O Estado de São Paulo, n.46220, 04/05/2020. Política, p.A6

 

Profissionais do 'Estado' são agredidos em ato

04/05/2020

 

 

Apoiadores do presidente Bolsonaro promovem ataques contra equipe do jornal durante manifestação pró-governo em Brasília

Apoiadores do presidente Jair Bolsonaro agrediram com chutes, socos e empurrões a equipe de profissionais do Estadão que acompanhava uma manifestação pró-governo realizada ontem em Brasília. O fotógrafo Dida Sampaio registrava imagens do presidente em frente à rampa do Palácio do Planalto, numa área restrita à imprensa, quando foi agredido.

Ministros do Supremo, partidos políticos, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, e entidades como a Associação Nacional de Jornais (ANJ) e a Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji) rechaçaram os ataques. Em nota, a direção do Estadão disse que “trata-se de uma agressão covarde contra o jornal, a imprensa e a democracia”. Até a conclusão desta edição, o Palácio do Planalto não havia se manifestado.

Sampaio usava uma pequena escada para fazer o registro das imagens quando foi empurrado duas vezes por manifestantes, que desferiram chutes e socos nele. O motorista do jornal, Marcos Pereira, que apoiava a equipe de reportagem, também foi agredido fisicamente com uma rasteira. Os manifestantes gritavam palavras de ordem, como “fora Estadão” e “lixo”.

Os dois profissionais precisaram deixar o local rapidamente para uma área segura e procuraram o apoio da Polícia Militar. Eles deixaram o local escoltados pela PM. Os profissionais passam bem. Vencedor de dois prêmios Esso e três Vladimir Herzog, Dida Sampaio trabalha no Estadão desde 1994.

O repórter da Folha de S.Paulo Fabio Pupo também foi empurrado ao tentar defender o fotógrafo do Estadão. Júlia Lindner e André Borges, jornalistas do Estadão que também acompanhavam a manifestação em outro ponto da Esplanada, foram insultados, mas não sofreram agressões físicas.

Uma multidão participou do ato estimulado pelo presidente. A ação ocorre após o ex-ministro Sérgio Moro prestar depoimento no inquérito aberto pelo Supremo Tribunal Federal (STF) para apurar denúncia feita por ele de que o presidente Bolsonaro utilizou o cargo para tentar ter acesso a investigações sigilosas da Polícia Federal.

Entre os gritos contra Maia e ministros do Supremo, os manifestantes que participaram do ato de ontem também se posicionaram contra a imprensa. Em certo momento, parte deles começou a gritar “Globo Lixo” e partiu contra profissionais de empresas jornalísticas. Neste momento, a alguns metros de distância, o presidente Jair Bolsonaro foi avisado por um auxiliar que os profissionais da emissora estavam sendo expulsos.

Diante da informação, Bolsonaro não repreendeu a atitude e endossou críticas à emissora. “Pessoal da Globo vem aqui para pegar um cara ou outro falar besteira. Essa TV realmente foi longe demais”, comentou durante transmissão ao vivo nas redes sociais.

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Ministros do STF, Maia e Doria condenam ataques

04/05/2020

 

 

Para integrantes da Corte e autoridades, agressões a jornalistas ofendem a liberdade de imprensa e a Constituição

As agressões aos profissionais do Estadão durante manifestação com a presença do presidente Jair Bolsonaro, ontem, ocorreram no Dia da liberdade de imprensa e receberam o repúdio de diversas autoridades. A ministra do Supremo Tribunal Federal, Cármen Lúcia, afirmou que “quem transgride e ofende a liberdade de imprensa ofende a Constituição, a democracia e a cidadania brasileira”. Para ela, isso significa atuar de maneira inconstitucional. “É inaceitável, é inexplicável que ainda tenhamos cidadãos que não entenderam que o papel de um profissional da imprensa é o papel que garante, a cada um de nós, poder ser livre”, afirmou.

“É de se lamentar esses episódios. A agressão a cada jornalista é agressão à liberdade de expressão e à própria democracia e isso precisa ficar bem claro e ser repudiado”, disse o ministro Gilmar Mendes, do STF.

O ministro Alexandre de Moraes, também do Supremo, afirmou que agressões contra jornalistas “devem ser repudiadas pela covardia do ato e pelo ferimento à Democracia e ao Estado de Direito”. O ministro Luiz Fux, do STF, também destacou a ameaça à democracia. “A dignidade da imprensa se exterioriza pela sua liberdade crítica, de investigação e de denúncia de atitudes anti-republicanas.”

O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), afirmou que cabe às instituições democráticas impor a “ordem legal a esse grupo que confunde fazer política com tocar o terror”. “Ontem enfermeiras ameaçadas. Hoje jornalistas agredidos. Amanhã qualquer um que se opõe à visão de mundo deles”, disse.

O governador de São Paulo, João Doria, afirmou em seu Twitter que a justiça precisa punir os que agrediram profissionais da imprensa e também profissionais de saúde. “Milicianos ideológicos agridem covardemente profissionais de saúde num dia. Agridem profissionais de imprensa no outro”, escreveu Doria na rede social.

Wilson Witzel, governador do Rio de Janeiro, criticou o presidente Jair Bolsonaro por não ter se manifestado em relação às agressões aos jornalistas do Estadão e declarou que o único plano de seu governo é “alimentar o caos”.

Para o presidente da Força Sindical, Miguel Torres, o “trabalho da imprensa precisa ser respeitado exercido com total segurança e liberdade”.

'Repudiado'

“A agressão a cada jornalista é agressão à liberdade de expressão e à própria democracia e isso precisa ficar bem claro e ser repudiado.”

Gilmar Mendes

MINISTRO DO STF