Valor econômico, v.21, n.5019, 11/06/2020. Política, p. A10

 

Após acusações de perseguição, Witzel busca diálogo com Bolsonaro

Cristian Klein

11/06/2020

 

 

Antes oposicionista contumaz de Jair Bolsonaro, o governador do Rio Wilson Witzel (PSC) deu uma inflexão na relação com o presidente da República, depois das duas operações da Polícia Federal que miraram seus endereços, o de aliados e o de empresários que prestam serviços ao Estado, suspeitos de corrupção. Em entrevista ontem a uma rádio, Witzel não só evitou bater de frente com Bolsonaro como acenou para o diálogo com o presidente. Preferiu afirmar que "vivemos um momento de politização das instituições, especialmente o Ministério Público e o Poder Judiciário".

Witzel disse "ter diferenças com Bolsonaro", mas alegou que em "todas as vezes" que fez críticas ao presidente foi no sentido de ajudar a melhorar o desenvolvimento econômico do Estado e a cumprir promessas de campanha como o combate ao tráfico de armas e de drogas, área em que, na sua avaliação, a PF "passou a ter uma atuação muito mais política do que operacional".

O governador defendeu a aproximação com Bolsonaro. "Espero, como tenho dito, que o presidente possa retomar um diálogo comigo, porque isso é bom para o Rio de Janeiro, para o Brasil. E que nós possamos conversar, que possamos dialogar", afirmou Witzel à BandNews.

Há 15 dias, quando o governador foi alvo da operação Placebo, autorizada pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ), o tom foi outro. Em nota, Witzel culpou Bolsonaro por perseguição política e afirmou que "a interferência [na PF] anunciada pelo presidente da República está devidamente oficializada".

Agora, o governador chegou a se posicionar ao lado de Bolsonaro, quando questionado sobre a suposta escassez de operações da polícia fluminense em áreas controladas por milicianos. "Não adianta ficar querendo colar na minha imagem que eu não investigo milícia, que sou um governo de miliciano. É a mesma situação que eles ficam tentando colar na imagem do presidente", disse.

A oposição ferrenha de Witzel também deu lugar à bandeira branca nas redes sociais, onde as críticas a Bolsonaro desapareceram nas últimas semanas. "Eu continuarei crítico, sempre de forma respeitosa, como sempre fui, e espero que o presidente possa me receber para que a gente converse, para que a gente possa encontrar juntos soluções", propôs. No ano passado, Witzel também solicitou uma audiência mas foi ignorado pelo presidente.

O governador lembrou que o Estado tem "vários problemas a serem resolvidos", como o regime de recuperação fiscal. " Tenho recebido apoio do governo federal recentemente. O ministro da Saúde tem me encaminhado respiradores, testes... Apesar dos nossos embates críticos, tenho percebido que o governo federal tem se aproximado do Rio de Janeiro. É isso que a gente espera", afirmou.

Ao criticar as operações Favorito e Placebo, Witzel repetiu que é alvo de um movimento que leva ao "assassinato de reputações". Mas evitou atribuir qualquer responsabilidade a Bolsonaro. "O uso político das instituições muitas vezes é [feito] pela própria instituição, para se fortalecer, para intimidar determinados políticos e ganhar força para obter benefícios próprios para a instituição. O que levaram para o ministro [do STJ] é uma narrativa fantasiosa, tanto da Polícia Federal daqui do Rio de Janeiro, quanto do Ministério Público", disse.

A mudança de postura de Witzel foi apoiada por aliados, como o deputado Márcio Pacheco (PSC), que lembrou ter "amizade histórica" com o senador Flávio Bolsonaro (Republicano-RJ): "As posturas políticas do presidente da República devem ser julgadas por quem votou nele. Isso [relação entre Bolsonaro e Witzel] não pode ser transformado numa guerra política de quem pode mais chora menos, ou seja, de quem tem mais poder". Pacheco renunciou à liderança do governo na Assembleia Legislativa em meio à crise que pode levar à abertura de processo de impeachment contra o governador.