O globo, n. 31687, 09/05/2020. Especial Coronavírus, p. 13

 

Liderança na pandemia

Camila Zarur

09/05/2020

 

 

De 12 dirigentes, oito viram sua popularidade crescer neste ano

O enfrentamento da pandemia do novo coronavírus repercutiu na avaliação de alguns dos principais líderes mundiais. Entre 12 chefes de Estado e de governo cujos índices de popularidades entre janeiro e maio foram analisados pelo GLOBO, oito tiveram crescimento em sua aprovação popular. Para seis deles, a alta passou dos 10 pontos percentuais, caso da chanceler alemã, Angela Merkel (14 pontos), dos primeiros-ministros britânico, Boris Johnson (24), italiano, Giuseppe Conte (20), e canadense, Justin Trudeau (15), e dos presidentes argentino, Alberto Fernández (17), e chileno, Sebastián Piñera (14). O premier indiano, Narendra Modi, e o presidente francês, Emmanuel Macron, tiveram aumentos menores, respectivamentedeseis e cinco pontos percentuais. Doisdoslíderes—opremier japonês, Shinzo Abe, e o presidente mexicano, Andrés Manuel López Obrador — tiveram pequena queda de popularidade.E dois—o americano Donald Trump e Jair Bolsonaro —ficaram estagnados, embora o Datafolha tenha registrado queda da aprovação do brasileiro quando a pergunta é específica sobre sua atuação na crise do coronavírus. Por causa das diferentes metodologias das pesquisas, o levantamento não permite uma comparação exata da popularidade dos líderes, mas mostra como os cidadãos de seus países os avaliam neste ano marcado pela pandemia. O aumento da aprovação da maioria deles reproduz um fenômeno já visto em períodos de guerra e grandes crises, o de "união em torno da bandeira", afirma Carlos Gustavo Poggio, professor de Relações Internacionais da FAAP. — Nos EUA, vimos isso acontecer no governo de John Kennedy,duran te acrise dos mísseis em Cuba, node GeorgeBushp ai, na Guerra do Golfo, enodeBushf ilho, depois do 11 de Setembro — lembra Poggio. — Pandemias, como guerras, são eventos que causam traumas na sociedade. Há muita insegurança e a população tende abuscar respostas nos seus líderes. As variações de popularidade dependem de se a população considera a resposta adequada ou não. Boris Johnson foi quem teve o aumento mais expressivo, indo de 42% a 66% de aprovação entre janeiro e abril, segundo aYouGov.Osn úmeros refletem a mudança da posição dele em relação à Covid-19: depois de relutar em impor a quarentena, o britânicoreviu sua posição e angariou solidariedade ao ser infectado e internado em uma UTI.

Líderes que enfrentavam protestos sociais antes da pandemia recuperaram parcialmente a popularidade, como Macron e Piñera. O chileno, que tinha 11% de aprovação em janeiro, subiu para 25% no fim de abril, segundo o instituto Cadem. Já a aprovação do francês passou de 35% para 46%, caindo para 40% em maio, segundo sondagem Ifop-Fiducial.

— Eles acabaram recompensados por uma certa percepção de seriedade ao lidar comac ris e—ponderaPog gio. O recuo de Macro nem maio segue tendência também vista nos períodos anteriores de grandes crises: à medida que a situação se atenua, as reivindicações anteriores voltam. — Com o tempo, a população começa a julgar o líder não só por um assunto único, mas por outras questões. A união em torno da bandeira não é um efeito duradouro — explica o professor.

Dos líderes analisados, Bolso naroéo único a adota rum discurso negacionista diante da pandemia, enquanto Trump mantém uma conduta errática, ora falando dos riscos à saúde, ora insistindo na volta das atividades econômicas. Aposição do brasileiros e refleti una quedada avaliação de sua atuação na pandemia, de acordo com o Datafolha. Em março, 35% consideravam esse desempenho ótimo ou bom, índice que caiu para 27% no fim de abril, com as respostas ruim ou péssimo passando de 33% para 45%. Apesar disso, a avaliação geraldo governoBolso na rose manteve, com o percentual de ótimo e bom passando de 30% em dezembro para 33% no fim abril, enquanto os que classificamo governo como ruim ou péssimo passaram de 36% para 38%.

 ELEIÇÃO AMERICANA

O mexicano López Obrador também menosprezou o impacto da pandemia. Sua aprovação alta em janeiro, de 71%, segundo pesquisa do El Financiero, caiu para 60% no início de março. Depois que ele orientou a população a ficar em casa, o índice voltou a subir, para 68%. Já o japonês Abe, criticado pela demora em recomendar medidas de isolamento social, viu sua aprovação passar de 34% no início do ano, segundo pesquisa Morning Consult, para 30% em março e 31% em maio. Trump, por sua vez, hoje lidera o país com mais casos (1,3 milhão) e mortes (quase 78 mil) provocadas pelo novo coronavírus. Ele manteve o apoio de sua base fiel, mas, no ano em que disputa a reeleição, sua aprovação não avançou. De acordo com pesquisa da Universidade Monmouth, o americano tem em maio os mesmos 43% que tinha em janeiro. —Oca sodo T rum pé específico. Nos quatro anos de mandato, sua aprovação não cai abaixo dos 40%, mas não sobe aci made 49%. É oprime iro presidente americano anão ultrapassar abarreirados 50% —pontua Poggio.

De acordo com o professor, o fenômeno é característico de países co malta polarização política. O fato de Trump não ter conseguido aumentar sua aprovação pode ter, no entanto, impacto na eleição. —Se ele chegara novembro com 42% de aprovação, vai ser muito diferente de se chegar com 48% —diz Poggio. Na média das pesquisas recentes do site Real Clear Politics, o democrata Joe Biden lidera as intenções de votos por margem pequena, de 46% a 42%. Biden, porém, tem pouca visibilidade por causa da pandemia e enfrenta há duas semanas uma acusação de agressão sexual feita por uma ex-assessora, que ele nega.

Há muita insegurança e a população tende a buscar respostas nos seus líderes