O globo, n. 31679, 01/05/2020. Opinião, p. 2

 

Epidemia aponta para o Planalto

01/05/2020

 

 

Em um momento de grande hiperatividade, no qual se choca como Supremo depois de haver empurrado para fora do governo o ministro da Justiça e Segurança Pública Sergio Moro, o presidente Bolsonaro reativa o seu front de combate com os governadores. Já não considerasse haver motivos político-eleitorais para colocar em seu estande de tiros João Doria, de São Paulo, eWilson Witzel, do Rio de Janeiro, por vê-los como ameaça ao seu projeto de reeleição em 2022, Bolsonaro tem nos dois, e não só neles, opositores ao seu descaso como isolamento social, a mais eficaz ação para conter o alastramento da epidemia de coronavírus, na falta de vacina e medicamentos seguros contra o Sars-CoV-2.

Na terça, Bolsonaro deu de ombros quando lhe foi perguntado sob reamar cade 5 mil mortos atingida pela epidemia no Brasil —“e daí ?”— e, na quarta, também na saída do Alvorada, o presidente voltou a criticar governadores e prefeitos que tomam medidas para evitara disseminação do vírus, como fechamento departe do comércio e outras ações que lev emas pessoas aficar em casa.

Contra todas as evidências técnicas apresentadas a partir de experiências práticas nesta pandemia, em diversos países, Bolsonaro é contrário ao chamado “isolamento horizontal” —para todos, por um determinado período, excetuados trabalhadores em áreas essenciais, e não apenas os grupos de risco —, porque teme o efeito desta quarentena ampla na economia e, por tabela, no seu projeto de poder. Não importam as mortes —“e daí?”. O presidente não entende que permitir o trânsito livre do vírus significa não dar tempo aos sistemas de saúde de se prepararem minimamente para suportar o choque da multiplicação de infectados, quando a tragédia teria um impacto na economia muito maior.

O Supremo, em boa hora, ao julgar questionamento do PDT, esclareceu que governadores e prefeitos também podem criar e suspender estas normas. Impedido de acabar com isolamentos por decreto, o presidente passou a responsabilizar estados e municípios pela recessão que se instala. E ao comentar o fato de o Brasil chegar aos 5 mil mortos de Covid-19, ultrapassando a China, onde teve início a pandemia, disse que a cobrança deve ser feita a governadores e prefeitos, citando Do ria e Bruno Covas, governador e prefeito de São Paulo. Foi sua discordância do isolamento social que o fez demitir o ministro da Saúde Luiz Henrique Mandetta, defensor da medida ao lado da OMS e dos especialista sem geral. O substituto de Mandetta, Nelson Teich, defendeu o isolamento em artigos, assumiu e se tornou vago e nada afirmativo ao abordar o assunto. Ontem, disse que a hora não é de relaxamento. Foi um avanço.

O presidente tem responsabilidade pelas mortes, porque passou a defender o oposto do que pregava o seu governo, e assim criou ruídos na comunicação com a sociedade. E o bolsonarismo foi para as ruas em campanha contra o isolamento, o que não aconteceria sem a pregação de Bolsonaro.