Título: Governo em Havana
Autor: Craveiro, Rodrigo
Fonte: Correio Braziliense, 12/01/2013, Mundo, p. 16

Vice-presidente venezuelano, Nicolás Maduro, viaja à capital cubana em busca de notícias de Chávez e garante que permanece no poder. Organização dos Estados Americanos respalda adiamento da posse

Os presidentes da Argentina, Cristina Kirchner, e do Peru, Ollanta Humala, desembarcaram ontem em Havana, em busca de notícias de Chávez. “Estava amanhecendo e o Malecón apareceu, em todo seu esplendor. Disseram-me que Fidel e Raúl Castro me esperam”, escreveu Cristina, em sua página no microblog Twitter. Ela carregava uma Bíblia, que seria entregue ao colega venezuelano. Às 7h (hora local), a mandatária foi recebida no Aeroporto Internacional José Martí pelo chanceler cubano, Bruno Rodríguez (foto). De acordo com o jornalista venezuelano Nelson Bocaranda, Cristina se reuniu no hospital Cimeq com os filhos de Chávez e, apesar de ter a entrada autorizada na unidade de terapia intensiva, preferiu não ver o paciente. Sete horas depois, Humalla chegou a Cuba e falou com a imprensa. “Obviamente, eu também perguntarei sobre a situação do presidente Chávez. Todos desejamos, imagino eu, uma pronta melhora”, disse o peruano.

Em seu primeiro dia no comando do quarto mandato chavista, o vice Nicolás Maduro embarcou ontem a Havana, onde visitará o presidente Hugo Chávez. Antes da viagem, ele pediu a Deus que o acompanhasse nessa “batalha” e negou a existência de um governo acéfalo. “Esse governo está governando todos os dias, a toda hora. Hoje é o primeiro dia do novo período da Revolução Bolivariana”, declarou Maduro, em pronunciamento transmitido pela tevê estatal. Segundo o ex-chanceler venezuelano, 2013 tem sido caracterizado pela preocupação com o tema da “saúde delicada” do chefe de Estado. Em um desdobramento político importante, o secretário-geral da Organização dos Estados Americanos (OEA), José Miguel Insulza, pôs fim à polêmica sobre a posse de Chávez e respaldou a prorrogação do juramento ante o Tribunal Supremo de Justiça (TSJ). “O debate já foi resolvido pelos três poderes do Estado da Venezuela: o Executivo estabeleceu, o Legislativo debateu, e o Judiciário resolver”, comentou.

Até o fechamento desta edição, as autoridades venezuelanas não haviam divulgado um boletim oficial sobre a situação de Chávez, que trava uma luta contra o câncer, na capital cubana. O último informe governamental tinha sido feito na segunda-feira. “O presidente está consciente da situação em que se encontra. Ele se mantém em comunicação com sua equipe de governo e com familiares que estão em Havana. O presidente é o presidente, não há nenhum outro presidente”, disse à Uno Rádio o ministro da Informação e da Comunicação, Ernesto Villegas.

A ausência de informações sobre a doença de Hugo Chávez levou as organizações não governamentais Transparência Internacional e Aliança Regional pela Livre Expressão e Informação a divulgarem o estudo Acesso à informação sobre a saúde dos chefes de Estado, um relatório de 26 páginas que, além da Venezuela, cita Paraguai, Argentina e Colômbia. Sob a coordenação de Ezequiel Santacava, o documento destaca a necessidade de que se revelem todas as notícias sobre a saúde dos mandatários. “Uma informação tratada como de caráter privado é, na realidade, pública, pois a saúde de um presidente repercute na qualidade de vida da população”, explicou Santacava ao Correio, por telefone. “No momento em que há uma incerteza enorme sobre a situação de Chávez, isso é uma agressão à democracia, com implicações institucionais”, alertou.

Rumores

O hermetismo do governo da Venezuela tem servido de combustível para vários rumores. A opositora Sonia Camacho, 66 anos, coordenadora nacional do grupo Mujeres de Negro, recebeu uma mensagem perturbadora pelo celular, datada de 8 de janeiro. “As autoridades venezuelanas e cubanas planejam um velório de alto padrão para Hugo Chávez em Cuba, onde o cadáver receberá honras de herói nacional, antes de ser trasladado à sua cidade natal, Bariñas, para posterior enterro em Caracas”, afirma o texto. “Ainda que o hospital Cimeq, onde se encontra o corpo de Chávez, permaneça aquartelado, a informação tem transcendido, por meio de pessoal militar e diplomático.”

Para Sonia, o presidente venezuelano está morto ou moribundo. “Se ele estivesse vivo, teria se pronunciado, pois é um egocêntrico”, comentou. Ela não escondeu a decepção com a postura da OEA. “Insulza sempre esteve do lado de Chávez e isso fica claro com essa declaração. Toda essa gente é comprada”, indigna-se a ativista, que garante já ter sido presa e espancada.

A reportagem tentou contato com o médico venezuelano José Rafael Marquina, mas não obteve resposta. Em sua página no Twitter, Marquina — que diz ter acesso ao prontuário de Chávez — colocou sob suspeita a visita de Maduro. “A viagem de Maduro, sem informação oficial crível, apenas cria mais dúvidas sobre a doença”, escreveu.