Título: O povo jura por Chávez
Autor: Craveiro, Rodrigo
Fonte: Correio Braziliense, 11/01/2013, Mundo, p. 14
Milhares de pessoas tomam as ruas de Caracas e homenageiam o presidente, internado em Cuba, no dia de sua posse. Vice Nicolás Maduro garante que defenderá a revolução
Nas mãos, a bandeira nacional, flores, imagens de santos, pôsteres de Jesus Cristo e retratos de Hugo Chávez. Alguns rostos estavam cobertos com as cores do país. Em uma exibição de lealdade e de amor ao líder bolivariano, milhares de simpatizantes do Partido Socialista Unido da Venezuela (PSUV) atenderam o chamado do vice, Nicolás Maduro, e do presidente da Assembleia Nacional, Diosdado Cabello, e se reuniram na Avenida Urdaneta. De lá, marcharam pelo centro de Caracas até o Palácio de Miraflores, às 14h (11h30 em Brasília) — horário marcado pela Constituição para a posse do chefe de Estado.
Funcionária do Ministério do Turismo, Scarlet Rodríguez, 34 anos, chegou à Avenida Urdaneta por volta de 1h da madrugada de ontem (hora local). “Isso é uma demonstração do profundo amor que temos por nosso comandante, um amor indescritível, que não tem comparação com nada”, afirmou ao Correio, por telefone. “Chávez é o pai de todos os venezuelanos. Chávez é o povo, somos nós. É o único homem que se entregou por completo ao seu país e ao seu povo.” Ela acredita que o mandatário retornará a Caracas, curado do câncer. “Nós somos Chávez, cacete. Nós somos o povo. Estamos aqui com frenesi, amor, emoção e orgulho. Apesar de fisicamente nosso presidente não estar aqui, ele está em nós”, gritou, visivelmente emocionada.
O aposentado José Rodríguez, 55 anos, deixou a cidade de San Cristóbal, no departamento de Táchira (nordeste), e viajou 840km para participar do ato político, acompanhado de 30 pessoas. “Nós estamos muito alegres e felizes por sabermos que nosso presidente continua sendo nosso presidente”, comentou, também por telefone. Durante a manifestação, a multidão gritava frases como “Chávez é o povo”; “Chávez, te queremos”; “Chávez, somos seus filhos”; e “Chávez, não se vá”.
O vice-presidente fez um discurso comovente e se dirigiu à oposição. “Sob a presidência de Hugo Chávez, fundou-se o sonho de (Simón) Bolívar, a Comunidade de Estados Latino-americanos e Caribenhos. Não haverá direita apátrida que possa apagar essa marca do comandante Hugo Chávez”, avisou Maduro, sob aplausos. “Nós lhe afirmamos daqui, comandante: fique tranquilo, continue sua batalha, pois aqui há um povo, um governo e uma Força Armada Bolivariana firme”, disse. Ele também garantiu que a revolução socialista “tem seus motores apertados”. “Estamos comprometidos com nossas vidas para respaldar nosso comandante. (…) Estamos prontos para seguir essa revolução. Que não se enganem: aqui há um povo que tem demonstrado suas fortalezas”, concluiu Maduro, que considerou o dia de ontem histórico. “Começa o mandato do presidente Chávez 2013-2019”, disse.
Chefes de Estado
O simbólico ato de apoio a Chávez foi prestigiado pelos governantes Evo Morales (Bolívia), José Mujica (Uruguai), Daniel Ortega (Nicarágua) e pelo ex-presidente do Paraguai Fernando Lugo. O Brasil esteve representado por José Antonio Marcondes de Carvalho, embaixador em Caracas. Em entrevista ao jornal El Universal, Ortega assegurou que “o filho de (Simón) Bolívar, Hugo Chávez Frias, não semeou o mar, mas o coração dos povos. Lugo também prestou uma homenagem ao amigo. “Chávez não é patrimônio apenas da Venezuela, mas pertence a toda a América Latina. A Revolução Bolivariana não tem retrocesso e está em boas mãos.”
O cientista político Miguel Ángel Martínez Meucci, da Universidad Simón Bolívar (Caracas), lembra que o chavismo sempre convocou atos de massa em seus momentos políticos mais importantes. “O slogan ‘Chávez é o povo’ resume tudo o que o chavismo diz ser. Ante a ausência do presidente, o governo exigiu um ato para vender a imagem de que o chavismo continua”, observa. O especialista acredita que as “elásticas” interpretações governistas da Constituição e a ausência da divisão de poderes somente podem ser mantidas com a renovação do apoio popular e da aquiescência internacional.
Doutor em ciência política pela Universidad Central de Venezuela (UCV), Carlos António Romero Méndez vê na manifestação de ontem “o princípio do fim da transição política”. “O governo e outros poderes implantaram a tese da continuidade governamental, mesmo sem um debate. Ao deixarem em suspenso a data de juramento de Chávez, mantiveram-no como presidente. Essa situação terá que acabar com a recuperação ou a morte dele”, comentou. Até o fechamento desta edição, não havia informação oficial sobre o estado de saúde de Chávez, em tratamento contra o câncer, em Havana.
Eu acho...
“Todos nós estamos com nosso comandante. Toda a Venezuela está concentrada aqui, assim como presidentes da América Latina e do Caribe, em apoio ao presidente Hugo Chávez Frías. O comandante é o nosso único líder, um homem que veio de um povoado humilde e se tornou um líder mundial. Nosso comandante regressará logo.”
» José Rodríguez, 55 anos, aposentado, morador de San Cristóbal (Táchira) e participante do ato em Caracas
“A ausência de Chávez marca uma nova etapa na história do país. A partir de agora, o chavismo deve encontrar um modo de subsistir sem seu máximo líder e fundador, e isso passa por complexas negociações internas. Não existe transição, porque o que se pretende é a continuidade do regime. Caso a ausência de Chávez se torne concreta, em algum momento a Venezuela deverá enfrentar novas eleições presidenciais.”
» Miguel Ángel Martínez Meucci, cientista político da Universidad Simón Bolívar (Caracas)