Correio braziliense, n. 20831 , 04/06/2020. Brasil, p.11

 

Indústria sofre tombo recorde com pandemia

Marina Barbosa

04/06/2020

 

 

Produção das fábricas teve retração de 18,8% em abril, em relação a março. Na comparação com o mesmo mês de 2019, recuo foi ainda maior: 27,2%. Para especialistas, comércio e serviços devem apresentar queda semelhante

A pandemia do novo coronavírus provocou uma queda recorde na indústria brasileira. De acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a produção das fábricas despencou 18,8% em abril ante março, quando já havia recuado 9,1%. E o tombo foi ainda maior em relação a abril do ano passado: 27,2%. Este, porém, deve ser só o primeiro de uma série de baques da atividade econômica em abril. Os economistas projetam quedas acentuadas também para os setores de comércio e serviços. Além disso, acreditam que o cenário negativo deve se estender pelos próximos meses.

“Abril será o mês mais negativo dessa crise, porque tivemos 30 dias completos de isolamento social e de parada econômica. Em março, tivemos só 15 dias de isolamento e, em maio, já houve o relaxamento do distanciamento social em alguns locais. Mas, em abril, não. A maior parte da atividade econômica parou”, explicou o pesquisador do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV/Ibre), Claudio Considera.

Por conta disso, o Indicador de Atividade Econômica da FGV/Ibre já calcula uma queda de 7% da atividade econômica em abril, ante março. Essa queda ainda sobe para 10,9% quando se compara abril de 2020 com abril de 2019. E ainda pode ficar maior. O resultado oficial do setor de comércio e de serviços ainda não foi divulgado pelo IBGE, mas especialistas alertam que, devido ao fechamento do comércio e dos serviços não essenciais em abril, esse recuo pode ser ainda mais grave que o da indústria.

“A queda da produção industrial é a mais intensa desde o início da série histórica, e fez com que a produção alcançasse o patamar mais baixo desde o início da série, em 2002, ou seja, foi o pior desempenho em 18 anos”, destacou o gerente da Pesquisa Industrial Mensal (PIM) do IBGE, André Macedo.

Macedo explicou que, com as medidas de isolamento social, a maior parte das fábricas precisou interromper a produção em abril, acentuando o recuo que já havia sido sentido no início da pandemia. E o setor ainda foi afetado pela retração do consumo das famílias, que, praticamente, só estão comprando bens essenciais. “Com a pandemia, as indústrias foram obrigadas a paralisar a produção. E muitas das que ainda trabalharam operaram apenas os setores essenciais”, explicou o diretor de Desenvolvimento Industrial da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Carlos Eduardo Abijaodi.

O IBGE constatou quedas históricas em todas as categorias industriais: bens de consumo duráveis (-79,6%); bens de capital (-41,5%); bens de consumo (-26,1%); bens intermediários (-14,8%); e bens de consumo semi e não duráveis (-12,4%).  Em termos de atividades industriais, 22 das 26 atividades avaliadas pelo IBGE apresentaram retração.

Só escapou do vermelho a produção dos bens essenciais que continuam sendo consumidos normalmente na quarentena. Isto é, alimentos, produtos farmoquímicos e farmacêuticos e produtos de limpeza — que tiveram alta de 3,3%, 6,6% e 1,3%, respectivamente. Além da indústria extrativa, que ficou estável (0%).

Na lista de recuos, destacam-se as retrações sofridas pelos bens de consumo duráveis, que são vistos como supérfluos neste momento de pandemia e, por isso, tiveram a compra postergada. O maior exemplo está na produção de veículos automotores, reboques e carrocerias, que já havia se contraído 28% em março e despencou mais 88,5% em abril — a queda mais intensa da série histórica do IBGE.

“As pessoas estão com medo de se endividar, estão inseguras em relação ao desemprego. Por isso, não compraram bens de consumo duráveis, nem semiduráveis, como calçados e roupas, porque não tinham nem onde comprar, já que o comércio passou todo o mês de abril fechado”, lembrou Considera, da FGV.

88,5%

Diminuição da produção de automóveis, reboques e carrocerias em abril

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Varejo: diminuição de 32%

04/06/2020

 

 

As vendas do comércio varejista tiveram queda de 31,8% em abril, na comparação com o mesmo mês do ano passado, segundo levantamento da Serasa Experian. Essa é a maior retração desde o início da série histórica iniciada em 2001, baseada no número de consultas feitas à base de dados da consultoria, segundo informações da Agência Brasil. A maior queda havia sido em janeiro de 2002, quando as vendas do varejo tiveram redução de 16,5%.

No acumulado dos quatro primeiros meses do ano, a atividade do varejo apresenta uma retração de 10,1% em relação ao período de janeiro a abril de 2019.

Entre os setores que mais sofreram em abril, está o de eletrodomésticos e eletroeletrônicos, com queda de 39,9% na comparação com o mesmo mês do ano passado. O varejo de vestuário e calçados registrou redução de 39,6% nas vendas; o de veículos, motos e autopeças, de 33,1%; e o de material de construção, de 32,1%.

O ramo de supermercados, alimentos e bebidas foi um pouco menos afetado, com uma redução de 24,3% no movimento de abril. Os estabelecimentos que comercializam combustíveis e lubrificantes tiveram queda de 19,3% no mês.

Para o economista da Serasa Luiz Rabi, a queda no movimento foi influenciada diretamente pela adoção das medidas de distanciamento social contra a pandemia do novo coronavírus (covid-19). “Com estabelecimentos comerciais de portas fechadas, lojistas viram seus estoques aumentarem e a demanda por produtos, diminuir”, disse.

O economista também destaca o impacto da crise na estabilidade financeira das famílias. “Neste momento de instabilidade, em que muitos ficam inseguros em seus empregos, o brasileiro se retrai para o consumo não essencial. Até mesmo quem tem um poder de compra mais elevado acaba direcionando seus recursos para uma reserva de emergência”, explicou Rabi.

Frase

"Neste momento de instabilidade, em que muitos ficam inseguros em seus empregos, o brasileiro se retrai para o consumo não essencial. Até mesmo quem tem poder de compra mais elevado acaba direcionando os recursos para uma reserva de emergência”

Luiz Rabi, economista da Serasa Experian