O Estado de São Paulo, n.46215, 29/04/2020. Economia e Negócios, p.B1

 

Governo estima fila de 200 mil que não conseguem acessar seguro-desemprego

Lorenna Rodrigues

Thaís Barcelos

Luísa Laval

29/04/2020

 

 

Com os postos do Sine fechados por conta da quarentena contra o novo coronavírus, trabalhadores relatam dificuldades para concluir cadastro por meio do site ou do aplicativo da Carteira de Trabalho Digital; especialistas falam em número ainda maior à espera de benefício

Trabalhadores que tentam receber o seguro-desemprego relatam dificuldades em concluir o pedido por meio de site ou aplicativos do governo e se queixam de falta de informações pelos canais remotos de atendimento da Secretaria Especial de Previdência e Trabalho, órgão responsável pela liberação do benefício. Como resultado, o próprio governo estima que aproximadamente 200 mil trabalhadores que perderam o emprego entre março e a primeira quinzena de abril ainda não conseguiram solicitar o seguro – número que deve ser maior na visão de especialistas.

Os dados oficiais ainda mostram queda nos pedidos de seguro-desemprego. De acordo com o Ministério da Economia, 866.735 trabalhadores deram entrada no pedido entre o começo de março e a primeira quinzena de abril de 2019. Em 2020, no mesmo período, foram 804.538.

Entretanto, considerando a estimativa de desempregados que não pediram o benefício devido ao fechamento de agências das agências do Sine (Sistema Nacional do Emprego) – que ainda funcionam de forma remota – ou outras questões, o número de 2020 ultrapassaria 1 milhão, ou seja, cerca de 150 mil pedidos a mais do que em 2019.

“Tendo em vista o fechamento do sistema Sine, temos demanda reprimida. Ainda temos pequena fila que estamos dando conta rapidamente”, disse ontem o secretário de Previdência e Trabalho, Bruno Bianco, em entrevista no Palácio do Planalto.

Para o pesquisador da área de Economia Aplicada do FGV/Ibre, Daniel Duque, o número efetivo de desempregados deve superar os 200 mil estimados pelo governo, para março e a primeira quinzena de abril, e crescer ainda mais nos próximos meses.

Ele lembra que grande parte dos demitidos não pede o benefício imediatamente, já que tem um “colchão” de sobrevivência com as verbas rescisórias. “Não temos dúvida de que esse dado vai aumentar. Até o fim de abril, vai haver uma elevação e, a partir de maio, um crescimento expressivo”, afirmou Duque.

Atendimento remoto. Desde o fim de março, com a entrada em vigor do estado de calamidade pública, as agências do Sine deixaram de atender os trabalhadores presencialmente e têm feito o procedimento de forma remota.

Agora, para solicitar o seguro, os trabalhadores precisam fazer o pedido pelo site ou pelo aplicativo Carteira de Trabalho Digital. Os canais, porém, não resolvemo problema de quem foi demitido e está precisando do benefício com urgência durante a pandemia.

A empregada doméstica Angelada Silva Nascimento Santos foi demitida no começo de março e, desde então, não consegue entrar com o pedido do seguro-desemprego. Antes, o site de agendamento para a unidade de sua região, em Jacarepaguá (RJ), estava sem disponibilidade de horário e, depois do início da quarentena, segundo ela, ficou ainda pior. Angela ainda tentou entrar em contato por telefone para dar entrada no pedido, mas diz que sempre está ocupado. “Não recebo Bolsa Família e não consegui pedir o auxílio emergencial. Estou desesperada”, afirma ela.

Roberta Ferreira, moradora da Rocinha, também na capital fluminense, é outra que está com dificuldades para solicitar o benefício: ela foi demitida no dia 1.º de abril e tenta há 15 dias solucionar o problema, sem sucesso. “A rotina está sendo acordar às 6h, ligar para o número 158 às 6h59 e tentar ser atendida. Quando tento fazer meu pedido pelo app Carteira de Trabalho Digital, consta que meus dados estão divergentes.”

Desemprego

804.538

trabalhadores entraram com o pedido do seguro- desemprego entre março e abril deste ano, de acordo com dados do Ministério da Economia. No mesmo período de 2019, foram 866.735