O globo, n. 31710, 01/06/2020. Mundo, p. 15

 

Seis dias de fúria

01/06/2020

 

 

Guarda Nacional é chamada a intervir em 15 estados dos EUA

 Os EUA viveram ontem o sexto dia consecutivo de protestos provocados pela morte de George Floyd, o que morreu sob a custódia de um policial branco em Minneapolis, estado de Minnesota, há uma semana. Protestos pacíficos e também confrontos com a polícia, saques e incêndios de prédios comerciais ocorreram em pelo menos 75 cidades do país. Delas, 25 declararam toque de recolher, enquanto 15 estados pediram apoio de Guarda Nacional—foi a primeira vez em que tantos líderes locais emitiram a ordem simultaneamente desde 1968, após as manifestações que se seguiram ao assassinato de Martin Luther King.

Em uma série de tuítes, o presidente Donald Trump manteve o tom de confronto e voltou a culpar governadores e prefeitos democratas pela violência. Ele disse que seu governo designará o Antifa, movimento antifascista que costuma atuar na linha de frente das manifestações, como terrorista. Trump agradeceu a ação da Guarda Nacional—a força militar de reserva chamada a intervir em emergências.

“Os anarquistas da ANTIFA foram dominados rapidamente. Isto devia ter sido feito pelo PREFEITO logo na primeira noite e não teria havido problemas”, escreveu sobre Minneapolis. “Outras cidades e estados administrados por democratas devem analisar o bloqueio total dos anarquistas da esquerda radical. A Guarda Nacional fez um ótimo trabalho e deve ser usada em outros estados antes que seja tarde demais!”

O secretário de Justiça de Trump, William Barr, comparou a violência de grupos extremistas a “terrorismo interno”. Ele também voltou as baterias contra o Antifae“grupos similares”, sem mencionar supremacistas brancos e outras organizações de extrema direita que, segundo políticos nas cidades onde houve protestos, atuam como provocadores.

Rival de Trump na eleição presidencial de novembro, o ex-vice-presidente Joe Biden foi até manifestantes em Wilmington, Delaware. “A única maneira de suportar essa dor é voltá-la para um objetivo”, escreveu no Instagram. Em comunicado, mais cedo, Biden —que apareceu na frente de Trump em uma pesquisa divulgada ontem — disse que “protestar contra a brutalidade é correto e necessário”,mas condenou a violência: “Somos uma nação enfurecida, mas não podemos permitir que nossa raiva nos consuma”.

TRUMP NO BUNKER

Da noite de sábado à noite de ontem, o toque de recolher foi desafiado em várias cidades, com manifestantes nas ruas em Minneapolis, Miami, Atlanta e Los Angeles.

Pelo terceiro dia consecutivo, uma multidão se dirigiu no fim tarde de ontem até os portões da Casa Branca, onde um dia antes Trump ordenou que a segurança fosse reforçada depois que, na sexta-feira, o medo de uma invasão levou o Serviço Secreto a levá-lo para o bunker subterrâneo. A prefeitura de Washington acabou também decretando toque de recolher.

A violência policial também ficou sob escrutínio, com imagens que mostram agentes batendo em manifestantes e lançando indiscriminadamente bombas de efeito moral. Em Atlanta, dois agentes foram afastados pela prefeita. Em Minneapolis, uma equipe da agência de notícias Reuters foi atingida por balas de borracha. Em Nova York, um vídeo mostrou uma viatura avançando contra uma multidão. Mais de 300 pessoas foram detidas na cidade depois que cerca de 20 carros da polícia foram queimados.

Após o incidente, o prefeito Bill de Blasio, democrata, disse que estava investigando o caso, mas enfatizou que os policiais podem não ter tido outra escolha. Já o governador Andrew Cuomo, também democrata, afirmou que as imagens são “inexplicáveis” e pediu uma investigação independente em 30 dias.

— Não vou culpar os policiais que estavam tentando lidar com uma situação absolutamente impossível. As pessoas que estavam convergindo para o carro da polícia errar criaram uma situação insustentável —justificou De Blasio.