Correio braziliense, n. 20836 , 09/06/2020. Política, p.2

 

Toffoli critica Bolsonaro por atitudes dúbias

Renato Souza

09/06/2020

 

 

BRASIL EXTREMO » Presidente do Supremo Tribunal Federal diz que conduta do chefe do Executivo “assusta a sociedade brasileira”. Ele prega a “paz institucional”. AMB lança manifesto em defesa da Corte e da democracia

O presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Dias Toffoli, criticou “atitudes dúbias” do presidente Jair Bolsonaro. De acordo com o ministro, esse tipo de conduta tem assustado a sociedade brasileira e a comunidade internacional, além de gerar impactos sobre a economia.

As declarações foram feitas em um evento promovido pela Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB), que lançou um manifesto em defesa do STF e da democracia. Toffoli lembrou que, no ano passado, Bolsonaro foi contra a abertura de comissão parlamentar de inquérito para investigar magistrados do Supremo, a chamada CPI da Lava Toga. No entanto, o chefe do Executivo teve uma atitude diferente em relação à conduta de seus apoiadores que atacam a Corte.

Toffoli destacou que o problema do momento, e o grande desafio, é a pandemia de coronavírus e a “crise econômica que se avizinha”. Ele declarou que é momento de união institucional. “É necessária uma trégua entre os Poderes. E, aqui, dialogo diretamente com os presidentes de Poderes, em especial com o presidente Bolsonaro. Não são mais possíveis atitudes dúbias. Eu tenho certeza de que o presidente Jair Bolsonaro, em todo o relacionamento harmonioso que tenho com sua excelência, como tenho com seu governo e com o vice-presidente Hamilton Mourão... Eles juraram defender a Constituição e são democratas. Chegaram ao poder pela democracia e pelo voto popular, merecem o nosso respeito”, afirmou. “Mas algumas atitudes têm trazido uma certa dubiedade, e essa dubiedade impressiona e assusta a sociedade brasileira. E, hoje, não mais só a sociedade brasileira. Também a comunidade internacional das nações, também a economia internacional.”

Ele emendou: “Nós precisamos de paz institucional, precisamos ter prudência e união no combate à covid e a seus efeitos colaterais”.

O ministro também reprovou atos de parlamentares contra o Judiciário. “Críticas podem ser feitas. Podem ter tramitação no Congresso propostas de mudanças na composição, da forma de composição do Poder Judiciário. Isso faz parte da democracia”, frisou. “O que não tem cabimento são manifestações atentatórias ao Estado democrático de direito. Propostas no sentido de fechar o Supremo, de demitir os 11 ministros e colocar o que no lugar?”, questionou.

Repúdio

No manifesto da AMB, entregue a Toffoli, entidades como a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), a Associação dos Juízes Federais (Ajufe), o Colégio de Presidentes dos Tribunais de Justiça do Brasil e a Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra), “repudiam os ataques e as ameaças desferidas contra o Judiciário por grupos que pedem desde a prisão dos ministros do Supremo Tribunal Federal até a imposição de uma ditadura”.

O documento declara que o direito à liberdade de expressão não pode ser evocado para pedir o fechamento do Supremo ou ameaçar instituições democráticas. “Atacar o STF significa ameaçar todo o Judiciário e os valores democráticos do Brasil. Discordâncias, debates e críticas fazem parte e são bem-vindas no Estado de direito. A liberdade de manifestação e de expressão, no entanto, não abarca discursos de ódio e a apologia ao autoritarismo, à ditadura e a ideologias totalitárias que já foram derrotadas no passado”, completa.

O ministro Alexandre de Moraes, também do STF, participou do evento. Ele evitou fazer comentários acerca do tema, se limitando a parabenizar os organizadores do manifesto. Moraes é o relator do inquérito aberto por Toffoli, no ano passado, que apura ataques e fake news contra a Corte e seus membros. As decisões dele — que autorizou o cumprimento de mandados de busca e apreensão contra apoiadores do governo — foram alvo de críticas do presidente Jair Bolsonaro.

Frases

“Algumas atitudes têm trazido uma certa dubiedade, e essa dubiedade impressiona e assusta a sociedade brasileira”

Dias Toffoli, presidente do STF

 “Atacar o STF significa ameaçar todo o Judiciário e os valores democráticos do Brasil”

Trecho do manifesto da AMB

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Elogios para Aras

Jorge Vasconcellos

09/06/2020

 

 

O presidente do Supremo Tribunal Federal (STF) e do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), Dias Toffoli, enalteceu, ontem, o trabalho do procurador-geral da República, Augusto Aras, e considerou “injustas” as críticas que têm sido feitas ao chefe do Ministério Público Federal (MPF). O ministro frisou que Aras tem agido com prudência e parcimônia, buscando evitar problemas para o país.

“Fica aqui o meu testemunho da firmeza, da coragem de atuação e, mais do que nunca, de não cair na vaidade que outros no passado caíam, de achar que o holofote é a solução, quando não é. É o trabalho, é a dedicação, é o conteúdo, é a defesa da instituição e é o que vossa excelência, o PGR, vem fazendo”, disse Toffoli, por videoconferência, durante abertura III Fórum Nacional de Corregedores (Fonacor). Aras também participou do evento, da mesma forma que os presidentes da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP).

Ao afirmar que o procurador-geral vem “exercendo as suas funções com altivez, firmeza e liderança”, Toffoli frisou que não é por meio da mídia nem de discursos que as coisas se resolvem, mas, sim, com uma atuação concreta nos atos jurídicos. Apesar dos elogios, foi o presidente do STF quem decidiu, de ofício e sem consultar a Procuradoria-Geral da República (PGR), instaurar o inquérito das fake news para investigar ataques aos ministros da Corte.

Aras tem sido alvo de questionamentos por sua atuação em casos envolvendo o governo e o presidente Jair Bolsonaro. Essas controvérsias vêm desde a indicação dele para o cargo, quando o chefe do Executivo o escolheu sem considerar a lista tríplice com nomes selecionados em votação interna do MPF.

O PGR foi criticado, por exemplo, quando pediu ao ministro Celso de Mello, do STF, que não autorizasse a divulgação da íntegra do vídeo da reunião ministerial de 22 de abril. Esse encontro foi citado pelo ex-ministro da Justiça Sergio Moro como prova da interferência de Bolsonaro na Polícia Federal. Mello, relator do inquérito sobre o caso, acabou levantando o sigilo total da gravação. Com base nessa investigação, Aras está prestes a decidir se denuncia ou não o presidente.

Nas últimas semanas, Bolsonaro fez uma série de gestos em direção ao PGR. Ele “se convidou” para visitar Aras, acenou que poderia indicá-lo para uma vaga no STF — o que, posteriormente, negou — e ainda o condecorou com Ordem do Mérito Naval.

Fake news

Amanhã, o plenário do STF julgará a ação que pede a suspensão do inquérito das fake news. A ação, de autoria do partido Rede Sustentabilidade, diz que a investigação é ilegal pelo fato de ter sido aberta de ofício por Toffoli. Porém, o inquérito é respaldado pelo regimento interno do tribunal.

Em um parecer encaminhado ao STF, Aras defendeu a continuidade da investigação, mas cobrou a participação do MPF em todas as suas etapas. Essa cobrança deve dar o tom dos debates durante o julgamento desta quarta-feira.