de Governo da Presidência da República.

— Eu não posso te dizer os detalhes. Se é fisiológico ou programático. Nós temos que buscar a melhor coalizão, que é a programática. Lógico que, nisso aí, cargos e emendas fazem parte da negociação entre Executivo e Legislativo — afirmou. — Não adianta querer tapar o sol com a peneira. Acho que está mais ou menos sendo conduzido dessa forma — acrescentou Mourão ao ser questionado se o acordo estava sendo feito com base em uma agenda de propostas.

O vice-presidente contou que o presidente chegou à conclusão de que errou ao não tentar fazer um acordo com os partidos que formam o centrão no ano passado. Mas negou que Bolsonaro tenha decidido negociar com os líderes do grupo para se antecipar a um possível processo de impeachment.

— O que a turma está dizendo? “Agora, ele está fazendo isso para escapar do impeachment, é para escapar do processo”. Não.

Não é dessa forma que ele está vendo. Ele já chegou à conclusão de que ele tem que atrair esses partidos —disse Mourão.

O vice-presidente argumentou ainda que é impossível um partido só conseguir a maioria de votos no Congresso Nacional, que tem 24 legendas representadas.

Para Hamilton Mourão, o governo precisa do apoio de pelo menos 300 deputados para aprovar as matérias enviadas pelo Executivo, principalmente as reformas econômicas.

— Tem que ir em cada um desses partidos, principalmente aqueles de centro, independente da conotação pejorativa de centrão, e trazer para o campo da direita, de centro-direita. Uma coalização de centro-direita — explicou Mourão durante participação em uma transmissão ao vivo pela internet.