Título: Fornecimento de luz está ameaçado no DF
Autor: Temóteo, Antônio
Fonte: Correio Braziliense, 09/01/2013, Economia, p. 9

Reservatórios de hidrelétricas que abastecem a capital do país estão em níveis críticos. Dilma Rousseff suspende as férias e convoca reunião no Palácio da Alvorada para cobrar medidas efetivas que evitem racionamento

Duas das principais hidrelétricas que abastecem o Distrito Federal estão operando muito abaixo da capacidade, devido à escassez de água, o que aumenta o risco de racionamento na região. Na usina de Queimado, com 105 megawatts (MW) de capacidade instalada, apenas uma das três turbinas está em funcionamento, gerando, em média 35 MW. Em Corumbá IV, que produz até 129,6 MW por hora e abastece 15% da capital do país, uma das duas máquinas está desligada, e a geração se limita a 45MW. Esse quadro se repete em quase todo o país — o nível médio das águas está em 28%, quase o mesmo observado entre 2001 e 2002, quando o Brasil foi obrigado a reduzir o consumo de energia.

Diante desse quadro perigoso, a presidente Dilma Rousseff, que estava de férias na base Naval de Aratu, próxima a Salvador, antecipou o retorno ao trabalho para se inteirar da situação do setor elétrico do país. Ela chegou à Base Aérea de Brasília por volta das 17h e foi direto para o Palácio da Alvorada. Lá, reuniu-se com o secretário executivo do Ministério do Minas e Energia, Márcio Zimmermann, e o diretor-geral do Operador Nacional do Sistema Elétrico, Hermes Chipp. “O ministro (de Minas e Energia Edison) Lobão pediu que a gente desse um relato de como está o sistema elétrico. Estamos atualizando as informações à presidente”, disse Zimmermann. Dilma já havia conversado com Lobão mais cedo.

Segundo Zimmermann, apesar de os especialistas assegurarem que o governo não conseguirá reduzir as contas de luz em pelo menos 20% a partir de março, Dilma garantiu que vai cumprir integralmente a sua promessa. O problema é que a energia produzida por meio de termelétricas é cinco vezes mais cara. E isso será contabilizado pelas empresas durante o processo de revisão tarifária. O secretário também afirmou que não há “possibilidade de apagões ou de racionamento no país”.

O gerente de operação e manutenção de Corumbá IV, Oswaldo Pons Rodrigues Júnior, afirmou que os níveis dos reservatórios estão muito abaixo do normal. Ou seja, apenas um metro e cinco centímetros do mínimo. Dessa forma, a usina opera, atualmente, com apenas 34% de sua capacidade. “Temos um planejamento anual que programa as máquinas de acordo com períodos de seca e estiagem. Trabalhamos com a meta de que, quando voltar a chover, toda água seja aproveitada sem a necessidade de abrir comportas”, explicou, garantindo que, neste momento, o abastecimento está normalizado.

Encarregado de uma casa de festas na beira do reservatório de Corumbá IV, João Mendes não esconde a apreensão. Ele contou que, desde setembro do ano passado, o nível da água do reservatório está diminuindo, o que pode resultar em um racionamento de energia. “Está chovendo muito pouco. A situação está crítica como há tempos não se via”, disse.

Já o consórcio que administra a usina de Queimado, formado pela Companhia Energética de Brasília (CEB) e pela Cemig, não faz medições do nível de água. Embora tenha peso relativamente pequeno para o Sistema Interligado Nacional (SIN), a hidrelétrica é tratada com descaso pelo Operador Nacional do Sistema (ONS), que sequer a contabiliza no cálculo de oferta de energia. Mas, somadas, várias das usinas de porte semelhante garantem o fornecimento a milhões de brasileiros.

Descaso É por essa e outras razões que diretores de entidades do setor elétrico e especialistas discordam da garantia do governo de risco zero de racionamento. Eles lembraram que o estresse que começou em 2013 deve-se a uma combinação de fatores, como atraso na entrega de usinas térmicas e hidrelétricas e de linhas de transmissão para usinas eólicas, além da recusa da presidente em ouvir seus alertas. Destacaram ainda que, se a geração térmica tivesse entrado em campo há seis meses, haveria água estocada suficiente para atravessar o ano com menos incertezas.

Carlos Faria, presidente da Associação Nacional dos Consumidores de Energia (Anace), reclamou da perspectiva de impacto nas tarifas com a crise atual. Ele assinalou que o sistema já gastou, desde outubro, cerca de R$ 2 bilhões adicionais com a energia térmica de retaguarda. Por isso, duvida que a redução prometida de 20% em média na conta de luz se concretize, mediante a renovação de contratos de concessões e de desoneração de encargos. “O corte deve ficar apenas em 10%”, calculou. (Colaborou Juliana Braga)

» Ações derretem

A perspectiva de um cenário de racionamento de energia neste ano derrubou, pelo segundo dia seguido, as ações das companhias elétricas na BM&FBovespa. Apesar de o governo negar a possibilidade de escassez de eletricidade, os papéis preferenciais (PN) da Eletrobras, principal empresa do setor, despencaram ontem mais 9,35%, maior baixa do dia, seguida por seus papéis ordinários (ON), com desvalorização de 8,44%. No dia anterior, a estatal já tinha sofrido recuo de 5%. As ações PN da Cesp e da Eletropaulo derreteram 5,5% e 4,39%, respectivamente. Por conta disso, a bolsa de valores fechou o dia com queda de 1,3%.