Valor econômico, v.21, n.5016, 05/06/2020. Legislação & Tributos, p. E1

 

Verba da educação não pode ser penhorada por dívidas

Beatriz Olivon

05/06/2020

 

 

O Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu ontem que recursos federais destinados à educação no Estado do Amapá não podem ser penhorados para pagar dívidas trabalhistas das Caixas Escolares - que recebem essas verbas federais e repassam às escolas. No mesmo julgamento, a Corte definiu que as Caixas não podem pagar suas dívidas por meio de precatórios.

As Caixas Escolares são uma espécie de entidade criadas para receber as verbas do governo federal, por meio do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE), destinadas a cobrir os gastos com merenda, transporte de alunos e manutenção das escolas públicas estaduais. Elas existem para dar maior autonomia à aplicação dos recursos destinados às escolas. São unidades executoras, assim como conselhos escolares e associações de pais e mestres e como tais, são consideradas sociedades civis com personalidade jurídica de direito privado sem fins lucrativos.

Elas se tornaram o ponto central de ação proposta no STF pelo governo do Estado do Amapá para questionar decisões da Justiça trabalhista da 8ª Região e da 1ª Região e ainda do Tribunal de Justiça do Estado que determinaram a penhora e bloqueio do repasse de recursos das Caixas Escolares para pagar dívidas trabalhistas dessas Caixas (ADPF 484).

"São verbas federais destinadas a aplicação exclusiva na educação", afirmou na defesa oral o procurador do Estado do Amapá, Davi Machado. Na defesa, ele destacou que o artigo 833 do Código de Processo Civil (CPCP) determina que são impenhoráveis recursos públicos recebidos por instituições privadas para a aplicação compulsória em educação.

Em 2017, o relator da ação, ministro Luiz Fux já havia concedido liminar para suspender os bloqueios. Fux determinou ainda a devolução dos valores eventualmente já sequestrados às contas do Estado. Na sessão de hoje, reafirmou essa posição.

Os recursos recebidos pelas Caixas são carimbados para a educação, segundo o ministro. No voto, Fux destaca que o artigo 167, VI da Constituição proíbe a transferência de recursos de uma categoria de programação para outra ou de um órgão para outro sem prévia determinação legislativa.

A especificidade do caso se refere aos prejuízos ao princípio do fomento da educação, segundo o ministro. "O direito social à educação bem como a prioridade absoluta da proteção às crianças e adolescentes justificam a especial proteção constitucional dos valores", afirmou.

Já o pedido para pagamento por meio de precatórios foi negado pelo relator. O ministro Fux considerou que embora as Caixas sejam voltadas à prestação de serviço de educação e recebam recursos públicos não se pode dizer que são totalmente dependentes de recursos públicos e atuam nisso com exclusividade. Além das verbas públicas elas também têm rendas decorrentes de doações particulares.

"Não desconheço que a jurisprudência estenda o precatório às estatais, mas esse entendimento não se aplica às Caixas Escolares", afirmou. Para Fux, seria como estender o precatório a concessionárias ou Ongs.

Já o ministro Alexandre de Moraes afirmou que nem o Poder Executivo pode manejar verbas públicas a seu livre arbítrio e que parece extremamente temerário que o Poder Judiciário o faça. Para o ministro Luís Roberto Barroso, o erro está na Caixa Escolar contratar empregados. Além de Moraes e Barroso, o voto do relator também foi acompanhado pelos ministros Edson Fachin, Rosa Weber, Cármen Lúcia, Ricardo Lewandowski, Gilmar Mendes e Celso de Mello.

O ministro Marco Aurélio Mello foi contrário à posição dos demais. O ministro Dias Toffoli não participou da sessão.