Valor econômico, v.21, n.5003, 19/05/2020. Política, p. A6

 

MPF irá apurar suposto vazamento de informações

Isadora Peron

Luísa Martins

19/05/2020

 

 

Dois processos que trazem dor de cabeça para o presidente Jair Bolsonaro tiveram desdobramentos ontem. No Rio, o Ministério Público Federal (MPF) decidiu instaurar procedimento para apurar se o senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ) recebeu informações sigilosas sobre a Operação Furna da Onça, deflagrada em 2018. Já o ministro Celso de Mello, do Supremo Tribunal Federal (STF), afirmou que vai decidir sobre o levantamento do sigilo do vídeo da reunião ministerial citada pelo ex-ministro Sergio Moro até o fim desta semana.

Os dois processos não tratam exatamente do mesmo assunto, mas já se encontram. A acusação contra o filho mais velho do presidente foi feita pelo empresário Paulo Marinho (PSDB), que é suplente de Flávio. Em entrevista ao jornal "Folha de S.Paulo" no fim de semana, ele disse que Flávio soube, por um delegado da PF, que Fabrício Queiroz seria alvo de uma operação da PF. O delegado teria recomendado a exoneração de Queiroz, que trabalhava no gabinete de Flávio na Assembleia Legislativa no Rio.

Após as declarações de Marinho, a Procuradoria-Geral da República (PGR) pediu para que a PF colha o depoimento do empresário no âmbito do inquérito que corre no STF.

Esse, no entanto, não foi o único desdobramento. A PF abriu uma apuração interna para averiguar a denúncia. Já o MPF do Rio, além de instaurar um novo procedimento investigatório criminal (PIC) para apurar as declarações de Marinho, também pediu à Justiça Federal que desarquivasse um inquérito que apurou, à época, o suposto vazamento de informações privilegiadas. O caso foi arquivado após a PF afirmar que não havia evidências de crime.

"As investigações do controle externo visam descobrir se policiais federais vazaram informações sigilosas para privilegiar quem quer que seja. Caso fique comprovado qualquer vazamento, mesmo uma simples informações, os policiais responsáveis podem ser presos e até perder o cargo por improbidade", afirma o procurador da República Eduardo Benones, coordenador do Controle Externo da Atividade Policial do MPF do Rio.

No Supremo, permanece a expectativa sobre se o conteúdo da reuniu ministerial do dia 22 de abril vai ser divulgado na íntegra. O encontro foi citado por Moro como prova da suposta interferência política de Bolsonaro na PF. O decano da Corte é o relator do inquérito que apura as acusações.

Ontem, Celso de Mello disse que conversou à tarde com a equipe coordenada pela delegada Christiane Correa Machado, responsável pela condução da investigação, e que recebeu o pen drive no qual estava a gravação da reunião. "Após esse encontro, comecei, agora, a assistir ao vídeo, devendo liberar minha decisão até esta próxima 6ª feira, dia 22/05, talvez antes!", disse a nota emitida pelo gabinete do decano ontem, por volta das 18 horas.

A defesa de Moro pede que o vídeo da reunião ministerial seja divulgado na íntegra. Já a PGR manifestou-se no sentido de que só sejam divulgados trechos que interessem à investigação.

A PF também vai ouvir novas testemunhas do caso. Hoje, o delegado Claudio Ferreira Gomes, diretor de Inteligência da corporação, vai prestar depoimento sobre a suposta cobrança do presidente por relatórios da PF.

Amanhã, os delegados Cairo Costa Duarte e Rodrigo de Morais, envolvidos nas investigações sobre o atentado à faca sofrido por Bolsonaro durante a campanha eleitoral, em 2018, também serão ouvidos.

Já o diretor executivo da Polícia Federal e ex-superintendente da corporação no Rio, delegado Carlos Henrique Oliveira, pediu para prestar um novo depoimento no inquérito. Na semana passada, ele confirmou que Flávio era alvo de um inquérito no âmbito eleitoral que tramitava na superintendência, o que contrariou as falas do presidente de que nenhum familiar seu era investigado pela PF do Rio.

Ele também disse que a saída do delegado Ricardo Saadi da chefia da PF no Rio não se deu por "questões de produtividade", como alegou Bolsonaro no ano passado, quando tentou pela primeira vez mudar o comando da corporação no seu Estado.