Título: Cerimônias tensas
Autor: Craveiro, Rodrigo
Fonte: Correio Braziliense, 11/01/2013, Mundo, p. 14

A controvérsia da posse do presidente Hugo Chávez, ou o adiamento dela, marca mais um capítulo de juramentos turbulentos na América Latina. São muitos os exemplos inusitados na política do continente — o Brasil já foi palco de algumas delas. Em 1985, na véspera de se tornar o primeiro presidente brasileiro após a ditadura militar, Tancredo Neves, assim como Chávez, precisou ser hospitalizado.

Temendo que os militares se aproveitassem da situação, Tancredo se recusava a se tratar antes da posse, mas não resistiu a fortes dores abdominais e foi internado. Morto em 21 de abril, ele não chegou a assumir a chefia do Planalto, e, José Sarney, o vice-presidente da chapa, ficou à frente do governo. Problemas de saúde também privaram o general Costa e Silva, em 1969, de concluir o mandato. Vítima de uma isquemia cerebral, ele deixou o poder e uma junta militar, sem previsão constitucional, assumiu temporariamente a presidência.

Em 1990, a segunda mulher eleita para comandar um país latino-americano, Violeta Chamorro, tomou posse ao som de vaias e aplausos no Estádio Nacional de Beisebol da Nicarágua. O sandinista Daniel Ortega, que passou para ela a faixa presidencial, contribuiu para a tensão ao se apresentar de mangas arregaçadas e calças de vaqueiro.

Em uma das posses mais violentas do continente, Álvaro Uribe, assumiu a Colômbia em 7 de agosto de 2002. A sede do governo foi bombardeada pouco antes de ele assumir o cargo e e uma bomba explodiu a três ruas do local, deixando um saldo de 17 mortos e 20 feridos. Complicada também foi a posse de Guillermo Endara, em 1989, na Nicarágua. Recebido com bombas, ele jurou o cargo em uma base militar, ao mesmo tempo em que tropas norte-americanas invadiam Manágua. “A América Latina tem uma certa tradição de golpes militares, quarteladas, conspirações e até suicídio. Vivemos muitas situações em que o ritual de empoderamento de um ou outro presidente foi um tanto complicado”, analisa Jaime de Almeida, professor de história da Universidade de Brasília (UnB).

No útimo ano, eleitores mexicanos insatisfeitos foram às ruas no dia da posse de Enrique Peña Nieto, vencedor em uma criticada contagem de votos, na qual cerca de 50% das cédulas foram recontadas. Felipe Calderón, antecessor de Peña Nieto, viveu sua dose de tensão em 1º de dezembro de 2006, quando sucedeu Vicente Fox. Manifestantes bloquearam a entrada principal e eles precisaram entrar pela lateral do Parlamento. Em 2010, a posse no Chile foi adiada por duas semanas, mas as razões não foram nem políticas nem de saúde. Após o país um terremoto de 8,8 graus, Sebastián Piñera só assumiu a presidência em 11 de março. Mais de 500 pessoas morreram e 800 mil ficaram desabrigadas no país.