Título: Culpar raio é para gargalhar
Autor: Braga, Juliana; Lyra, Paulo de Tarso
Fonte: Correio Braziliense, 28/12/2012, Política, p. 3

Para a presidente, os frequentes apagões que atingem o país não podem ser atribuídos a fatores naturais: "Não é sério dizer que o sistema caiu por causa do raio. Se caiu por causa do raio, teve falha humana", disse Dilma em café da manhã com jornalistasJuliana Braga Paulo de Tarso Lyra Em tom de cobrança, a presidente Dilma Rousseff afirmou ontem que os apagões foram causados por falha humana e que esse tipo de problema não pode ser atribuído a fatores externos. "Vocês se lembram da história do raio? De que caiu um raio? No dia em que falarem para vocês que caiu um raio, vocês gargalhem", ironizou Dilma. De pé, e com um mapa de raios nas mãos, a presidente explicou que as descargas elétricas acontecem todos os dias no Brasil e que o sistema deve estar preparado para isso. "Toda nossa briga no sistema elétrico é, nos 121 mil quilômetros (de linhas de transmissão), impedir que, quando caia um raio, o sistema caia também", sustentou.

Por mais de uma vez, o Operador Nacional do Sistema (ONS) alegou problemas com descargas elétricas para justificar interrupções no abastecimento de energia. O último episódio foi em 15 de dezembro, quando um raio foi apontado como provável causa de um blecaute na subestação de Itumbiara (GO), que deixou parte do Sul e do Sudeste sem luz. "O raio é a derivada segunda de uma coisa chamada chuva, que é crucial para esse sistema hidrotérmico brasileiro funcionar. Então, eu não posso querer que tenha chuva e não tenha raio", sustentou. "Não é sério dizer que o sistema caiu por causa do raio. Se caiu por causa do raio, teve falha humana. Teve falha humana, porque raio vai cair", completou a presidente.

A presidente não poupou nem a queda no fornecimento de energia no Aeroporto Internacional do Galeão, no Rio de Janeiro, na última quarta-feira. Naquele dia, a cidade registrou a temperatura mais alta desde 1915 — 43,2ºC —, e a rede elétrica do terminal não aguentou a demanda, causada, principalmente, pelo sistema de ar condicionado. "A temperatura subiu, você não controla. Quando você não controla, você tem de se programar. No Rio de Janeiro, sempre que a temperatura passou de 40ºC, a (concessionária de distribuição de eletricidade) Light teve problema. O Galeão tem problema, a Light tem problema também", criticou Dilma.

Apesar de não admitir o uso da palavra "apagão", já que defende que interrupção na distribuição não é a mesma coisa que falta de energia, a presidente admitiu a possibilidade de novas quedas. "Isso é um sistema de transmissão. Ele é muito longo, muito extenso. Ele vai ser sujeito a estresse", minimizou.

Para diminuir o problema, a presidente assegurou que o país voltará a investir na manutenção do sistema, em vez de gastar somente com a ampliação dele, como era feito até pouco tempo. "Tanto as empresas públicas quanto as privadas têm o mesmo comportamento. É preferível fazer um investimento novo. É sempre preferível e mais rentável fazer um investimento novo do que fazer a modernização no velho", explicou.

Dilma usou uma expressão para explicar a mudança de fase do país — que hoje tem recursos disponíveis e energia suficiente — de investir em manutenção. "O Brasil, que vivia da mão para a boca, ou seja, que não tinha energia, agora tem de fazer as duas coisas: investimento novo e manutenção. Tinha de estar fazendo isso há mais tempo. Nós estamos dando agora um peso absurdo a isso. Há que controlar investimento e manutenção no Brasil inteiro porque nós estamos em outro patamar", defendeu.

Rena do nariz vermelho Também de bom humor, Dilma comentou a publicação no blog Beyondbrics, da página do jornal inglês Financial Times na internet. O blog a caracterizou como uma rena de nariz vermelho discutindo com Papai Noel. Na alegoria, a rena diz que tem o sexto maior chifre do mundo (uma alusão ao PIB brasileiro), mas é contestada pela rena que simboliza o primeiro-ministro britânico, David Cameron (a Inglaterra deve passar o Brasil e ocupar a sexta posição no ranking global de riqueza). "Por que meus chifres não crescem mais rapidamente?", pergunta Dilma. Guido Mantega, que foi nomeado "Elfo Vidente", responde que no próximo ano o crescimento será de um metro. "Tive um estalo", responde o elfo. "Perguntei sobre as previsões dos outros elfos e multipliquei tudo por dois." A sátira do jornal termina com Mantega respondendo que Dilma não o demitia porque a revista The Economist publicou reportagem recomendando sua saída.

"Você é popular em uns meios, não é em outros meios. Eu fico feliz de ser popular junto ao povo", brincou Dilma. A presidente disse ter achado estranho ser comparada a uma rena, já que não há desses animais no Brasil. "Eu poderia ser uma elfa, que auxilia o Papai Noel na distribuição dos presentes", sugeriu. "Não se incomodem com isso. A rena é bem engraçadinha", ironizou.