Título: Universidade investiga pichações homofóbicas
Autor: Furquim, Gabriella
Fonte: Correio Braziliense, 10/01/2013, Cidades, p. 26

A Universidade de Brasília (UnB) voltou a ser alvo de manifestações de ódio contra mulheres e gays na última semana. No retorno às aulas, alunos encontraram mensagens ofensivas pichadas nas paredes do Centro Acadêmico de Direito (Cadir). As frases escritas com tinta guache vermelha eram “Ñ aos gays”, “Quem gosta de dar, gosta de apanhar” e “Não existe nada mais sexy que um homem feminista”. Foi instaurado ontem um inquérito interno para apurar a autoria das ofensas, e a direção da faculdade estuda uma intervenção policial no caso. “Pretendemos acionar a Polícia Federal e a Civil para que possamos tomar atitudes em conjunto. Além de tentar evitar, é necessário combater atitudes como essa”, afirma o professor George Galindo, Diretor da Faculdade de Direito, que considerou a manifestação de preconceito como grave.

As mensagens ofensivas foram apagadas na manhã de ontem. Ainda não há pistas de quem teria pichado as paredes. “Pode ser alguém de dentro ou de fora da universidade. Como estávamos de férias, as frases podem ter sido escritas no fim do último semestre ou durante o recesso”, explica o estudante Lucas Carneiro, 20 anos, coordenador geral do Cadir. As pichações não foram a primeira manifestação de preconceito dentro do Centro Acadêmico de Direito. “Havia uma bandeira do movimento LGBT (Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Transexuais e Transgêneros) dentro do CA, que sumiu no ano passado e só foi encontrada meses depois, jogada no mato”, conta o presidente. Além disso, o nome de um estudante já foi escrito diversas vezes seguido da palavra “viado”. “Sempre apagamos, mas escrevem novamente”, explica Lucas.

Ameaças

O estudante de Serviço Social e militante do movimento LGBT Hyago Drayhan, 20 anos, considerou as mensagens ameaçadoras. “A UnB tem um histórico de machismo e de homofobia, o que agrava manifestações como essa”, afirma. Hyago faz parte do Subversiva, coletivo de combate à opressão de minorias da UnB criado logo após a disseminação das mensagens de ódio e ameaças do ex-estudante Marcelo Valle, em 2010. Em março do ano passado, Marcelo foi preso pela Polícia Federal por tramar um ataque a estudantes da UnB e por espalhar mensagens de ódio contra negros, homossexuais, mulheres e judeus. Ele aguarda julgamento na Penitenciária de Piraquara, no Paraná. “Com as ações do Marcelo, ficou claro que era necessário fazer algo para enfrentar o preconceito dentro da UnB. É triste ver ações como a pichação do Cadir, e percerber que ideias tão retrógradas como as dele continuam presentes na universidade”, continua Hyago, que chegou a receber ligações e e-mails com ameaças do grupo de Marcelo Valle.

Conscientização

Amanhã, ao meio-dia, estudantes de todos os cursos da UnB se reunirão para debater as pichações e elaborar projetos de conscientização e combate à homofobia e ao machismo na universidade. Para o estudante de direito e membro do Cadir Hugo Fonseca, 19 anos, a homofobia e o machismo são problemas sérios dentro e fora do ambiente universitário e precisam ser encarados como tal. “Se quiser dizer que é tudo brincadeira, que digam às mulheres estupradas na UnB e também à família de Lucas Fortuna e tantos outros”, protesta. Para o estudante, a demonstração explícita de preconceito pode ser usada como uma forma de enfrentamento ao problema. “Infelizmente, ideias assim são comuns na sociedade, mas, geralmente, são veladas. Ao exporem claramente o preconceito, é mais fácil enfrentar”, afirma.

Para Hyago, falta posicionamento do governo em relação aos crimes contra os gays. Criado em 2006, o projeto que inclui homofobia entre os delitos punidos pela lei de racismo, que já criminaliza a discriminação por religião, etnia e procedência nacional, aguarda votação na Comissão de Direitos Humanos (CDH) do Senado. O PLC 122 foi apelidado de lei da ‘mordaça gay’. “E não é só a falta de criminalização que deixa espaço para que gays e lésbicas sejam alvos de agressões e ofensas. Na educação, também não há investimentos. Quando o Ministério da Educação decidiu incluir o tema, a iniciativa foi rechaçada, os livros, apelidados de Kit Gay, e o projeto, abandonado”, lamenta o militante.

Assassinato

O jornalista goiano e militante do movimento LGBT Lucas Cardoso Fortuna, 28 anos, foi encontrado morto na praia de Cabo de Santo Agostinho, próxima à cidade de Recife, em novembro do ano passado. Ele trajava apenas cueca, com sinais de espancamento. Lucas viajou a trabalho pela Federação Goiana de Voleibol, para ser árbitro de um campeonato. A suspeita da família e de amigos é de que a morte de Lucas tenha motivação homofóbica. A polícia pernambucana, no entanto, sustenta a hipótese de latrocínio (roubo com morte).