Correio braziliense, n. 20839 , 12/06/2020. Política, p.4

 

Mais perto do 2º lugar do mundo em mortes

Maria Eduarda Cardim

Bruna Lima

12/06/2020

 

 

No país, 40.919 pessoas perderam a vida para a covid-19 e 802.828 diagnosticadas com a doença, no momento em que se começa a flexibilizar o isolamento social. Na frente do Brasil, em número de óbitos, estão o Reino Unido, com 41.364, e os EUA, que somam 113.561

Sem capacidade de testagem em massa, taxas de ocupação de leitos de UTI perto do limite e explosão de casos e mortes, o Brasil supera, há dias, as atualizações diárias de todos os países. Ontem, somou mais 1.239 óbitos e 30.412 casos no balanço, acumulando 40.919 vítimas fatais e 802.828 pacientes diagnosticados. Mesmo assim, o país vive um momento de flexibilização do isolamento social, com a abertura de comércios, algo que, consequentemente, faz com que o vírus se espalhe mais facilmente.

O alto aumento diário coloca o Brasil cada vez mais perto de se tornar o segundo do mundo com mais mortos pelo novo coronavírus. Com faixa de 1,2 mil óbitos diários, a previsão é que ainda hoje os números brasileiros superem os do Reino Unido, que acumula 41.364 fatalidades. Na frente do ranking da Universidade Johns Hopkins continua os Estados Unidos, com 113.561 mortes.

Somente em São Paulo foram contabilizados, até ontem, um total de 10.145 óbitos –– ou seja, mais do que o dobro de fatalidades da China, país onde se originou a doença e que, segundo dados da Organização Mundial da Saúde (OMS), soma 4.634 vítimas fatais desde o começo da pandemia. Nas últimas 24 horas, o estado somou mais 283 óbitos e 6.204 novos casos, chegando a 162.520 infectados.

Em seguida, e também próximo de alcançar o dobro de mortes na China, aparece o Rio de Janeiro, com 7.363 pessoas mortas. O Ceará, que ontem ultrapassou o total de chineses mortos, reportou mais 183 perdas, somando 4.663. Outros cinco estados superaram a marca das mil mortes: Bahia confirmou 1.013 perdas pela doença; Pará (4.030), Pernambuco (3.633), Amazonas (2.400), Maranhão (1.360) já haviam quebrado a barreira anteriormente.

Os números, que são altos e chamam atenção, podem ser ainda maiores por causa da sub-notificação. Pesquisadores responsáveis pelas análises do portal Covid-19 Brasil estimam que o total de infectados chega a ser 10 vezes maior do que o revelado pelos dados oficiais. Desta forma, o Brasil teria, na verdade, uma média de mais de 6,39 milhões de pessoas infectadas. Esse cálculo colocaria o país no topo da lista dos mais contaminados, com números três vezes maiores do que o dos EUA, que têm 2,01 milhões de confirmados com a doença.

Na visão dos especialistas, o afrouxamento das medidas de distanciamento social, sem as informações necessárias para saber quem está infectado e qual a velocidade em que a doença se espalha, levará o sistema de saúde ao colapso.

Intransigência

No manhã do dia em que se registraram 40.919 vítimas fatais no país, uma instalação montada na praia de Copacabana, no Rio de Janeiro, que homenageava as vítimas do novo coronavírus e protestava contra a condução da crise sanitária pelo governo federal, foi vandalizada. O tributo às vítimas da covid-19, organizado pela ONG Rio de Paz, era composto por 100 covas rasas cavadas na praia e cruzes pintadas de preto fincadas na areia.

Três homens e uma mulher, apoiadores do presidente Jair Bolsonaro, agrediram verbalmente os manifestantes e repetiram que a ação estava apenas criando pânico social. Um deles xingou os organizadores de “seus merdas” e invadiu o cenário, derrubando, ao menos, 20 cruzes.

“Nós estávamos ouvindo muitas expressões de ódio, provocação. Mas um senhor decidiu derrubar as cruzes, mesmo sem que nós tivéssemos reagido”, contou Antônio Carlos Costa, presidente da Rio de Paz.

Em um vídeo divulgado nas redes sociais da ONG, é possível ver o homem gesticulando e empurrando as cruzes na areia. Na sequência, o taxista Marco Antônio do Nascimento Silva, de 55 anos, que perdeu um filho para a doença, pediu respeito e, irritado, recolocou os objetos arrancados.

“Meu filho morreu com 25 anos. Ele era saudável. Vocês têm que respeitar a dor das pessoas. O mesmo direito que ele tem de tirar eu tenho de botar”, esbravejou. O homem que violou a instalação não foi identificado.

Houve um princípio de bate-boca, mas o grupo bolsonarista se afastou, apesar de continuar gritando para atrapalhar a entrevista que os responsáveis pela ação concediam.

