O globo, n. 31681, 03/05/2020. Especial Coronavírus, p. 13

 

Na crise, agenda de Bolsonaro prioriza ministros militares

Gustavo Maia

Daniel Gullino

Naira Trindade

03/05/2020

 

 

Ala do Planalto foi mais recebida pelo presidente do que Guedes e Mandetta 

UESLEI MARCELINO / REUTERSConselheiros. Ramos e Braga Netto: ministros mais recebidos por Bolsonaro

 Desde a chegada do novo coronavírus ao Brasil, o presidente Jair Bolsonaro vem recorrendo à ala militar do Palácio do Planalto para se aconselhar. Nos últimos 64 dias, o grupo com três ministros-generais e um major da Polícia Militar esteve presente na maioria das audiências privadas do presidente e foi mais recebido do que titulares de pastas na linha de frente da crise. Na liderança das participações em agendas está o ministro-chefe da Secretaria de Governo, Luiz Eduardo Ramos, articulador político do governo. Levantamento feito pelo GLOBO mostra que ele se encontrou com o presidente 114 vezes em pouco mais de dois meses, seguido do chefe da Casa Civil, Walter Braga Netto, com 78 reuniões.

Ramos tenta minimizar, alegando ser normal despachar com o chefe do Executivo. Ministros palacianos, em geral, já são os mais assíduos às agendas do presidente por trabalharem no mesmo prédio. É o caso do ministro da Secretaria-Geral da Presidência, Jorge Oliveira, com 68 registros, e do chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), Augusto Heleno, com 45. Mas o presidente se reuniu mais vezes com a ala militar, por exemplo, do que com o ministro da Economia, Paulo Guedes. Apelidado de Posto Ipiranga, Guedes esteve em 32 agendas com Bolsonaro durante o período. Coube à pasta formular o programa de auxílio emergencial de R$ 600, uma das principais medidas de combate à Covid-19.

EM SINTONIA

Esta semana, Guedes fez questão de frisar em entrevista coletiva no Planalto que está em sintonia com Braga Netto, da ala militar, após notícias de que a relação estava estremecida por causa do lançamento do plano Pró-Brasil sem a sua presença. Os dois falaram juntos com a imprensa. Apesar da pandemia, que já registra mais de 6.300 mortes no país, o ex-ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, que passou por um processo de fritura até ser demitido no último 16, frequentou menos o Planalto nesse período.

Mandetta esteve 17 vezes com Bolsonaro. Mais próximo do presidente, o diretorgeral da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), Antônio Barra Torres, o visitou 19 vezes. O sucessor de Mandetta no Ministério da Saúde, Nelson Teich, conseguiu, nas duas semanas que está no governo, reunir-se com o presidente em pelo menos dez ocasiões. Enquanto o articulador de política do governo é o campeão de reuniões, os líderes do governo no Senado e no Congresso — Fernando Bezerra Coelho (MDB-PE) e Eduardo Gomes (MDB-TO) —têm mantido pouco contato pessoal com o chefe do Executivo durante o período de distanciamento social. Eles estiveram apenas três e duas vezes, respectivamente, na agenda de Bolsonaro. A exceção é o líder na Câmara, Major Vitor Hugo (PSL-GO), que soma 14 audiências. O deputado federal Fábio Faria (PSD-RN) esteve em 12 agendas, o que demonstra que passou a integrar o círculo íntimo do presidente. Faria mantém a ponte de Bolsonaro com o Congresso, devido à boa relação com o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ).

O ex-ministro da Justiça Sergio Moro esteve com o chefe, agora desafeto, em 16 oportunidades — a última na fatídica reunião do dia 23 em que Bolsonaro informou que demitiria o então diretor-geral da Polícia Federal, Maurício Valeixo, o que se confirmou no dia seguinte. Entre os atuais 22 ministros, sem contar o recém-empossado José Levi Mello, da Advocacia-Geral da União (AGU), a titular da Mulher, Família e Direitos Humanos, Damares Alves, teve o menor número de audiências — foram apenas quatro. Empossada em 4 de março, a secretária especial de Cultura, Regina Duarte, só apareceu na agenda de Bolsonaro uma vez, mesma frequência de Maia.