Valor econômico, v.21, n.5027, 25/06/2020. Brasil, p. A5

 

Desigualdade potencializa risco para covid-19, diz estudo

Leila Souza Lima

25/06/2020

 

 

Estudos publicados pela Universidade Federal de São Carlos (UFSCar) mostram panorama da dispersão da covid-19 nos municípios paulistas e apontam que cidades brasileiras com maior vulnerabilidade social e desigualdade têm maior risco relativo para a doença e os óbitos. Uma das pesquisas formulou o indicador para os 5.570 cidades do país, observando-se a correlação com os índices de vulnerabilidade social (IVS), desigualdade (Gini) e a taxa de mortalidade por coronavírus.

Já para verificar a evolução da doença no Estado de São Paulo, tomou-se como base o número de casos diários, identificando-se os clusters ativos - agrupamentos emergentes de municípios com risco relativo significativo, quando são observados mais casos de covid do que o esperado naquela localidade.

"Nossa abordagem metodológica não permite definir pesos dos fatores socioeconômicos para o aumento do risco, mas podemos afirmar que existe correlação entre eles. Ou seja, municípios com maior vulnerabilidade e desigualdade são aqueles em que observamos maior risco relativo da doença", diz Rogério Toppa, biólogo, professor da UFSCar, e um dos responsáveis pela pesquisa junto com colegas brasileiros e dos EUA - da Universidade Federal do Triângulo Mineiro (UFTM), Universidade do Estado de Minas Gerais (UEMG), de Johns Hopkins Bloomberg School of Public Health e da Universidade da Carolina do Norte.

No estudo nacional, foi feito recorte temporal de 103 dias - de 25 de fevereiro a 7 de junho. "Encontramos 11 clusters emergentes de covid-19 em todas as regiões do Brasil, mas sete deles apresentaram risco relativo maior do que 1, o que significa mais casos observados do que esperados. O agrupamento mais crítico foi observado na região Norte", observa Toppa. E a situação mais crítica é do município de Pedra Branca do Amapari, no Estado do Amapá, que tem índice de 21,85.

A segunda pesquisa permitiu confirmar que a cidade de São Paulo foi de fato o epicentro da doença, com dispersão progressiva para municípios vizinhos. O período de observação partiu de 25 de fevereiro, data do primeiro caso de covid-19 confirmado no Brasil, a 5 de maio. São três recortes temporais a partir de 25 de fevereiro (a 24 de março, a 15 de abril e a 5 de maio) que permitiram determinar o arranjo geográfico do risco relativo para o Estado por meio desses clusters.

Enquanto no primeiro período, não havia nenhum cluster ativo significativo no Estado, no terceiro, que englobou os 70 dias, foram identificados três agrupamentos emergentes e 23 municípios com risco relativo maior do que 1, ou seja, com mais casos observados do que esperados.

"E o que chamou a atenção é que esses clusters ativos estavam todos próximos da capital paulista, o que confirma a ideia de que a cidade era o epicentro da doença no período analisado", destaca Rogério Toppa.

Para o biólogo, os achados podem subsidiar intervenções de políticas públicas. "É importante analisar a pandemia e as políticas de saúde tomando como parâmetro determinantes sociais e econômicas. E os municípios com maior vulnerabilidade social parecem ser aqueles onde haverá mais incidência e mortes no Brasil no período analisado."