A ONG Rio de Paz esclareceu que é um movimento suprapartidário e que não recebe verbas públicas de qualquer espécie. Os organizadores do protesto pediram mudanças na postura do presidente da República e acusam a “sucessão de erros” cometida pelo governo federal no combate ao novo coronavírus.

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Bolsonaro: Mandetta "inventou" número

Matheus Adler

12/06/2020

 

 

No dia em que o Brasil chegou a 40.919 óbitos e 802.828 casos confirmados de coronavírus, o presidente Jair Bolsonaro acusou, durante uma transmissão ao vivo em sua rede social, Luiz Henrique Mandetta de adulterar números da covid-19 durante a gestão no Ministério da Saúde. Afirmou que os números passados pelo ex-ministro eram “fictícios” e “inflados”.

Também ironizou os conselhos de Mandetta e desconsiderou o fato de o ex-ministro se basear na ciência para a tomada de decisões.

“Levando-se em conta o ministro anterior, esses números eram fictícios. E ele todo dia estava vendendo o peixe de ‘fique em casa’, ‘não saia, a curva tem que amansar’, ‘ciência, foco, foco na OMS (Organização Mundial da Saúde)’. Olha o vexame da OMS aí. Gosto do Mandetta como pessoa, mas ali ele deu uma escorregadinha na questão da pandemia. Deu uma inflada”, acusou Bolsonaro.

O presidente foi além: acusou Mandetta de ser um “cliente da TV Globo”, pelo fato de o ex-ministro ter concedido entrevistas à emissora, em diversas oportunidades, e que por isso ele estava entusiasmado em relação aos “números exagerados”.

“Ele foi empolgado pela Globo. Sabemos que ele era um cliente da Globo, gostava de dar entrevista para a Globo, mas nada pessoal contra ele. Em outras áreas trabalhou muito bem, boa sorte ao Mandetta. Mas houve exagero nos números da época”, provocou.

Bolsonaro menosprezou ainda mais a situação ao pedir aos apoiadores para filmarem os hospitais comuns e de campanha, e mandarem os registros para o governo. “Muita gente vem fazendo isso, mas mais gente tem que fazer para mostrar se os leitos estão ocupados ou não, se os gastos são compatíveis ou não”, disse.

Até o fechamento desta edição, o ex-ministro não havia se manifestado sobre as acusações.

Frase

“Gosto do Mandetta como pessoa, mas ali ele deu uma escorregadinha na questão da pandemia. Deu uma inflada”

Jair Bolsonaro, presidente da República

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Por vacina, SP fecha acordo com chineses

Maria Eduarda Cardim

12/06/2020

 

 

Um dia depois de estender o período da quarentena em algumas cidades do interior do estado, o governo de São Paulo anunciou, ontem, um acordo entre a empresa farmacêutica chinesa Sinovac e o Instituto Butantã para realização de testes clínicos da vacina CoronaVac em voluntários brasileiros. Ao todo, nove mil brasileiros passarão pelos testes para comprovar a eficácia e segurança do medicamento, que é um dos 10 que estão na fase da testagem em humanos.

Além de permitir que o Butantan realize os testes, o acordo assinado prevê a transferência de tecnologia para o instituto brasileiro caso a vacina seja aprovada. Com isso, a instituição poderá produzir a medicação em larga escala. “Em um primeiro momento, a vacina poderá vir da China, que já tem a produção em grande escala, mas em um segundo momento será produzida pelo próprio Butantan”, indicou o diretor do instituto, Dimas Tadeu Covas.

Para o governador de São Paulo, João Doria, este é o maior benefício da parceria. “A vacina é das mais avançadas. Estudos indicam que estará disponível no primeiro semestre de 2021. Com ela, poderemos imunizar milhões de brasileiros”, indicou. De acordo com a Organização Mundial de Saúde (OMS), 136 vacinas contra a covid-19 estão em desenvolvimento ao redor do mundo, mas somente uma dezena está na fase de testes em humanos.

A parceria prevê a testagem de nove mil voluntários no país, que deve começar no mês que vem. A vacina que será testada pelos brasileiros é composta pelo vírus inativado, ou seja, não contém vírus vivo, apenas fragmentos dele. Com a aplicação da dose, o sistema imunológico passaria a produzir anticorpos.

Produzida pela Sinovac, a CoronaVac foi administrada com sucesso em pessoas na China, durante as fases clínicas I e II. Antes, foi aprovada em testes realizados em macacos. A empresa, no entanto, buscava outros países para dar sequência à etapa final de pesquisas.

O Brasil participa também de outros ensaios clínicos. No início do mês, o país anunciou que testará a vacina contra a covid-19 produzida pela Universidade de Oxford. Ao todo, dois mil brasileiros participarão dos testes, que serão realizados com apoio do Ministério da Saúde. Em São Paulo, o Centro de Referência para Imunobiológicos Especiais (CRIE) da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) conduzirá as pesquisas.