O globo, n.31705, 27/05/2020. Economia, p. 19

 

Líderes na Câmara defendem desoneração da folha

Eliane Oliveira 

Cássia Almeida

27/05/2020

 

 

A medida provisória (MP) 936, que autoriza acordos para redução de jornada e salário durante a crise do coronavírus, deve ser votada pela Câmara entre hoje e quinta-feira, segundo líderes ouvidos pelo GLOBO. A expectativa é que o texto passará facilmente pela Casa, incluindo o trecho que prorroga a desoneração da folha de pagamento para setores intensivos em mão de obra por mais dois anos.

Representantes de diversos setores temem os efeitos negativos que um eventual aumento de tributação no meio da crise econômica poderia ter sobre suas atividades e sobre o mercado de trabalho, caso a desoneração não seja mantida.

O adiamento do fim do benefício para 2022 foi proposto pelo relator da matéria, deputado Orlando Silva (PCdoB-SP), com a avaliação de que o aumento dos custos das empresas com o pagamento de tributos pode causar demissões. Hoje, um grupo de 17 setores pode optar por contribuir com um percentual que varia de 1% a 4,5% sobre a receita bruta, no lugar de recolher 20% sobre a folha de pagamento para a Previdência.

Segundo o líder do DEM na Câmara, Efraim Filho (PB), a votação da matéria é fruto de acordo firmado no fim da semana passada. Em sua opinião, embora o tema seja delicado, “é passível de aprovação”:

—O maior desafio do Brasil pós-pandemia será a geração de empregos. Medidas efetivas para mantê-los e dar oportunidades para quem está na fila do desemprego devem ser mais importantes do que a arrecadação de impostos. Se for preciso compensar, vamos buscar uma forma viável dentro do Congresso.

‘AJUDA NA TRAVESSIA’

Essa é a mesma expectativa do líder do PT na Câmara, Enio Verri (PR). Ele afirmou que o relator costurou as alterações, especialmente a prorrogação da desoneração da folha, com vários partidos.

—Há coisas que julgo que possam avançar na MP, mas acredito que a medida será aprovada sem destaques ou emendas até o fim da semana.

Fernando Valente Pimentel, presidente da Associação Brasileira da Indústria Têxtil e de Confecção (Abit), afirma que o modelo de cobrança foi fechado com prazo de validade, mas a pandemia causou “mudança radical na situação”:

— Entendemos que é uma medida positiva para ajudar as empresas nessa travessia.

Pimentel estima que o faturamento cairá 25% este ano, co maqueda drástica de demanda após o fechamento do comércio. Em cálculos preliminares, afirma que o recolhimento de imposto poderia aumentar em até 10% com uma mudança na tributação. Subiria de R$ 3 bilhões por ano para R$ 3,3 bilhões:

— Se voltar ao modelo antigo, vamos ter de ajustar mais afolha.

O setor emprega 1,5 milhão com carteira assinada.

O presidente executivo da Abi calçados, Haroldo Ferreira, diz que os custos vão subir, e a competitividade cairá no mercado interno e externo:

— A desoneração já está dentro do preço dos calçados. Essa prorrogação é vital nesses setores de uso intensivo de mão de obra. Esse ano não vai ter tempo hábil, com a pandemia e as eleições, de discutir a reforma tributária (que trataria do tema também). Já são 34 mil postos perdidos, 13% da força de trabalho do setor.

José Carlos Dias, da Câmara Brasileira da Indústria da Construção (Cbic), teme que, se a cobrança mudar, mais empresas feche mas portas:

—Coma prorrogação, vai ter menos empresas fechando —afirma.

Para os economistas, a desoneração da folha é importante, e eles ainda avaliam que deveria ser feita uma mudança linear, abarcando todos os setores.

— Cometemos o erro muito grave de tributar excessivamente o trabalho, um erro estratégico de décadas. O ideal é uma política global de desoneração — afirma Hélio Zylberstajn, professor da Faculdade de Economia da USP.

Luís Otávio Leal, economista-chefe do Banco ABC, avalia que o peso da tributação afeta o desempenho das empresas:

—Oque impede o país deter um mercado de trabalho mais pujante, com onos EUA, éter encargo sobre afolha de pagamento muito grande. Como estamos numa situação de desemprego alto, é importante diminuir o custo e incentivara contratação com carteira. Tudo issoéexce lente, ma sé preciso fazer uma discussão geral.

O relatório da MP 936 permite a redução de jornada e salário de trabalhadores em 25%, 50% ou 75% por até três meses e a suspensão do contrato por até dois meses. Orlando Silva vai autorizar que o governo prorrogue esse período, por decreto, para toda a economia ou para setores específicos.

“O maior desafio do Brasil pós-pandemia será a geração de empregos. Medidas para mantê-los devem ser mais importantes do que a arrecadação de impostos”

Efraim Filho, líder do DEM na Câmara dos Deputados