O Estado de São Paulo, n.46210, 24/04/2020. Política, p.A6

 

Diretor da Abin é cotado para chefiar PF

Fausto Macedo

Andreza Matais

24/04/2020

 

 

Valeixo estava com o cargo ameaçado desde o início do ano; ex-procurador da Lava Jato e entidades de policiais federais reagem à troca

Aparição. Jair Bolsonaro, na porta do Palácio do Alvorada

Antes de confirmada a saída de Maurício Valeixo do comando da Polícia Federal (PF), já havia especulações sobre o seu substituto. Um dos mais cotados é o atual diretor da Agência Brasileira de Inteligência (Abin), Alexandre Ramagem. Tradicionalmente, a escolha é feita pelo ministro da Justiça.

Interlocutores de Valeixo dizem que a tentativa de substituí-lo ocorre desde o início do ano. Essa troca não tem a ver com a briga pelo comando da PF ocorrida ano passado entre o presidente o ministro da Justiça Sérgio Moro. Em agosto, Bolsonaro tentou antecipar a saída do superintendente da corporação no Rio de Janeiro. Mas acabou recuando diante da repercussão negativa.

Valeixo se reuniu ontem com os 27 superintendentes regionais nos Estados e delegados federais que ocupam diretorias estratégicas por videoconferência. O diretor-geral descartou com veemência que sua saída seja movida por pressões políticas e afastou rumores de que sua disposição em dar adeus à cadeira estaria relacionada à uma reação de aliados de Bolsonaro por causa de investigações que incomodam o Planalto.

Repercussão. Ex-integrante da força-tarefa da Operação Lava Jato em Curitiba, Carlos Fernando dos Santos Lima atacou o presidente Bolsonaro ontem após a divulgação da notícia de que o ministro poderia deixar o governo. Santos Lima, que trabalhou com Moro também no Caso Banestado, afirmou que Bolsonaro nunca foi “real apoiador do combate à corrupção”. “Moro deve sair. Bolsonaro não é correto, não tem palavra, deixou o ministro sem qualquer apoio no Congresso tanto nas medidas contra a corrupção quanto durante o episódio criminoso da Intercept”, escreveu o procurador aposentado.

Associações que representam policiais federais também reagiram à troca que Bolsonaro pretende fazer na diretoria-geral. “Toda hora, se há uma especulação sobre troca na Polícia Federal, há esse problema todo”, afirmou Evandir Felix Paiva, presidente da Associação Nacional dos Delegados de Polícia Federal. “Infelizmente, nós vamos viver assim enquanto não aprovar o mandato (para o

chefe da PF)”, concluiu. Segundo Paiva, esse tipo de problema seria menor se o Congresso tivesse aprovado projetos sobre autonomia da PF. Em nota, a Federação Nacional dos Delegados de Polícia Federal (Fenadepol) lembra que Valeixo é o terceiro diretor-geral da PF nos últimos três anos. “A cada troca ou menção à substituição, uma crise institucional se instala”, diz o texto, citando reflexos no combate à corrupção.

O presidente da Associação Nacional dos Peritos Criminais Federais (APCF), Marcos Camargo, disse ontem que o presidente não pode ter “carta branca para destituir, sem critérios claros, os ocupantes das funções”.

Crítica

“Moro deve sair. Bolsonaro não é correto, não tem palavra, deixou o ministro sem apoio no Congresso e nunca foi real apoiador do combate à corrupção.”

Carlos Fernando dos Santos

EX-INTEGRANTE DA FORÇA-TAREFA DA LAVA JATO NO PARANÁ