Valor econômico, v.21, n.5025, 19/06/2020. Brasil, p. A5

 

Governo gasta 43% do dinheiro destinado a combate à pandemia

Lu Aiko Otta

19/06/2020

 

 

Dados do Ministério da Economia mostram que, até o momento, foram gastos 43,46% dos recursos federais destinados ao combate à pandemia da covid-19. De um total de R$ 404,18 bilhões, foram pagos até o momento R$ 175,64 bilhões.

Na parte destinada ao Ministério da Saúde e outros ministérios com menor participação nas ações, os pagamentos correspondem a 26,4%. Foram gastos R$ 13,17 bilhões, de um total de R$ 49,87 bilhões. O Valor trouxe na última terça-feira um levantamento da Instituição Federal Independente (IFI) apontando para a baixa execução nessa área.

Como as ações foram desenhadas para durar alguns meses, é natural que parte dos recursos não tenha sido paga, dizem técnicos. Para o auxílio emergencial, por exemplo foram utilizados 62,6% dos recursos reservados ao programa. Já o reforço de R$ 900 milhões à Conta de Desenvolvimento Energético (CDE) já foi 100% desembolsada.

No entanto, há programas que têm execução baixa porque ainda estão em implementação ou porque necessitam de ajustes para "rodar". Um caso reconhecido pela própria equipe econômica é o do financiamento à folha de pagamentos, que já teve liberados R$ 17 bilhões dos R$ 34 bilhões previstos, mas essa primeira parcela não foi totalmente utilizada. A linha de crédito passará por ajustes, que estão sendo negociados no Congresso Nacional.

Dos R$ 51,64 bilhões reservados para o pagamento do Benefício Emergencial de Manutenção de Emprego e Renda (BEm), foram pagos até o momento R$ 11,12 bilhões. Apesar da baixa execução, o Ministério da Economia informa que o ritmo de liberação está dentro do programado, não devendo "sobrar" recursos.

"É importante esclarecer que o valor mencionado de R$ 11,2 bilhões se refere tão somente ao efetivamente já pago, mas não ao total que será despendido para o pagamento das parcelas do benefício referentes aos acordos já firmados", informou a Secretaria Especial de Previdência e Trabalho. "Cabe dizer ainda que, levando-se em conta que os pagamentos do benefício começaram a ser efetivados em maio e que os acordos podem ser firmados durante todo o ano de 2020, o programa está com o desempenho satisfatório e também teve a provisão de recursos (R$ 51,6 bilhões) igualmente adequada."

A secretaria confirmou ainda que estuda eventual prorrogação dos programas de manutenção de emprego. O alongamento já foi sinalizado pelo ministro da Economia, Paulo Guedes. A Medida Provisória (MP) 935, que regula a matéria, foi aprovada pelo Congresso Nacional com uma emenda que permite ao governo alongar o programa.

Os dados mostram também que, do auxílio financeiro a Estados, municípios e Distrito Federal, o governo já pagou R$ 21,64 bilhões de um total disponibilizado de R$ 76,19 bilhões. A diferença entre o total e o que foi liberado até agora corresponde a três parcelas das transferências do chamado Plano Mansueto. No total são quatro parcelas que somam R$ 60 bilhões.

A primeira parcela foi paga na semana passada. O presidente do Comitê de Secretários de Fazenda dos Estados (Comsefaz), Rafael Fonteles, informou que não tem visto dificuldade na transferência de recursos do Tesouro Nacional.

Os Estados pedem, por outro lado, que seja prorrogada outra ação de apoio financeiro federal: a complementação dos repasses dos Fundos de Participação, de forma a manter os mesmos níveis de 2019.

O governo reservou ainda R$ 35,9 bilhões para reforçar os fundos garantidores de operações de crédito. Desses, foram pagos R$ 15,9 bilhões, transferidos ao Fundo Garantidor de Operações (FGO) para cobrir perdas em operações com microempresas.

Os R$ 20 bilhões restantes são para dar garantias a empréstimos a empresas de porte médio por meio do Fundo Garantidor de Investimentos (FGI).

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Para TCU, vírus da corrupção foi 'retroalimentado' com crise 

Renan Truffi

19/06/2020

 

 

O presidente do Tribunal de Contas da União (TCU), José Múcio Monteiro, disse ontem que, mesmo após o fim da pandemia, o órgão terá de fiscalizar os gastos dos gestores públicos durante "muito tempo", por causa da quantidade de recursos que foram repassados em nível municipal e estadual. Ele defendeu também que o Brasil reconstrua pontes para atrair investimentos estrangeiros. Na visão do presidente do tribunal, a crise vai expor "as diferenças" e as "mazelas" da sociedade brasileira.

José Múcio falou sobre o assunto em audiência pública da Comissão Mista de Acompanhamento das Medidas Relacionadas ao Coronavírus, no Congresso Nacional. Na sessão, ele foi questionado se o TCU vai punir as autoridades públicas que se apropriarem de recursos destinados ao combate da covid-19. Em resposta, disse que é preciso "separar o joio do trigo".

"O controle externo tem uma grande preocupação: separar o joio do trigo. Se nós formos injustos, quem é que, no futuro pós-pandemia, vai querer ser gestor público? Quem é que vai querer ser secretário municipal? Quem é que vai se candidatar a uma prefeitura? A política está virando uma atividade de risco, porque você pode dormir honesto e um qualquer botar uma suspeição sobre sua conduta, e você acordar com um conceito arranhado", ponderou, na reunião com senadores e deputados.

"De maneira que nós, do controle externo, sabemos que, mesmo quando essa pandemia acabar, nós vamos continuar, muito tempo, com a preocupação de separar o joio do trigo", complementou Múcio.

Apesar disso, o presidente do TCU disse que o vírus de corrupção foi "retroalimentado" com a oportunidade das compras emergenciais vinculadas ao vírus. Neste cenário, ele relatou que o órgão sofreu pressão para "liberar geral" no cumprimento de normas e regras.

"Nós fizemos o quê? Anunciamos que íamos mudar a nossa forma de trabalhar durante esse período da emergência: Vamos estar presentes em tudo, assistir a tudo, ser testemunhas de tudo e, depois, vamos fiscalizar tudo que foi feito. Na emergência, é muito difícil você distinguir quem quer salvar uma vida de quem quer melhorar a sua vida. E começamos a combater alguns outros que queriam que fosse promovido o 'liberou geral' e que durante a pandemia nada acontecesse. Nós só conseguimos diminuir, quer dizer, sofrer menos essa pressão quando começaram a aparecer nos Estados denúncias de corrupção."

Em seguida, José Múcio opinou sobre os impactos da disseminação da doença na economia brasileira. Ele disse que o TCU "torce" para que esses problemas, relacionados à crise, fiquem para trás como forma de dar segurança jurídica e atrair investimentos estrangeiros.

"Nós vamos precisar de dinheiro de fora, nós vamos precisar de dinheiro privado. Lembrem que nós, no mês de janeiro, tínhamos um país que crescia, o Brasil crescia a 1,5% e nós sonhávamos em crescer mais. Hoje, a gente sonha em voltar a 1,5%", afirmou. "Nós precisamos reconstruir o país, porque esse vírus vai escancarar as suas diferenças, as suas mazelas. Esses muitos Brasis vão aparecer após essa pandemia", defendeu.