O globo, n. 31713, 04/06/2020. Economia, p. 18

 

Guedes avalia nova Previdência para gerar emprego

Geralda Doca

04/06/2020

 

 

Proposta faria parte da Carteira Verde-Amarela, defendida por Bolsonaro como solução após fim do auxílio de R$ 600. Sistema teria menos tributos sobre salários e regime de capitalização, que já foi rejeitado pelo Congresso no ano passado 

 

ROBERTO MOREYRA/10-7-2017Carteira de Trabalho. Novo modelo de contratação seria criado como mecanismo para substituir o auxílio emergencial, segundo o presidente Jair Bolsonaro

 Diante da alta do desemprego causada pela pandemia do coronavírus, a equipe econômica avalia ressuscitar o plano de incluir jovens trabalhadores em um novo regime trabalhista e previdenciário — a chamada Carteira de Trabalho Verde Amarela. A ideia é que eles possam ingressar no mercado vinculados a um sistema de capitalização, no qual cada um contribui individualmente ao longo da carreira para bancar sua aposentadoria no futuro. O objetivo do ministro da Economia, Paulo Guedes, é baratear o custo da mão de obra.

Essa ideia chegou a ser incluída nas primeiras versões da reforma da Previdência no ano passado, mas acabou sendo rejeitada pelo Congresso. Apesar disso, o governo avalia que o novo cenário exigirá que o assunto volte a ser pautado.

De acordo com quatro fontes que acompanham as discussões, técnicos do time de Guedes estão trabalhando nos detalhes da medida.

SÓ VALERIA PARA JOVENS

Hoje, o sistema de aposentadorias e pensões segue o modelo de repartição, em que trabalhadores da ativa contribuem para um fundo que financia os benefícios de quem já parou de trabalhar.

Como o novo regime dependeria menos de recursos públicos, empregadores não precisariam mais recolher a contribuição que hoje incide sobre os salários e ajuda a financiar a Previdência. Assim, a contratação formal seria estimulada, aposta Guedes.

A mudança no regime previdenciário exigiria a apresentação de uma proposta de emenda à Constituição (PEC). Ontem, o presidente Jair Bolsonaro afirmou que Guedes pretende criar a Carteira Verde-Amarela como mecanismo para substituir o auxílio emergencial de R$ 600, pago em três parcelas, mas não entrou em detalhes do que está sendo discutido nos bastidores:

—Ele (Guedes) quer voltar agora com a Carteira Verde Amarela. É uma maneira de reaquecer o emprego no Brasil. É uma preocupação enorme. A gente não pode acabar com o auxílio emergencial e não ter algo já de concreto na praça, para atender milhões de pessoas, em especial na informalidade, que ficaram desempregadas.

Segundo técnicos envolvidos nas discussões, como a medida valeria apenas para jovens que vão entrar no mercado de trabalho, não afetaria quem ainda está na ativa. A criação do novo modelo, no entanto, pode incentivar que empregadores troquem funcionários atuais por novos contratos, mais baratos.

Além da isenção da contribuição previdenciária, demais penduricalhos sobre salários, como o recolhimento ao Sistema S, deixariam de ser pagos.

Em contrapartida, esses jovens seriam obrigados a contribuir para um fundo de capitalização a fim de garantir a aposentadoria no futuro. Direitos como 13º salário, férias e FGTS seriam mantidos.

MODELO EVITARIA CPMF

A proposta deve incluir incentivos para a contratação de menores aprendizes, com repasses diretos da União para as empresas custearem o acompanhamento pedagógico dos menores empregados.

Interlocutores de Guedes relatam que o ministro nunca desistiu de implantar o regime de capitalização no país. O plano é definido por auxiliares como um “sonho”.

Segundo integrantes da equipe econômica, a necessidade urgente de criar empregos para assegurar a retomada da economia melhora as condições políticas para discutir o tema novamente.

Como o plano seria restrito a quem nunca trabalhou e transferiria esse público a um novo regime previdenciário, essa desoneração da folha poderia dispensar a necessidade de criar um imposto, como uma nova CPMF, para compensar a renúncia fiscal.

A necessidade de compensação seria menor, porque a avaliação é que, sem o incentivo, esses jovens ficariam fora do mercado de trabalho ou na informalidade. Ou seja, o governo já não contava com a entrada de recursos de impostos associados aos salário desses futuros trabalhadores.

Para vencer resistências, os sindicatos das categorias poderiam gerir os fundos de capitalização dos trabalhadores, de acordo com as regras de mercado.

O novo modelo de contratação seria diferente do Programa Verde-Amarelo, criado por uma medida provisória (MP), que foi revogada pelo próprio Executivo por causa de atraso na tramitação no Congresso.

A MP previa a desoneração temporária da folha para empregadores que dessem a primeira oportunidade de empregos para jovens entre 18 anos e 29 anos, além de promover mudanças na lei trabalhista. Mas não tratava de um novo sistema previdenciário.

O Programa Verde-Amarelo, idealizado por Rogério Marinho, ex-secretário especial de Previdência e Trabalho e atual ministro do Desenvolvimento Regional, não tratou da capitalização. Guedes acabou aceitando na ocasião, porque o programa foi costurado entre Marinho e o Palácio do Planalto, disse uma fonte.

A dificuldade de aprovar o projeto nos moldes elaborados por Guedes seria vencer a resistência no Congresso, que reluta em aprovar a capitalização para futuros trabalhadores. Jovens teriam de contribuir para um fundo a fim de garantir a futura aposentadoria