Correio braziliense, n. 20819 , 23/05/2020. Brasil, p.10

 

Só estamos atrás de Trump

Bruna Lima

Maria Eduarda Cardim

23/05/2020

 

 

CORONAVÍRUS » Em 24 horas, país tem 20.803 registros da doença, somando mais de 330 mil infectados, abaixo apenas dos Estados Unidos. Número de mortes, que ontem chegou a 21.048 pessoas, mantém o Brasil na 6ª colocação, mas como epicentro da pandemia na América do Sul

Ao registrar mais 20.803 novos casos de covid-19, o recorde de aumento diário até o momento, o Brasil tornou-se o segundo país com mais casos do novo coronavírus no mundo. O país, que soma 330.890 pessoas infectadas, só fica atrás dos Estados Unidos, que confirmaram 1,59 milhão de casos, de acordo com o levantamento da Universidade Johns Hopkins. A Rússia caiu para terceiro no ranking, com 326,5 mil com o agente infeccioso. As projeções apontam que, até o fim do mês, o Brasil passe de meio milhão de confirmações.

Em coletiva da Organização Mundial de Saúde (OMS), o diretor do programa de emergências, Michael Ryan, afirmou ontem que a América do Sul se tornou o novo epicentro da covid-19 no mundo, tendência puxada pelo Brasil. "Vimos muitos países sul-americanos com aumento do número de casos e, claramente, há preocupação em muitos desses países, mas certamente o mais afetado é o Brasil neste momento", declarou.

Os números reais de infectados no país podem, inclusive, ser maiores do que os dos EUA. Isso porque a subnotificação brasileira é alta. Enquanto os dados oficiais dão conta de 330 mil casos da doença, pesquisadores Portal Covid-19 Brasil, iniciativa da Universidade de São Paulo (USP) e da Universidade de Brasília (UnB), calculam que o número varia entre 3,1 e 4,3 milhões. A estimativa chega a ser 13 vezes maior do que o divulgado. O Ministério da Saúde admite a defasagem de testagem e afirma que aumenta a capacidade dos laboratórios para diminuir essa diferença.

"A crescente de casos reflete o aumento da capacidade laboratorial do Brasil, por meio dos trabalhadores públicos com um quantitativo razoável de testes distribuídos. A parceria público-privada está sendo trabalhada para reforçar essa estratégia de testagem. Isso vai dar ao Brasil a capacidade para que consiga analisar um maior número de casos e, com isso, reduzir sua subnotificação para que nós tenhamos uma dimensão epidemiológica mais real", disse o diretor do Departamento de Análise em Saúde e Vigilância em Doenças Não Transmissíveis do Ministério, Eduardo Macário, na última coletiva da pasta.

 Metodologia
Por meio de cálculo de modelo matemático exponencial para os 10 dias seguintes, o Portal Covid-19 Brasil calcula, ainda, que até 31 de maio haverá 545 mil confirmações de casos no país. Pela mesma metodologia, o grupo concluiu que as mortes devem saltar de 21 mil mortes para mais de 33 mil até a virada do mês.

O novo balanço do Ministério da Saúde também confirmou mais 1.001 óbitos pela doença. Ao todo, 21.048 pessoas morreram em decorrência da covid-19. Na última terça-feira, o Brasil confirmou, pela primeira vez, um acumulado de vítimas fatais em 24 horas que superou a barreira do milhar. Desde então, o país voltou a confirmar mais de mil mortes diárias.

No ranking internacional, o Brasil continua sendo o sexto país com mais óbitos do mundo, ficando atrás, respectivamente, dos EUA, do Reino Unido, da Itália, da França e da Espanha.

São Paulo, epicentro da doença no Brasil, tem 5.773 mortes, um aumento de 215 episódios em 24 horas. Além do estado, outras unidades da Federação preocupam com os altos números de fatalidades.

O Rio de Janeiro, por exemplo, voltou a ser o estado com maior registro diário de óbitos, acrescentando mais 245 fatalidades. Com isso, ultrapassou as atualizações de São Paulo pela terceira vez desde o início da pandemia e, à beira do colapso no sistema público de saúde, acumula 3.657 mortes.

Ceará (2.251), Pernambuco (2.057), Pará (1.937) e Amazonas (1.669) também já registram mais de mil mortes cada. Juntos com São Paulo, esses estados somam 17.344, ou seja, 82,4% de todos os óbitos. Todos os 26 estados do Brasil, mais o Distrito Federal, registraram casos e mortes.

O Ministério da Saúde divulgou ainda o número de pacientes recuperados da covid-19. Foram registrados 135.430 dos 330.890 pacientes diagnosticados com o novo coronavírus –– representam 40,9% das pessoas que tiveram a doença. Já os brasileiros que não resistiram representa 6,4% desse total. Outras 174.412 pessoas continuam em acompanhamento.

