Valor econômico, v.21, n.5019, 11/06/2020. Brasil, p. A4

 

Bolsonaro critica "pânico pregado" pela OMS

Lu Aiko Otta

Cristiano Zaia 

11/06/2020

 

 

Os indícios de que pessoas contaminadas pelo coronavírus que permanecem assintomáticas raramente transmitem a doença alimentaram as esperanças do governo brasileiro de iniciar a retomada das atividades na economia. Também deram munição para o presidente Jair Bolsonaro criticar a Organização Mundial da Saúde (OMS) e a mídia.

"Esse pânico que foi pregado lá atrás por parte da grande mídia no tocante ao vírus começa talvez - talvez - a se dissipar a partir desse dia de hoje [terça], levando-se em conta o que a OMS falou", afirmou Bolsonaro, na abertura da reunião ministerial realizada na manhã de ontem.

"A OMS, nas últimas semanas, tem tido algumas posições antagônicas", afirmou o presidente. Citou como exemplo a suspensão de testes com o uso da cloroquina e sua posterior retomada. E a afirmação, feita na segunda-feira pela chefe da unidade de Doenças Emergentes da OMS, Maria Van Kerkhove, que parece ser rara a transmissão do coronavírus por pessoas assintomáticas.

"A OMS vai com toda a certeza falar sobre as suas posições adotadas nos últimos meses, que levaram muita gente, em especial aqui no Brasil, a segui-la de forma quase que cega", afirmou.

A baixa transmissão por assintomáticos "pode sinalizar para uma abertura mais rápida do comércio e a extinção daquelas medidas restritivas", defendeu Bolsonaro.

O presidente ressaltou que o fechamento de estabelecimentos foi determinação de governadores e prefeitos, com amparo do Supremo Tribunal Federal (STF), e que o governo federal não tem "nenhuma ingerência" sobre o caso. Em tom irônico, afirmou que a "grande mídia" saberá fazer essa discussão sobre reabertura com isenção.

Sem máscara, assim como boa parte dos ministros presentes, e com uma ligeira tosse no início de sua fala, Bolsonaro afirmou que colocou a preservação da vida em primeiro lugar, mas que é preciso também salvar empregos.

No entanto, a OMS informa que há casos de transmissão por indivíduos pré-sintomáticos. E diz que os estudos utilizam amostras pequenas e são sujeitos a reavaliação, e que não podem ser usados para descartar a possibilidade de transmissão.

As medidas adotadas pelo ministro da Economia, Paulo Guedes, permitiram preservar 10 milhões de vagas por meio da suspensão ou redução dos contratos de trabalho. No entanto, milhares de empregos formais foram perdidos. Além disso, há 38 milhões de informais que entraram no radar do governo a partir do pagamento do auxílio emergencial, comentou.

Esses informais são o público de um novo programa de geração de emprego que se encontra em elaboração no governo, disse Guedes na reunião.

O objetivo é trazê-los para a formalidade por meio do contrato Verde-Amarelo.

Esse contrato, que já foi proposto pelo governo no ano passado e depois retirado de tramitação no Congresso, permite vínculos trabalhistas fora da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). Em um dos pontos mais polêmicos, diz que direitos como férias remuneradas e 13º salário podem ser pagos em parcelas mensais, junto com o salário. Críticos dizem que, na prática, esses direitos desaparecerão da relação trabalhista.

O ministro também informou que o auxílio emergencial será pago por mais dois meses, mas num processo de "aterrissagem", para depois dar lugar a um novo programa social chamado Renda Brasil. Será a fusão de vários programas sociais já existentes.

As linhas foram apresentadas na noite de segunda-feira no Congresso Nacional. O Legislativo quer manter o auxílio emergencial em R$ 600, mas a equipe econômica é contra.

Para a reabertura da economia, o ministro da Economia citou como exemplo o setor de construção civil, que se mantém operando e com poucos casos da doença. Os protocolos de segurança podem servir de modelo para outros setores.

Os ministros da Infraestrutura, Tarcísio Freitas, e do Desenvolvimento Regional, Rogério Marinho, confirmaram que as obras sob responsabilidade de suas pastas não pararam com a pandemia.

No período, foram duplicados 94 km de rodovias e os investidos R$ 3 bilhões, informou Freitas. Marinho, por sua vez, informou que tem entregue de 2 mil a 3 mil habitações por semana. Bolsonaro deverá ir ao Ceará no próximo dia 20 para a inauguração do canal do São Francisco.