O Estado de São Paulo, n.46209, 23/04/2020. Política, p.A7

 

‘Desigualdade fragiliza o País’, dizem economistas

Bianca Gomes

Paula Reverbel

23/04/2020

 

 

Em debate na Brazil Conference, Persio Arida e Eduardo Giannetti criticam atuação de Bolsonaro na pandemia

A grande população vulnerável do Brasil coloca o País em uma situação econômica muito frágil diante da pandemia do novo coronavírus, de acordo com o ex-presidente do Banco Central Persio Arida e o economista Eduardo Giannetti. Em debate virtual no painel de abertura da 6.ª edição da Brazil Conference at Harvard & MIT, ontem, ambos criticaram a atuação do presidente Jair Bolsonaro na crise.

O encontro, que neste ano tem parceria do Estado, é organizado pela comunidade brasileira de estudantes em Boston, nos Estados Unidos, para promover o debate entre líderes do País. Esta edição será toda realizada por meio de videoconferência por causa da pandemia. O Estado fará a cobertura exclusiva em suas plataformas.

O debate entre os dois economistas tratou da situação econômica do Brasil diante da crise mundial desencadeada pela covid-19. “A obscena desigualdade social fragiliza o Brasil em uma situação como essa”, defendeu Giannetti. Para ele, o contexto de 40 milhões ou mais de brasileiros sem situação regular de emprego dificulta o acesso às políticas de suporte social. “O governo muitas vezes não tem nem como chegar a essas pessoas, pois elas não têm uma existência na vida civil. É um complicador no momento em que precisamos transferir recursos para grupos sociais vulneráveis.”

Persio afirma que temos hoje um Estado “gigante” e “disfuncional” que promove desigualdades. “Como ele faz isso? Nas diferenciações de regimes tributários, pelos elevadíssimos salários do setor público.” Para ele, o governo Bolsonaro não tomou medidas essenciais para reduzir a desigualdade antes da crise. Reforma tributária, reforma administrativa e abertura comercial foram pontos críticos que, segundo Arida, devem ser feitos no País para mudar esse cenário.

A atuação do executivo federal também é uma fragilidade, afirma Giannetti. “Temos um governo disfuncional. Um presidente que manda sinais completamente contrários ao que é o comportamento correto e que está em conflito aberto com outras instâncias da república”, afirma o economista. Ele criticou ainda o esvaziamento do ministério da Saúde, após demissão do ministro Luiz Henrique Mandetta. Isso, segundo ele, tornou a pasta “completamente inoperante e sem conhecimento do que fazer”.

Persio disse que o atual governo tem sido “uma tragédia na área da educação” e toma medidas que prejudicam a produtividade do País, dois aspectos indispensáveis para o crescimento. Ele criticou o governo por ainda não ter enviado ao Congresso as propostas de reforma Administrativa e Tributária.

Dívida. A sustentabilidade da dívida pública brasileira deve ser um tema que virá com força após a pandemia do novo coronavírus, avalia Giannetti. Segundo ele, o Brasil estava começando a ter mais estabilidade, após a reforma da Previdência e de um esforço para conter o gasto público que começou no governo de Michel Temer.

“Infelizmente, dado o imperativo de gasto público e a queda de arrecadação, ambos produzidos pela pandemia, vamos ter, novamente um saldo grande de endividamento público”, disse. “A preocupação e apreensão não devem ficar apenas para o futuro, mas desde já, na percepção de que essa dívida pode não ser sustentável.”