Título: Hugo Chávez não toma posse amanhã
Autor: Craveiro, Rodrigo
Fonte: Correio Braziliense, 09/01/2013, Mundo, p. 16

Por meio de mensagem lida na Assembleia Nacional, o vice Nicolás Maduro pede a remarcação do juramento do presidente ante o Supremo Tribunal de Justiça. Oposição denuncia violação da ordem constitucional e recorre à Organização dos Estados Americanos

O vice-presidente da Venezuela, Nicolás Maduro, enviou uma carta, na tarde de ontem, à Assembleia Nacional e solicitou à casa que adie a posse de Hugo Chávez. “O comandante presidente pediu para informar que, de acordo com a recomendação da equipe médica que vela pelo restabelecimento de sua saúde, o processo de recuperação pós-operatório deverá se estender para além do dia 10 de janeiro do ano em curso, motivo pelo qual não poderá comparecer nessa data diante da Assembleia Nacional, o que constitui um motivo imprevisto”, afirma o texto, lido pelo presidente do Legislativo, Diosdado Cabello. Por esta circunstância, “o artigo 231 da Constituição da República Bolivariana da Venezuela é invocado para formalizar, em uma data posterior, a correspondente posse ante o Supremo Tribunal de Justiça”, acrescentou. Ao fim da leitura, Cabello gritou “Que viva Chávez”. Foi aplaudido pelos parlamentares, que repetiram essas palavras.

Para Luis Vicente Leon, presidente do instituto Datanálisis e professor da Universidad Católica Andrés Bello (Ucab), afirmou ao Correio que os chavistas se beneficiaram de um vazio na Constituição para solicitar a remarcação da posse. Segundo ele, o texto cita que o juramento deve ocorrer em 10 de janeiro do primeiro ano de seu período constitucional, mas não especifica o caso de um novo mandato. “A decisão é inconstitucional, mas está legitimada pelo controle institucional do chavismo”, observa.

Horas antes, a opositora Mesa de Unidade Democrática (MUD) enviou um comunicado a José Miguel Insulza, secretário-geral da Organização dos Estados Americanos (OEA), por meio do qual denunciou uma violação da Carta Democrática Interamericana. “Representantes do governo atual romperiam a ordem constitucional, ao pretenderem a extensão do atual mandato presidencial”, estabelece a carta.

Principal nome da oposição, Henrique Capriles Radonski — governador do departamento (estado) de Miranda — cobrou uma posição incisiva do Supremo Tribunal de Justiça ante a suposta violação da Carta Magna. “O Supremo tem que fixar sua posição. (…) O país está esperando uma saída, uma interpretação clara, e essa é uma responsabilidade dos senhores magistrados”, alertou. “Eu não sei o que os magistrados estão esperando. Neste momento, a Venezuela trava um conflito, sem dúvida alguma, constitucional. É preciso haver uma resposta institucional frente a este conflito”, ressaltou. Capriles citou os presidentes Dilma Rousseff (Brasil), Cristina Kirchner (Argentina) e Rafael Correa (Equador) e lhes pediu que “não se prestem ao jogo de um partido político ante a ausência do presidente da República”.

Golpe

Em entrevista ao Correio, o prefeito de Caracas, Antonio Ledezma, foi além e fez uma advertência à comunidade internacional. “Os países do mundo têm que respaldar as democracias. Na Venezuela, está se desenvolvendo um golpe de Estado”, afirmou. A advogada e economista Tibisay Calderón Flores, 56 anos, questiona a legitimidade do documento lido pelo presidente da Assembleia Nacional e duvida da recuperação de Chávez. “O comunicado, obviamente, não foi assinado por Chávez. É um texto truncado, feito por Maduro e Cabello”, disse à reportagem, por meio da internet. “O que mais nos indigna é a intromissão descarada do governo cubano em nossos assuntos”, critica. Tibisay também ataca a postura do Brasil — “uma intromissão intolerável”. Na segunda-feira, o assessor especial para Assuntos Internacionais da Presidência, Marco Aurélio Garcia, demonstrou alinhamento com o chavismo e se simpatizou com a prorrogação da posse de Chávez.

Luis Vicente Leon crê que a oposição tem o direito de protestar. “A ideia da continuidade do governo é ilegal. Mas o presidente pode jurar ante o Supremo Tribunal”, afirma. “Se a formalidade não se cumpre, a oposição pode anunciar a ruptura do processo democrático constitucional.”

O tempo de duração de nosso mandato está na Constituição. (…) Não somos uma monarquia” Henrique Capriles Radonski, líder da oposição e governador do estado de Miranda

O vigarista de Miranda se esqueceu de que já fui presidente graças ao golpe que ele deu em 2002” Diosdado Cabello, presidente da Assembleia Nacional venezuelana

O que diz a Constituição

O artigo 231 da Constituição Bolivariana da Venezuela determina que “o candidato eleito ou a candidata eleita tomará posse do cargo de presidente ou presidente da República a 10 de janeiro do primeiro ano de seu período constitucional, mediante juramento ante a Assembleia Nacional”. Se por qualquer motivo “adverso” não puder fazê-lo, o fará perante o Supremo Tribunal de Justiça. Por sua vez, o artigo 233 afirma que são consideradas faltas absolutas do presidente sua morte, sua renúncia ou sua destituição decretada pelo Supremo Tribunal de Justiça, sua incapacidade física ou mental permanente certificada por uma junta médica designada pelo Supremo Tribunal de Justiça e com a aprovação da Assembleia. “Quando a falta absoluta do presidente eleito ocorrer antes de ele tomar posse, se procederá a uma nova eleição universal, direta e secreta dentro de 30 dias consecutivos seguintes. Enquanto se elege e toma posse o presidente, se encarregará da Presidência da República o presidente da Assembleia Nacional”, afirma o texto.