O globo, n. 31715, 06/06/2020. Mundo, p. 22

 

Pandemia se expande na Amazônia

Janaina Figueiredo

06/06/2020

 

 

Região em países vizinhos também tem alta incidência de casos da Covid-19

Depois de quase três meses de com bate à pandemia da Covid19 no continente, algumas regiões mantêm estado elevado de alerta, entre elas a Amazônia, que se espalha por nove países, incluindo Brasil, Colômbia, Peru, Equador e Bolívia. Nesse enorme território onde vivem centenas de comunidades indígenas, o aumento expressivo de casos é uma realidade, e a preocupação pela vulnerabilidade das populações é cada vez maior entre ONGs locais ouvidas pelo GLOBO. Um dos focos mais delicados é & tríplice fronteira entre Brasil, Colômbia e Peru, onde o número de infectados vem crescendo e, nos países vizinhos, sobe a tensão por estar ao lado de um dos epicentros mundiais da pandemia.

 PRECARIEDADE SANITÁRIA

Fatores que chamam a atenção nas províncias amazônicas, em relação ao resto de cada país, são ou a alta letalidade ló calda doença ou o desproporcional número de contágios No Brasil, O estado do Amazonas já tem mais de 40 mil casos e superou os 2.100 óbitos, com seu sistema de saúde no limite. Entre as 20 cidades com maior taxa de incidência de casos no país, 13 são do Amazonas. Na Colômbia, autoridades e dirigentes políticos garantem que os primeiros casos na cidade de Leticia, separada apenas por uma rua da brasileira Tabatinga, foram importados de Manaus. Em vista disso, no Congresso colombiano, senadores como o liberal Maurício Gómez Amin chamaram a atenção para os riscos que enfrenta a Amazônia local. Em meados de maio, o governo do presidente Iván Duque reforçou a militarização na fronteira.

 Era evidente o enorme risco que existia nessa parte da Colômbia pela proximidade de Letícia com Tabatinga afirmou o senador. Ele destacou que O novo coronavírus ameaça a existência das comunidades indígenas colombianas, que representam 70% da população do departamento (estado) do Amazonas. Em Letícia, de um total de 48.144 habitantes, dados oficiais indicam que 1.898 pessoas foram infectadas e 65 faleceram. Já em Bogotá, onde vivem 7,4 milhões de colombianos, o número de contagiados foi de 11.250, dos quais 272 foram a óbito. A precariedade do lugar é enorme e, por mais que a fronteira esteja militarizada, as pessoas continuam passando comentou Diego Cardona, coordenador geral da ONG Censat Água Viva Amigos da Terra Colômbia. Estas comunidades como ocorre na vizinha Bolívia sofrem pela pandemia e, também, por um recorde de queimadas, combinação que acaba elevando o número de pessoas com doenças respiratórias.

Tudo isso, num contexto de profunda precariedade sanitária. Quando a crise vírus começou, em Leticia não havia sequer um leito de CTI. Hoje, coma ajudado governo nacional, cinco pessoas estão internadas em unidades de terapia intensiva.

 No Peru, dois dos departamentos mais afetados são Loreto e Ucayali, comum número de mortos contabilizados por ONG se hospitais locais bem superiora odo governo. Enquanto o Ministério da Saúde registra 300 mortos em Loreto e 113 em Ucayali ambos na fronteira com o Brasil a ONG Cooper Accion indica, respectivamente, 794 e 494.

 Se o país parece estar chegando a um patamar de estabilidade, a região amazônica ainda está longe disso. Lá é muito difícil controlar o vírus comentou o geógrafo Dionel Martínez, que comanda uma das equipes de investigação na região.

 SUBNOTIFICAÇÃO GRANDE

Ele explicou que na Amazônia local, “muitos dos casos de contágio ocorreram pela chegada de pessoas levando ajuda aos indígenas”. Segundo ele, há mais de mil comunidades nativas em distritos amazônicos e em todas há, pelo menos, um caso de Covid-19. Em Loreto, onde vivem 880 mil pessoas (2,7% da população do país), foram registradas 6,5% das mortes por Covid-19 em todo o Peru (4.894). Como em todo o continente, a certeza de que existe uma sub notificação é grande, e especialistas estimam que os números reais poderiam ser até dez vezes superiores aos oficiais.

Além disso, a taxa de letalidade local é o dobro da média nacional peruana, atualmente em 2,75%. Em Loreto, a taxa de letalidade da Covid é de 5,79%. O fluxo de pessoas na região de fronteira com Colômbia e Brasil é grande. Em nossos mapas, vemos claramente como crescem os contágios à medida que nos aproximamos da tríplice fronteira relata o geógrafo.

Na Bolívia governada pela presidente interina Jeanine Ariez, os departamentos amazônicos de Beni e Santa Cruz são dois dos mais afetados pela pandemia e pelas queimadas desta época do ano. Beni, que tem menos de 0,5% da população do país (11,5 milhões de habitantes), concentra cerca de 20% das mortes (415) e decretou estado de desastre sanitário.

  “ISOLAMENTO INSUFICIENTE”

Em Santa Cruz, afirmou Marco Garandillas, pesquisador ambiental, já foram confirmados mais de sete mil casos de contágio, de um total de 12.245 em todo o país, sendo que o departamento concentra cerca de 30% da população boliviana. Foram adotadas medidas de isolamento, mas são insuficientes informou Garandillas. A pandemia está se expandido às zonas rurais, que estavam começando a se recuperar de uma epidemia de dengue (mais de 60 mil casos). E tudo isso com um sistema de saúde profundamente limitado.

 No Equador, que já tem mais de 40 mil casos de contágio 3 3.486 óbitos confirmados, são escassos os dados oficiais sobre a situação na região amazônica, que representa 48% do território nacional, distribuídos em seis províncias. A taxa de letalidade chegaria a 8, 5%, bem maior que a apontada pelo governo, que estaria em cerca de 3,596. São regiões onde a pobreza afeta de 80% a 100% da população. São cidades e comunidades isoladas, sem acesso ao sistema de saúde afirmou Sofia Jarrim, da ONG Amazon Watch.

Numa área onde há muitas comunidades nativas, ela acrescenta que “diante da falta de uma política estatal de controle e ajuda, as associações indígenas estão atuando por decisão própria”.