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Ministério da Saúde virou um quartel

Bruna Lima

23/05/2020

 

 

A movimentação no Ministério da Saúde desde a indicação do general Eduardo Pazuello como número dois da pasta é de entra e sai de militares nos corredores. Mesmo que desobrigados de usar fardas, bater continência virou gesto corriqueiro no bloco G da Esplanada. São mais de 20 egressos das Forças Armadas integrando funções de comando, logística e estratégia, e quase nenhum com atuação anterior na área-fim da pasta.

O próprio Pazuello, que deve ficar "por um bom tempo" como ministro, como avisou o presidente Jair Bolsonaro, não tem expertise em relação ao Sistema Único de Saúde. General da ativa, comandava a tropa com 5 mil homens na 12ª Região Militar, em Manaus, até ser convocado para o que chama de "nova missão". Pelos colegas de farda, é visto como uma pessoa de perfil "progressista" e que promete trazer a disciplina e expertise típica da área para uma boa atuação em um "verdadeiro campo de batalha".

Durante a reunião com o Conselho Nacional de Secretários de Saúde (Conass) e o Conselho Nacional de Secretarias Municipais de Saúde (Conasems), na última quinta-feira, o ministro interino fez questão de explicar a preferência pelas altas patentes na linha de frente da pasta. Segundo Pazuello, a equipe da Saúde conta com um "apoio temporário" do Ministério da Defesa.

"(O Ministério da Saúde) tem uma equipe, para deixar claro, que tem o apoio do Ministério da Defesa, um apoio temporário, que, em princípio, serão só 90 dias. São militares da ativa, são pessoas preparadas para lidar com esse tipo de crise. Neste momento, precisamos desse tipo de preparo para somar às especialidades médicas", disse Pazuello, que também se considera temporário no cargo.

Pela Defesa, foram cedidos 17 nomes à Saúde, conforme publicação no Diário Oficial da União de 4 de maio. No entanto, até o momento, 11 foram nomeados. A movimentação é interpretada pelo corpo técnico da Saúde como um atrelamento das decisões ao que pensa Bolsonaro, prevalecendo as conveniências políticas sobre as determinações técnicas.

Determinação
O presidente não escondeu a intenção em indicar nomes para a Saúde, começando por escalar o almirante Flávio Rocha, chefe da Secretaria de Assuntos Estratégicos (SAE), para auxiliar na transição do ex-ministro Nelson Teich para a gestão de Pazuello. Aliás, foi por causa da pressão de Bolsonaro para a regulamentação do uso da cloroquina em pacientes com covid-19, mesmo sem comprovação de eficácia no tratamento, que o general chegou ao posto. Ontem, um dos poucos nomes indicados por Teich para assumir uma secretaria também se desligou: o médico Antonio Carlos Campos de Carvalho foi exonerado após não concordar em assinar a normativa sobre a substância que o presidente enxerga como solução para a pandemia.

Poucos são aqueles que, no Ministério da Saúde, têm alguma familiaridade com o tema. Uma é a diretora de Programa da secretaria de Atenção Primária, a médica (e militar) Laura Triba Appi — que, de início, foi nomeada para o cargo de assessora. Outro é o capitão Mario Luiz Ricette Costa, que assume como assessor técnico da Subsecretaria de Planejamento e Orçamento, atuava na Diretoria de Saúde do Ministério da Defesa. Já o secretário-executivo interino, coronel do Exército Antônio Élcio Franco Filho, chegou a ocupar o cargo de secretário de Saúde de Roraima no primeiro semestre do ano passado.

Militares acantonados

Eduardo Pazuello
ministro interino
Antônio Élcio Franco Filho
secretário-executivo interino
Reginaldo Machado Ramos
diretor de Gestão Interfederativa e Participativa
Jorge Luiz Kormann
diretor de Programa
Marcelo Blanco Duarte
assessor no Departamento de Logística
Paulo Guilherme Ribeiro Fernandes
coordenador-geral de Planejamento
Alexandre Magno Asteggiano
assessor
Luiz Otávio Franco Duarte
assessor especial do ministro
André Cabral Botelho
coordenador de contabilidade
Giovani Cruz Camarão
coordenador de Finanças do
Fundo Nacional de Saúde (FNS)
Vagner Luiz da Silva Rangel
coordenador de execução orçamentária
Ramon da Silva Oliveira
coordenador geral de Inovação de
Processos e de Estruturas Organizacionais
Marcelo Sampaio Pereira
diretor de programa da Secretaria
de Atenção Especializada à Saúde
Angelo Martins Denicoli
diretor do Departamento de Monitoramento
e Avaliação do SUS
Mario Luiz Ricette Costa
assessor técnico da Subsecretaria
de Planejamento e Orçamento
Alexandre Martinelli Cerqueira
Subsecretário de Assuntos Administrativos
Laura Triba Appi
diretora de Programa da Secretaria
de Atenção Primária
Celso Coelho Fernandes Júnior
coordenador-Geral de Acompanhamento
e Execução de Contratos Administrativos
Paulo César Ferreira Júnior
diretor de Programa da Secretaria-Executiva