O globo, n. 31719, 10/06/2020. País, p. 4

 

Toffoli: Forças Armadas "não são instituições do governo”

10/06/2020

 

 

Pre­si­den­te do STF res­sal­ta que Cons­ti­tui­ção não res­pal­da ‘po­der mo­de­ra­dor’

O presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro Dias Toffoli, afirmou ontem a parlamentares que as Forças Armadas "servem ao povo brasileiro" e "não são instituições do governo", mas sim, de Estado. Toffoli destacou que a democracia brasileira não comporta um"quarto poder" e que o artigo 142 da Constituição Federal—citado nas últimas semanas co-mo suposta base para intervenção militar —não respalda nenhuma ideia de "poder moderador" para resolver
disputas entre Poderes. O presidente do STF participou de uma videoconferência com parlamentares de partidos independentes e de oposição ao governo Jair Bolsonaro. Deputados e senadores pediram o encontro virtual para prestar solidariedade em relação aos recentes ataques à Corte. O apoio foi expresso em uma carta entregue a Toffoli e endereçada à instância máxima do Judiciário. Em atos realizados nas últimas sema-nas, manifestantes que apoiam o governo Bolsonaro de-fenderam pautas antidemocráticas e inconstitucionais, como o fechamento do Congresso e do Supremo. Toffoli agradeceu o apoio dos parlamentares e ressaltou Sue o governo Bolsonaro é' legítimo"pois foi eleito democraticamente. Para o magistrado, apesar disso, as interpretações do artigo 142 não foram "felizes': 'Tenho visto do Poder Executivo a defesa (da democracia). Foram eleitos, foram legitimados e recebem nosso respeito.

 Determinadas interpretações que se de­ram, co­mo a do artigo 142, não são interpretações felizes, que encontrem espaço no estado democrático de direito”, avaliou. “Temos que estar unidos no combate da pandemia com transparência, com o apoio da imprensa, com liberdade de expressão. Não po­de­mos aceitar aquilo que aten­te contra o es­tado democrático de direito. Po­der se realizar fechamento do Congresso, do STF vai contra a razão de ser da Constituição”, completou Toffoli.

O arti­go 142 da Cons­titui­ção não trata de divisão entre os Po­de­res, mas descreve o funcionamento das Forças Armadas. Segundo constitucionalistas, em ne­nhum momento ele autoriza qualquer poder a acionar esse dispositivo para intervir em outro poder. Na reunião ministerial de 22 abril, cujo vídeo se tornou público, Bolsonaro se referiu a esse trecho da Constituição, dizendo que, com base nele, as For­ças Armadas poderiam intervir para “restabelecer a ordem”.
“Nós queremos fa­zer cumprir o artigo 142 da Constituição. Todo mundo quer fazer cumprir o artigo 142 da Constituição. E, havendo necessidade, qualquer dos Poderes pode, né? Pedir às Forças Armadas que intervenham para restabelecer a ordem no Brasil”, afirmou.