O Estado de São Paulo, n.46244, 28/05/2020. Política, p.A4

 

STF determina operação contra alvos bolsonaristas

Rafael Moraes Moura

Patrik Camporez

Fausto Macedo

Pepita Ortega

28/05/2020

 

 

Investigação. Em ação ordenada pelo ministro Alexandre de Moraes no inquérito das fake news, PF faz buscas e apreensões e convoca para depor deputados aliados do presidente

Buscas. Policiais federais cumprem mandado de apreensão em residência do blogueiro Allan dos Santos, do site Terça Livre

O Supremo Tribunal Federal (STF) fechou o cerco contra o chamado “gabinete do ódio”, grupo de assessores do Palácio do Planalto comandado pelo vereador Carlos Bolsonaro (Republicanos-PR), filho do presidente Jair Bolsonaro. Em uma operação determinada pelo ministro Alexandre de Moraes, relator do polêmico inquérito das fake news, a Polícia Federal apreendeu ontem documentos, computadores e celulares em endereços de 17 pessoas suspeitas de integrar uma rede de ataques a integrantes da Corte e convocou oito deputados bolsonaristas a depor. Considerada “abusiva” pelo Palácio do Planalto, a ação da PF estremeceu ainda mais a relação entre magistrados e o Palácio do Planalto, que avalia um contra-ataque.

No despacho que ordenou a operação, Moraes definiu o gabinete do ódio como “associação criminosa”, mas não incluiu Carlos ou seus fiéis aliados do Palácio do Planalto como alvo da operação de ontem, apenas aliados próximos, como o blogueiro Allan dos Santos, do site bolsonarista Terça Livre. As referências ao grupo, no entanto, indicam que eles podem ser alvo numa fase futura da investigação.

O ministro apontou ainda indícios de que empresários financiam de forma velada a disseminação de fake news e conteúdo de ódio contra integrantes do STF e outras instituições, como revelou o Estadão em março deste ano. Segundo Moraes, há “fortes indícios” de que os investigados cometeram crimes de calúnia (6 meses a 2 anos de prisão), difamação (3 meses a 1 ano), injúria (1 a 6 meses), além de violações previstas na Lei de Segurança Nacional.

Entre os financiadores do grupo criminoso citados pelo ministro do STF estão os empresários Luciano Hang, da rede de lojas de departamento Havan, Edgard Gomes Corona, dono da rede de academias Smart Fit, Otavio Fakhoury, sócio do site Crítica Nacional, o humorista Reynaldo Bianchi Júnior e o coordenador do Bloco Movimento Brasil, Winston Rodrigues Lima. Eles foram alvo da operação de ontem .

“Há informações de que os empresários aqui investigados integrariam um grupo autodenominado de ‘Brasil 200 Empresarial’, em que os participantes colaboram entre si para impulsionar vídeos e materiais contendo ofensas e notícias falsas com o objetivo de desestabilizar as instituições democráticas e a independência dos poderes”, escreveu Moraes.

O ministro incluiu na decisão uma mensagem de Corona em um grupo do WhatsApp em que o empresário pede dinheiro para disseminar publicações nas redes sociais. “Temos de impulsionar estes vídeos. Precisamos de dinheiro pra incestir (sic) em mkt”, diz o texto da postagem no grupo ‘Brasil 200 Empresarial’. O comentário faz referência a vídeos contra o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ). Os empresários tiveram seus sigilos bancários quebrados .

O Estadão apurou que alguns dos mandados de busca e apreensão, como o que teve como alvo o dono da Havan, já estavam programados há dois meses, mas foram adiados por causa de “vazamentos”. As recentes manifestações pedindo o fechamento do Congresso e do Supremo, além de intervenção militar, deram mais combustível para o inquérito, embora estejam sendo apuradas em outro procedimento de investigação.

O despacho cita ainda trechos de depoimentos dos deputados Joice Hasselmann (PSL-SP) e Alexandre Frota (PSDB-SP) na Comissão Parlamentar de Inquérito das Fake News. Os dois são ex-aliados de Bolsonaro e esmiuçaram a atuação do gabinete do ódio em reuniões no colegiado. “Recaem sobre os indivíduos aqui identificados sérias suspeitas de que integrariam esse complexo esquema de disseminação de notícias falsas por intermédio de publicações em redes sociais, atingindo um público diário de milhões de pessoas, expondo a perigo de lesão, com suas notícias ofensivas e fraudulentas, a independência dos poderes e o Estado de Direito”, escreveu Moraes.

Parlamentares. A decisão de Moraes também atingiu seis deputados federais e dois estaduais, incluindo Carla Zambelli (PSLSP) e Bia Kicis (PSL-DF), duas das parlamentares mais próximas de Bolsonaro. Eles não foram alvo de mandados de busca e apreensão, mas o ministro determinou que sejam ouvidos em dez dias e que suas postagens em redes sociais sejam preservadas.