Título: DF usará câmeras para reforçar lei seca
Autor: Bernardes, Adriana ; Almeida, Kelly
Fonte: Correio Braziliense, 27/12/2012, Cidades, p. 21

Os equipamentos, acoplados aos óculos dos agentes, serão testados a partir de janeiro pelo Batalhão de Policiamento de Trânsito. Imagens dos infratores cambaleantes e com voz arrastada vão fortalecer os argumentos dos policiais

As blitzes de lei seca no Distrito Federal serão filmadas a partir de janeiro, quando o Batalhão de Policiamento de Trânsito (BPTran) vai testar o uso de microcâmeras durante as abordagens aos motoristas. O Departamento de Trânsito (Detran) já usa uma filmadora nas operações e, no próximo ano, outras quatro serão entregues aos agentes. Por enquanto, os fiscais se valem da prova testemunhal para punir os infratores. No feriadão de Natal, 86 pessoas foram autuadas. Desse total, nove vão responder pelo crime de dirigir alcoolizadas.

Na avaliação do subcomandante do BPTran, major Wagner Freitas, as imagens dos infratores cambaleantes e com a voz pastosa vão fundamentar ainda mais a prisão dos condutores. “Se as microcâmeras forem aprovadas (pela Polícia Militar), vão ajudar a derrubar os argumentos dos advogados. O infrator não terá para onde correr e vai ficar mais difícil burlar a fiscalização e a lei”, avalia. Desde 26 de novembro, os equipamentos são testados por policiais da Rondas Ostensivas Táticas Motorizadas (Rotam) em apreensões de alto risco.

No feriadão, somente o BPTran flagrou 32 motoristas por embriaguez, três deles autuados pelo crime previsto no artigo 306 da legislação. Os policiais emitiram também 680 notificações por irregularidades diversas, recolheram 30 CNHs e apreenderam 35 veículos. Já o Detran flagrou 27 alcoolizados, 12 inabilitados, apreendeu 32 veículos e emitiu 50 multas por diferentes infrações às leis de trânsito.

A preocupação em produzir as provas para, de fato, punir os infratores se justifica. Na manhã de terça-feira, um motorista supostamente alcoolizado bateu na traseira de uma moto, provocando a morte do motociclista. O condutor do carro se negou a fazer o teste do bafômetro e, com base na prova testemunhal do agente, foi autuado e levado para a delegacia, onde acabou indiciado por homicídio com dolo eventual. A conduta foi desclassificada pelo juiz Matheus Stamillo (leia matéria ao lado).

Polêmica O julgamento desse acidente pode ser a prova de fogo da eficácia da nova lei seca. Os legisladores garantem que ela ficou mais rígida e, mesmo sem o teste do bafômetro, será possível processar e condenar um réu com base em outras provas, como testemunho e imagens. O assunto é controverso. “Os conceitos e demais expressões trazidas pela nova lei seca continuam dependendo da interpretação judicial, uma vez que cabe ao Judiciário fornecer a última palavra quanto à leitura adequada das leis brasileiras”, afirma Saul Tourinho Leal, professor de direito constitucional. “A ampliação de provas aumenta a capacidade dos órgãos de trânsito de inibirem a perigosa combinação álcool e volante”, finaliza.

Doutora em direito penal, Estado e Constituição e professora de direito penal da Universidade Católica de Brasília, Soraia da Rosa Mendes adverte que o legislador deu ênfase ao exame de concentração de álcool como o primeiro meio de prova, na ausência do qual, alternativamente, outros poderão ser utilizados. Isso, de certa maneira, torna mais frágil a utilização de outras provas, segundo ela. “Importante sempre lembrar que, no processo penal, não há espaço para dúvidas. De modo que se o ‘padrão legal’ para o indivíduo médio é de 6 decigramas, ou 0,3 miligramas, ‘sinais indicativos’ têm uma carga de subjetividade muito grande. Assim, esses podem não ser suficientes para sustentar uma condenação”, diz.

De acordo com Soraia da Rosa Mendes, o problema probatório somente se resolverá definitivamente se nenhuma quantidade de álcool for tolerada. “A mensagem que precisa ser passada é, tachativamente, ‘se bebeu, não dirija’. E não ‘se vai dirigir, beba pouco’. Esse ‘pouco’ sempre será um problema probatório e pode continuar tirando muitas vidas”, afirma.

Delegado titular da 5ª Delegacia de Polícia, Marco Antônio de Almeida avalia que a nova legislação tem avanços importantes na produção de provas. “Antes, a conduta criminal estava limitada à própria técnica. Agora, não. Acredito que as pessoas vão se conscientizar de que a recusa em fazer o teste do bafômetro não vai evitar a responsabilidade penal”, diz.

3 mil internações no DF

Dados do Ministério da Saúde revelam que acidentes de trânsito foram responsáveis por 3.108 internações em 2011 somente no Distrito Federal. No mesmo ano, o Sistema Único de Saúde (SUS) registrou 155 mil atendimentos de pessoas acidentadas no trânsito de todo o Brasil. O custo aos cofres públicos ultrapassou R$ 200 milhões no país, sendo R$ 3,9 milhões gastos somente com os acidentados no DF. O valor é relativo aos custos de cerca de 3 mil internações na rede pública de saúde. O Ministério da Saúde pretende investir em campanhas educativas para reduzir os índices de acidentes. Uma das estratégias é o programa Vida no Trânsito, que tem como objetivo, entre outras ações, criar um banco de dados com o os fatores de risco e as vítimas mais vulneráveis e cada região do país.