O globo, n.31704, 26/05/2020. País, p. 05

 

Planalto admite que Moro não assinou demissão

Aguirre Talento

26/05/2020

 

 

A Secretaria-Geral da Presidência admitiu, em ofício enviado à Polícia Federal, que o então ministro da Justiça Ser gio Moro não assinou o decreto de exoneração de Maurício Valeixo da direção-geral da PF, publicado no Diário Oficial do dia 24 de abril com o nome do presidente Jair Bolsonaro e o do ministro logo abaixo. A informação foi prestada após a PF pedir detalhes sobre a elaboração do decreto, para avaliar se houve falsificação da assinatura de Moro e a ocorrência do crime de falsidade ideológica. O caso está sob investigação no inquérito aberto pelo Supremo Tribunal Federal (STF) sobre supostas interferências indevidas de Bolsonaro na PF.

Na resposta, a Secretaria Geral afirma que é “praxe” no governo colhera assinatura física do ministro só depois da publicação do decreto no Diário Oficial e, sob esse argumento, alega que não houve irregularidades na utilização do nome do então ministro da Justiça no decreto. Diz ainda que o decreto foi refeito depois que Moro apresentou discordância coma demissão.

Em seu depoimento aos investigadores, Sergio Moro afirmou que nunca havia visto a publicação de um decreto com seu nome sem que ele tivesse assinado antes o documento, ao menos eletronicamente. “Decretos assinados pelo Presidente da República e em concurso com o declarante, quando sua origem era um ato produzido pelo MJSP, o que seria o caso da exoneração do diretor Valeixo, sempre eram assinados previamente pelo declarante pelo sistema eletrônico SIDOF antes de encaminhados ao Planalto; que nunca, pelo que se recorda, viu antes um ato do MJSP ser publicado sem a sua assinatura, pelo menos, eletronicamente”, disse Moro.

VERSÃO DIFERENTE

A Secretaria-Geral, porém, apresentou outra versão para os fatos. “O envio do ato de nomeação ou exoneração é precedido apenas da aprovação do atope lo Presidente da República. E, segundo a praxe administrativa, a publicação em Diário Oficial vem acompanhada da inclusão da referenda do ministro ou ministros que tenham relação com o ato conforme previsão constante do art. 87, inciso I, da Constituição”, diz o ofício. Prossegue a Secretaria-Geral: “Após a publicação em Diário Oficial, quando foro caso,é que haverá acolheitada assinatura da referenda no documento físico ”.

Após essa explicação, o órgão afirma que a assinatura de Moro constou no decreto apenas pelo fato de eles ero ministro da Justiça na ocasião, sema intenção de apresentar uma falsificação. No mesmo ofício, a Secretaria-Geral afirma ainda que a Presidência decidiu republicar o decreto, coma assina turados ministros da Casa Civil e da Secretaria-Geral da Presidência e sema assinatura de Moro, após a “discordância externada pelo ex-ministro”.

Como exemplo para demonstrar que a praxe seria assinar o decreto depois da publicação, a Secretaria-Geral da Presidência encaminhou os decretos de nomeação de cargos do Ministério da Justiça assinados por Bolso na rono dia 1º de janeiro e publicados no Diário Oficial do dia 2 de janeiro. Pelos documentos, o Planalto diz que houve a assinatura de Moro apenas após a publicação. Os documentos mostram que o então ministro redigiu um ofício no dia 2 de janeiro solicitando a nomeação dos indicados para os cargos. No caso da demissão de Valeixo, não houve nenhum ofício escrito pelo ministro solicitando o ato presidencial. A Secretaria-Geral diz ainda que todos os 174 decretos assinados pelo então ministro da Justiça entre 2019 e 2020 foram feitos dessa forma, mas o órgão não encaminhou à PF os documentos desses decretos.

Sobre o fato de a exoneração de Valeixo ter constado como se tivesse sido “a pedido”, a Secretaria-Geral confirma a versão apresentada pelo ex-diretor-geral, de que ele recebeu um telefonema do presidente Bolsonaro na véspera lhe avisando que seria exonerado “a pedido”, e que concordou.

Em nota, a defesa de Sergio Moro repetiu que ele não foi consultado sobre a exoneração de Valeixo. “A respeito do decreto de exoneração do ex Diretor-Geral da Polícia Federal, Dr. Maurício Valeixo, a Defesa do ex-ministro Sergio Moro informa que não houve coleta de assinaturas físicas nem eletrônicas de nenhuma das autoridades com atribuição para o ato. (...) É preciso, portanto, a apuração das circunstâncias anormais envolvidas na publicação oficial.”