Valor econômico, v.20, n.4988, 27/04/2020. Política, p. A8

 

Saída de ministério divide manifestantes de direita

Andrea Torrente

Raphael Di Cunto

27/04/2020

 

 

A saída de Sergio Moro do governo provocou uma divisão nos grupos de direita. Militantes bolsonaristas chegaram a queimar camisetas com o rosto do ex-ministro da Justiça na noite de sábado, em Curitiba. A cena, transmitida ao vivo nas redes sociais, mostram sete mulheres que tacam fogo com um maçarico em camisetas do ex-ministro aos gritos de “queima no inferno” e xingamentos como “traidor”, “covarde” e “canalha”. “Lembrando Moro, você era empregado de Bolsonaro”, diz uma das militantes na gravação.

O vídeo, que na manhã de ontem acumulava mais de 500 mil visualizações, milhares de curtidas e comentários, foi gravado por militantes do ex-Acampamento Lava-Jato, movimento que acaba de mudar o nome para Acampamento com Bolsonaro, sinalizando o novo alinhamento. O grupo nasceu no auge da operação Lava-Jato e acampou durante meses na praça em frente ao prédio da Justiça Federal, em Curitiba, onde trabalhava o ex-juiz. O Valor não conseguiu contato com os representantes do movimento.

Outro grupo que também abandonou o ex-ministro é o Direita Paraná, que atribui a renúncia a uma questão de “vaidade”. “Foi infantilidade da parte de Moro largar o Brasil agora, acreditamos sim na acusação [de Bolsonaro] que a ideia era realmente ir para o STF. Praticamente largou o barco num momento crítico, de pandemia, e isso nos atrapalhou muito”, argumenta o presidente, Renato Gasparin Jr.

Nas eleições de 2018, Bolsonaro obteve 76,5% dos votos em Curitiba no segundo turno. A capital do Paraná teve a terceira maior votação a favor do atual presidente, atrás de Rio Branco (AC) e Boa Vista (RR). Já Moro foi considerado um herói da luta contra a corrupção e símbolo da República de Curitiba pelos grupos da direita.

Já o grupo Curitiba Contra Corrupção declarou sábado ter rompido com o presidente. “Infelizmente pessoas de mente fraca aderiram à ‘seita do santo mito’, ou seja, perderam o senso crítico e engolem tudo sem criticar já que o mito falou. E ainda agridem e ameaçam quem discorda”, explica Narli Resende, representante do grupo.

Em nota, o movimento elogia Moro por preferir “abrir mão de um alto cargo no governo a trair seus compromisso e suas promessas”. “O que aconteceu é que os que apoiam a Justiça e o combate à corrupção nunca tiveram políticos de estimação. Se errar tem que pagar. Esse sempre foi nosso pensamento”, afirma Narli.

Até a Associação Brasileira de Bares e Casas Noturnas de Curitiba (Abrabar) lançou a campanha #FechadocomMoro nas redes sociais em apoio ao ex-magistrado. “Estamos mobilizando as pessoas independentes da classe artística, atletas, juristas, profissionais liberais, autônomos, trabalhadores e empresários e todos da sociedade civil organizada a manifestar apoio ao cidadão Sergio Moro”, diz o presidente Fábio Aguayo.

Em Brasília, militantes do presidente fizeram uma carreata e ato de apoio na Esplanada dos Ministérios. O ato se concentrou em ataques ao Presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), e, principalmente, contra o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ). Houve placas pedindo o fechamento do Supremo Tribunal Federal (STF) e uma nova Constituição “anticomunista”.

Em um dos carros de som, um apoiador criticou Moro e disse que ele sempre esteve a serviço do PSDB, nunca investigou os tucanos e agora se “aliou ao Centrão para tirar Bolsonaro do Palácio” - ignorando que é o próprio Bolsonaro que está, há um mês, negociando com os caciques dos partidos do Centrão a nomeação de aliados políticos deles para cargos no governo em troca de apoio na Câmara dos Deputados.

O ato próximo ao Congresso reunia cerca de 100 pessoas, vestidas com o camisa da seleção brasileira de futebol ou camisetas amarelas e verdes. Já os carros tomavam as seis faixas entre a Catedral de Brasília e o Ministério das Relações Exteriores, um percurso de apenas um quilômetro, segundo o Google Maps.

* Para o Valor