Correio braziliense, n. 20820 , 24/05/2020. Cidades, p.22

 

Mais um hospital de campanha

Alexandre de Paula

Mariana Machado

Roberta Pinheiro

24/05/2020

 

 

Governo aposta na ampliação da rede para suprir demanda de leitos durante na pandemia. Quatro estruturas serão montadas no DF

No detalhe

Mané Garrincha

Número de leitos: 197

Investimento: R$ 79 milhões

Ceilândia

Número de leitos: 60

Investimento: R$ 15,5 milhões

Papuda

Número de leitos: 40

Investimento: R$ 5,1 milhões

JBS (sem local definido)

Número de leitos: 80

Investimento: R$ 11 milhões

Com mais cinco mortes por coronavírus e 301 novos casos registrados no Distrito Federal, nas últimas 24 horas, a falta de leitos na rede pública de saúde é, dia após dia, um dos principais agravantes da crise. Para impedir o colapso no sistema do Distrito Federal, o Executivo local aposta na implementação de hospitais de campanha, capazes, na visão do governo, de ampliar o suporte para doentes e criar uma estrutura suficiente para atender aos pacientes da capital federal. Até agora, foram anunciadas três unidades do tipo com recursos do GDF, além de outra que deve ser construída com apoio da empresa JBS.

O primeiro hospital está concluído. A estrutura foi montada no Estádio Nacional Mané Garrincha. Ao todo, são 197 leitos voltados para o combate da covid-19 — 173 de enfermaria sem suporte de oxigenoterapia, 20 de suporte avançado e quatro de emergência. Segundo a Secretaria de Saúde, a nova estrutura é referenciada pelo Hospital Regional da Asa Norte (Hran) e, portanto, obedece ao fluxo dessa unidade. Na sexta-feira, o primeiro doente foi transferido para o local. “Os pacientes que necessitam de enfermaria de retaguarda serão transferidos de acordo com demanda estabelecida pela direção do Hran”, informou a pasta.

O custo da diária por leito na unidade é de R$ 2.240,55. O contrato para o período de seis meses, com o fornecimento de equipamentos, insumos e mão de obra ficou em R$ 79 milhões. Operação do Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT) e da Polícia Civil investiga o uso dos recursos (leia Sob investigação). Passada a pandemia e finalizado o contrato, todos os bens e equipamentos disponíveis no hospital montado no Estádio Nacional Mané Garrincha passarão a fazer parte do patrimônio da Secretaria de Saúde e poderão ser transferidos para outras unidades.

Outro hospital de campanha está em construção em Ceilândia. A região administrativa passou a figurar, nos últimos dias, entre as cidades do DF com maior número de casos. A unidade será instalada na QNN 27, no terreno ao lado da Unidade de Pronto Atendimento (UPA) e terá 2 mil m² construídos além da urbanização da área ao redor. A previsão é de que a obra esteja concluída em 60 dias e disponha, quando inaugurada, de 60 leitos (40 de enfermaria e 20 de UTI). O custo total é estimado em R$ 15,5 milhões. Após a pandemia, toda a estrutura será convertida em um hospital materno-infantil.

Uma doação da JBS também possibilitará mais leitos para o Distrito Federal. O frigorífico repassará R$ 11 milhões para que o Executivo local invista no combate à covid-19. Serão disponibilizados 80 leitos de três níveis, comportando unidade de terapia intensiva (UTI), semi-intensiva e acomodação de apartamentos. Não está definido se o espaço será inteiramente construído do zero ou aproveitará a estrutura de outra unidade. O prazo estimado de construção é de 45 a 60 dias.

Papuda

O Complexo Penitenciário da Papuda foi outro local escolhido pelo Executivo para receber um hospital de campanha. Contudo, ontem, durante visita às obras, o governador Ibaneis Rocha afirmou que a implementação terá caráter definitivo. O número alto de casos da covid-19 no sistema prisional é uma preocupação constante, e a construção da unidade é vista como uma estratégia para tentar conter os danos da disseminação da doença entre os detentos.

O hospital terá 40 leitos — 30 de retaguarda e 10 com suporte respiratório — e a estimativa é de que seja liberado na próxima quinta-feira. O subsecretário de Infraestrutura em Saúde, Isaque Albuquerque, que acompanhou o governador na visita, detalhou os desafios encontrados ao construir uma unidade de saúde dentro do sistema carcerário. “Primeiro, é o prazo em face do cenário da pandemia dentro do complexo prisional que nos exigiu uma solução em um prazo muito curto. Segundo, é o cuidado com materiais, com fluxos que não são exclusivamente da assistência clínica ao paciente, mas que precisam ser compatibilizados com a equipe de segurança para evitar fugas e rebeliões. Então, o ambiente precisa estar preparado para uma assistência clínica ao doente e, ao mesmo tempo, reproduzir aspectos de segurança de uma unidade prisional”.

Ontem, durante visita às obras, o governador anunciou que quer uma unidade semelhante no complexo penitenciário feminino. “Vamos trazer dignidade, porque, uma hora, esse pessoal vai sair e eles têm que sair melhor do que entraram”, pontuou. Apesar do anúncio, o chefe do Executivo local não deu detalhes sobre o projeto.

Letalidade

A falta de leitos de unidades de terapia intensiva (UTIs) está diretamente ligada à letalidade dos casos, como afirma o infectologista e diretor científico da Sociedade de Infectologia do Distrito Federal, José Davi Urbaez. Ele explica que a implantação de hospitais de campanha é um dos degraus em todo plano de contingência. “Em uma epidemia, cada vez mais há a necessidade de leitos. Imagina quanto tempo demoraria para se construir um hospital. Esse recurso é muito inteligente porque você monta rápido e, passado o caos, também desmonta com facilidade.”

Entre os itens necessários em todas as unidades do tipo, são imprescindíveis os respiradores, suporte de enfermagem, e rede de apoio. “São, basicamente, os mesmos predicados de um hospital convencional. A diferença é que não tem estrutura física, pode ser desmontado.” A seleção de pacientes, no entanto, vai depender do planejamento feito pelos gestores. “Pode ter desde leitos de suporte avançado, com serviço de bomba de infusão, até hemodiálise, ou hospitais de campanha de média complexidade”, pondera. “Tudo depende dos gargalos identificados.