Valor econômico, v.21, n.5018, 09/06/2020. Política, p. A6

 

TSE deve rejeitar primeiras ações contra Bolsonaro

Luísa Martins

09/06/2020

 

 

Na semana em que o Supremo Tribunal Federal (STF) começa a julgar a legalidade do chamado inquérito das "fake news", cujas investigações cercam o Palácio do Planalto, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) também põe o presidente Jair Bolsonaro na mira ao retomar os julgamentos das ações que pedem a cassação de sua chapa, eleita em 2018.

A pauta de hoje na Corte eleitoral inclui dois processos que pedem o afastamento de Bolsonaro e de seu vice-presidente, Hamilton Mourão, por tirarem vantagem de uma invasão "hacker" ao grupo no Facebook responsável por lançar o movimento #EleNão, que reuniu 2,7 milhões de opositoras da chapa e ganhou as ruas do país durante a campanha eleitoral.

Após o ataque cibernético, o grupo "Mulheres Unidas contra Bolsonaro" virou "Mulheres COM Bolsonaro #17". Beneficiado pela mudança, o então candidato publicou em suas redes sociais um "print" da comunidade virtual, acompanhado de um texto de agradecimento.

Nos bastidores do TSE, o entendimento é o de que esses processos são juridicamente frágeis e não têm chance de prosperar. Os ministros não são tão categóricos quanto às outras quatro ações, que investigam o impulsionamento ilegal de mensagens por meio do WhatsApp - iniciativa supostamente financiada por empresários bolsonaristas.

De autoria dos então candidatos Marina Silva (Rede) e Guilherme Boulos (Psol), as ações começaram a ser julgadas em novembro do ano passado. O relator, ministro Og Fernandes, votou pelo arquivamento. Em seguida, o ministro Edson Fachin pediu vista. É com o voto dele que o julgamento terá continuidade na sessão de hoje à noite.

Fernandes reconheceu haver provas substanciais - prestadas inclusive pelo próprio Facebook - dos ataques "hacker", mas disse não ser possível comprovar que Bolsonaro esteve diretamente envolvido no ato ilícito. O relator também concluiu que a invasão ao grupo não foi capaz de desequilibrar ou macular a eleição.

Se por um lado há uma tendência ao engavetamento desses casos, por outro ainda pairam dúvidas, entre os ministros do tribunal, sobre as ações que pedem a cassação da chapa por disparos de mensagens em massa.

Essas são consideradas mais consistentes do ponto de vista jurídico, pois há um consenso no TSE de que a prática é proibida pela legislação. Pagamentos feitos por empresários em favor de um candidato devem ser declarados à Justiça Eleitoral, caso contrário podem ser considerados caixa dois. E os disparos não constam nas contas da chapa Bolsonaro-Mourão.

Impetrados pelos então candidatos Fernando Haddad (PT) e Ciro Gomes (PDT), esses processos ainda não têm data marcada para serem julgados. O presidente do TSE, ministro Luís Roberto Barroso, diz que pretende pautá-las tão logo estejam liberadas pelo relator, ministro Jorge Mussi.

O impulsionamento de mensagens sob investigação no TSE tem relação direta com o inquérito das "fake news", que busca desarticular uma rede de blogueiros e influenciadores digitais pagos por empresários para disseminar notícias falsas. Dezesseis deles foram alvos de buscas da Polícia Federal (PF) no dia 27 de maio, por ordem do ministro Alexandre de Moraes, do STF. Uma ação do Rede Sustentabilidade que questiona a legalidade do inquérito será examinada amanhã pelo Supremo.

O que está em debate agora é se as provas colhidas por Moraes no Supremo - como as resultantes da apreensão dos celulares dos blogueiros e das quebras de sigilos fiscais e bancários dos empresários - poderão ser também utilizadas pelos investigadores das ações no TSE. Apesar de a defesa da chapa defender que os inquéritos não têm relação, a tendência é de que o compartilhamento seja autorizado.

Para a cassação ser efetivada, são necessários os votos de no mínimo quatro dos sete ministros que compõem o plenário do TSE. Além de Og, Fachin, Barroso e Moraes, fazem parte da Corte os ministros Luís Felipe Salomão, Sergio Banhos e Tarcísio Vieira de Carvalho Neto.